Modelo Brasileiro do Sistema Terrestre é considerado
fundamental para pesquisas sobre o clima
O desmatamento da Amazônia, as queimadas, os processos de
interação entre o Oceano Atlântico e a atmosfera são algumas das questões
climáticas particulares do Brasil que o Modelo Brasileiro do Sistema Terrestre
(BESM, na sigla em inglês) leva em consideração e pretende dar conta de uma
forma que mesmo os melhores modelos do mundo não são capazes de fazer.
O modelo foi apresentado em detalhes em 09/09/13 na abertura
da 1ª Conferência Nacional de Mudanças Climáticas Globais, realizada em São
Paulo.
Determinar o quanto o clima já mudou, o quanto as suas
características ainda vão se alterar e onde isso ocorrerá é a base para o
planejamento de políticas públicas de adaptação aos impactos das mudanças
climáticas globais, segundo Paulo Nobre, coordenador geral do BESM e da Rede
Brasileira de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas Globais (Rede Clima), na
abertura do evento.
“O BESM é um eixo estruturante da pesquisa em mudanças
climáticas no Brasil e oferece subsídios para o Programa FAPESP de Pesquisa
sobre Mudanças Climáticas Globais (PFPMCG), para a Rede Clima e para o
Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Mudanças Climáticas (INCT-MC)”,
disse Nobre.
Com o intuito de colaborar com as previsões sobre as
consequências do aquecimento global e o consequente aumento na frequência dos
eventos extremos, o BESM roda no supercomputador Tupã da Rede
Clima/PFPMCG, reunindo fluxos atmosféricos, oceânicos, de superfície e, em
breve, químicos. Adquirido pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação
(MCTI) com apoio da FAPESP, o Tupã está instalado na unidade do Instituto
Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) de Cachoeira Paulista
Embora ainda não esteja em sua versão final e
completa, o modelo já consegue, por exemplo, reconstituir a
ocorrência dos últimos El Niños e estimar o retorno desse fenômeno, explicar as
chuvas na Zona de Convergência do Atlântico Sul e até estimar a variação do
gelo no globo de maneira satisfatória.
“Os cenários mais atuais, de 2013, estão disponíveis no
supercomputador. Estamos tomando medidas para que o acesso seja disponibilizado
ao público em geral até o final do ano”, afirmou Nobre.
Trinta pesquisadores estão diretamente envolvidos no
desenvolvimento do BESM e outros 40 estão ligados indiretamente. De acordo com
Nobre, esse número deve duplicar em cinco anos e duplicar novamente em 10 anos.
“Para tanto, é preciso que cada vez mais jovens doutores integrem esse
desafio.”
Nobre ressaltou ainda as graves consequências que o aumento
da frequência dos eventos extremos – tais como secas, enchentes e tornados –
tem sobre a vida das populações: “Nossas cidades e nossos campos não foram
projetados para conviver com esse novo clima, o que torna essencial a entrada
do Brasil na modelagem das mudanças climáticas”, disse.
Os quatro componentes
Iracema Cavalcanti, pesquisadora do INPE, apresentou,
durante o primeiro dia da conferência, os resultados já obtidos a partir do
componente atmosférico do BESM.
Em comparação com os dados observados, o modelo consegue
alcançar boas simulações de variabilidade sazonal (modificações
climatológicas das estações), fluxos de umidade, variabilidade interanual
(diferença entre anomalias de pressão), variabilidade da precipitação, entre
outros. “Ainda há deficiências, como na maioria dos modelos globais. Mas as
características gerais estão contempladas”, disse Cavalcanti.
Em relação aos oceanos, não é possível separá-los do que
ocorre no modelo atmosférico, daí a modelagem acoplada ser estratégica para o
funcionamento eficiente do BESM. A avaliação é de Leo Siqueira, também do Inpe,
que apresentou os desafios desse componente.
“Já conseguimos boas representações, mas queremos melhorar
as simulações de temperatura dos oceanos, principalmente nos trópicos, e do
gelo marinho. Também queremos criar uma discussão saudável sobre qual modelo de
gelo terrestre será adotado dentro do BESM”, disse Siqueira.
A modelagem do terceiro componente, superfície, foi
apresentada por Marcos Heil Costa, da Universidade Federal de Viçosa (UFV). “A
principal função de um modelo que integra processos superficiais é fornecer
fluxos de energia e vapor d’água entre a vegetação e a atmosfera. Isso é o
básico. Mas o aprimoramento do sistema, ocorrido ao longo dos últimos anos,
permitiu que outros processos fossem incorporados”, afirmou.
Alguns desses processos são: fluxos de radiação, energia e
massa; ciclos do carbono e do nitrogênio terrestres; recuperação de áreas
abandonadas; incêndios na vegetação natural; culturas agrícolas; vazão e áreas
inundadas sazonais; uso do solo por ações humanas (desmatamento); representação
específica dos ecossistemas; fertilidade do solo; entre outros.
Química é o quarto e mais recente dos componentes. “Sem um
modelo químico, os demais precisam ser constantemente ajustados”, disse
Sérgio Correa, pesquisador da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ).
Correa está à frente de estudos sobre química atmosférica que permitirão
refinar os dados do BESM quando esse componente for acoplado ao modelo – uma
das próximas fases previstas.
Colaborações com pesquisadores de instituições estrangeiras
e treinamentos são outras estratégias que estão em vigor para melhorar as
representações do Brasil e da América do Sul, com alcance também global.
(EcoDebate)
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