“A redução do IPI
para carros não pode ser usado como um medicamento de uso contínuo. Com as vias
progressivamente congestionadas, o corpo está à beira de um colapso. Está mais
do que na hora dos economistas refazerem as contas enquanto o paciente respira“.
O comentário é do jornalista e ambientalista André Trigueiro em artigo na
homepage Mundo Sustentável do portal G1, 01/04/13.
Eis o artigo.
Assim que o governo
anunciou mais uma prorrogação de IPI reduzido para carros zero, acessei o site
do Denatran (Departamento Nacional de Trânsito) para checar o tamanho atual da
frota automobilística brasileira. Os dados são públicos e podem ser verificados
no link do Denatran.
Por nosso país
circulam oficialmente (dados consolidados de fevereiro/2013) mais de 43 milhões
de automóveis (43.085.340), sendo que a maioria absoluta desses carros se
concentra nas regiões metropolitanas. A situação é mais preocupante nas três
principais capitais da região Sudeste, a mais rica e densamente povoada do
país. São Paulo (4.858.630 de automóveis), Rio de Janeiro (1.764.089) e Belo
Horizonte (1.059.307) ostentam números que devem soar como música para os
economistas de plantão em Brasília, mas que representam um gigantesco obstáculo
para a mobilidade urbana e para a qualidade de vida não apenas dessas, mas das
principais cidades brasileiras.
De acordo com o
relatório “Metrópoles em números: crescimento da frota de automóveis e
motocicletas nas metrópoles brasileiras 2001/2011”, do Observatório das
Metrópoles, o número de automóveis em todas as 12 metrópoles do país dobrou de
tamanho neste período (aumentou de 11,5 milhões para 20,5 milhões). Já as
motocicletas passaram de 4,5 milhões para 18,3 milhões em apenas dez anos.
O estudo revela que
as metrópoles brasileiras reúnem aproximadamente 44% de toda a frota do país.
Nesta década, registrou-se um aumento de 8,9 milhões de automóveis,
aproximadamente 77,8%. Em média, foram adicionados mais de 890 mil veículos por
ano. “As metrópoles brasileiras têm enfrentado nos últimos anos o que podemos
chamar de uma ‘crise de mobilidade urbana’, resultante, sobretudo, da opção
pelo transporte individual em detrimento das formas coletivas de deslocamento”,
afirma o relatório. ”Um sistema eficiente de mobilidade é essencial para o
acesso ao mercado de trabalho, à educação, ao consumo e ao lazer, ou seja, é
uma condição fundamental para a construção do chamado bem-estar humano”,
conclui o responsável pelo estudo, Jaciano Martins Rodrigues, doutor em Urbanismo
(PROURB/UFRJ) e pesquisador do INCT/Observatório das Cidades.
Em artigo publicado
nesta coluna, em setembro do ano passado, resumi em 10 tópicos as razões pelas
quais deveríamos considerar a multiplicação indiscriminada de carros no Brasil
um risco real para a economia, a saúde, o bem-estar social, o clima e o direito
constitucional de ir e vir.
É evidente que a
produção de automóveis responde a uma demanda da sociedade que ainda considera
o carro um dos principais sonhos de consumo. Há também uma participação
importante no PIB (5%) e na geração de empregos (131,7 mil funcionários).
O que nos parece
urgente é a reflexão sobre a conveniência de o governo renovar incentivos
fiscais (renúncia adicional de R$ 2,2 bilhões em impostos de abril a dezembro
de 2013) a um setor da economia já bastante próspero e lucrativo, sem que se
considerem os – cada vez mais notórios – impactos negativos dessa medida.
É óbvio que os
economistas do Ministério da Fazenda que assinam a prorrogação do IPI reduzido
para carros zero julgam ser esta uma medida fundamental para manter a economia
aquecida. Contudo, parece também evidente que os argumentos em sentido
contrário são igualmente consistentes e robustos. Há que se ter coragem para
debater outras soluções em favor da geração de mais emprego e renda.
Especialmente em programas de governo vinculados à expansão dos meios de
transporte públicos de massa.
Tal como se dá na
luta contra micro-organismos nefastos à nossa saúde, há limites para o uso de
antibióticos. A redução do IPI para carros não pode ser usado como um
medicamento de uso contínuo. Com as vias progressivamente congestionadas, o
corpo está à beira de um colapso. Está mais do que na hora dos economistas
refazerem as contas enquanto o paciente respira. (EcoDebate)
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