Despejo de esgoto sem tratamento nos rios, lagos e mares:
problema ambiental e de saúde pública
Mais de metade da
população brasileira não possui acesso ao tratamento de esgoto. Despejo
irregular prejudica a qualidade das águas
O despejo de esgoto
sem tratamento nos rios, lagos e mares está afetando a qualidade das águas
brasileiras e têm se tornado um problema ambiental, social e de saúde pública.
Dados do Instituto Trata Brasil, divulgados no último mês de outubro apontam
que de todo o esgoto produzido no país, apenas 38% passa por algum tipo de
tratamento. Isso significa que mais de 100 milhões de brasileiros, mais da
metade da população do país, não possui acesso aos serviços de saneamento
básico e todo esgoto produzido por essa população é despejado in natura em
nossos mananciais. O levantamento, intitulado Ranking do Saneamento mostra que
a coleta de esgotos chegou a 61,40% da população nas 100 maiores cidades do Brasil
e à somente 48,1% no restante do país, no ano de 2011.
“Desde os anos de
1970, a prioridade dos governos foi levar água de qualidade para as pessoas,
mas houve um descaso generalizado com o esgoto. Algumas regiões, como o Sudeste
se desenvolveram mais rapidamente e estão mais avançadas, mas regiões como o
Norte e Nordeste são as que mais sofrem com este descaso histórico”, enfatiza
Édison Carlos, presidente do Instituto Trata Brasil.
Álvaro José Menezes
da Costa, presidente da Companhia de Saneamento de Alagoas (CASAL) e
vice-presidente da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental
(ABES), comenta que as água superficiais estão sendo agredidas de forma muito
acentuada. “Ao longo de muitos anos as cidades vêm crescendo sem planejamento e
sem controle, levando a uma expansão habitacional muito superior ao crescimento
de sistemas de coleta/tratamento de esgotos e drenagem urbana. Assim, rios,
lagoas e mares sofrem com o lançamento de esgotos in natura e de águas servidas
que não são coletadas por sistemas públicos de esgotamento sanitário ou, muitas
vezes, são lançadas em redes de drenagem de forma clandestina ou até
intencional”, aponta. Segundo Menezes da Costa, problemas na gestão dos
serviços provocam o transbordo de esgoto em áreas públicas, o que acaba
chegando aos corpos d’água e se infiltrando no solo.
Mauro Banderali,
especialista em instrumentação hidrometeorologica da Ag Solve, explica que
embora a disponibilidade de água no Brasil seja imensa, é preciso garantir sua
qualidade para as gerações futuras. “Por isso, ao detectar contaminantes nas
reservas de água subterrânea e superficial, é necessário tomar medidas para
evitar o agravamento do problema causado pelo esgoto. É necessário que se
invista em tecnologia para que as gerações futuras possam desfrutar a imensa
quantidade de água disponível no território brasileiro com qualidade”, aponta.
Problema de saúde
pública
A falta de sistemas
de esgotos nas cidades é sem dúvidas um problema de saúde pública, pois pode
provocar doenças que são transmitidas por meio hídrico ou pelo contato direto
com o esgoto. “O estudo “Esgotamento Sanitário Inadequado e Impactos na Saúde
da População”, realizado pelo Trata Brasil, mostrou que em 2011, quase 400 mil
pessoas foram internadas por diarreia no Brasil. São números expressivos que
representam uma grande parcela de um montante gasto em saúde pública no país. O
estudo mostrou também que cidades que investiram em saneamento básico ao longo
dos anos hoje chegam a gastar 40 vezes menos em saúde do que as cidades que
nada investiram e convivem com as doenças da água poluída”, confirma Édison
Carlos, do Trata Brasil.
Para Álvaro José
Menezes da Costa os esgotos a céu aberto ou decorrentes de sistemas
fossa-sumidouro também podem trazer danos à saúde pública. “Nos últimos anos, é
visível a relação entre gastos no Sistema Único de Saúde (SUS) e ausência de
redes de esgoto. Mais de 88% das mortes por diarreia no mundo decorrem de falta
de redes de esgoto e no Brasil este número é superior a 80%. Em 2011, mais de R$
140 milhões foram gastos com internação pelo SUS para tratamento de diarreias
no Brasil”, salienta o presidente da CASAL.
Mauro Banderali
defende que o tratamento do esgoto deve ser realizado para garantir a saúde da
população e o acesso à água de qualidade. “Mesmo que a água for utilizada para
fins não potáveis, deve-se atingir um padrão mínimo de qualidade e monitorar a
quantidade de compostos químicos que estão presentes na água. Iniciativas para
recuperar a qualidade das águas dos rios, mares e lagos são essenciais para a
saúde das próximas gerações”.
Saneamento ainda não
é prioridade no país
O setor de saneamento
ficou sem recursos para esgotos por mais de 20 anos, durante as décadas de 1980
e 1990. Hoje, apesar dos recursos existentes, o uso não está sendo aplicado
corretamente em razão da falta de planejamento e gestão dos anos anteriores.
“Segundo dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS) do
Ministério das Cidades, o Brasil tem investido entre R$ 8 e R$ 9 bilhões ao ano
quando deveria estar investindo acima dos R$ 15 bilhões para poder
universalizar o acesso à água e esgotos, nos próximos 20 anos”, revela Édison
Carlos. Ele comenta que o Instituto Trata Brasil monitora 138 obras de esgotos
do Programa de Aceleração e Crescimento (PAC). “Constatamos que após cinco anos
do início do projeto, somente 14% das obras de esgotos estão prontas; a
maioria, 65% das obras, estão atrasadas, paralisadas ou sequer começaram. Significa
que ainda há muito a ser feito”, expõe.
“Foram aplicados entre
2006 e 2013, com recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), R$
16,8 bilhões, graças aos movimentos da sociedade em favor da proteção
ambiental, sendo que R$ 7,5 bilhões (44%) foram destinados a obras de
esgotamento sanitário. Esse investimento representou um avanço, já que para
abastecimento de água a aplicação dos recursos chegou a 26%”, garante Álvaro
Menezes da Costa. Segundo o vice-presidente da ABES, o próprio Plano Nacional
de Saneamento Básico (PLANSAB) prevê aproximadamente R$ 290 bilhões para
esgotamento sanitário e R$ 160 bilhões para abastecimento de água. “Está
havendo uma mudança de perfil dos investimentos com recursos públicos e as
próprias Parcerias Público Privadas (PPP) já buscam atuar mais na área de
esgotos”, confirma.
Medidas para resolver
o problema do esgoto
Municípios que
despejam esgoto nos rios têm que elaborar urgentemente planos e projetos para
tratá-los. Segundo Banderali, a tecnologia pode ser uma grande aliada para o
monitoramento do nível de poluição dos mananciais. “O monitoramento da
qualidade das águas pode ser realizado com o uso de equipamentos de alta
tecnologia, capazes de mensurar os mais diversos parâmetros das águas
superficiais e subterrâneas”, garante. “Não adianta ficarmos na ilusão que
nossos rios serão limpos, se estas cidades continuam jogando milhares de litros
de esgoto diariamente em nossas águas. É preciso que a população cobre
providências dos prefeitos para que deem prioridade total ao tema. É necessário
também que se reduza a burocracia para acesso aos recursos financeiros do
Governo Federal e as licenças ambientais saiam mais rapidamente para as obras
de água e esgotos”, salienta o presidente do Instituto Trata Brasil.
Para Menezes da
Costa, duas ações são fundamentais: implantar sistemas completos de esgotamento
sanitário e proteger os mananciais, conservando e preservando as bacias
hidrográficas. “É claro que tudo isso deve vir precedido de planejamento para
rápida elaboração de bons projetos, obras bem executadas e da existência de entidades
capacitadas para fazer a gestão dos serviços”, expõe. (ecodebate)
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