A pergunta mais comum
quando há inverno rigoroso no Hemisfério Norte é “e o tal do aquecimento
global”? Nada a ver. O aquecimento global, diz o consenso científico, provoca
mudanças climáticas, criando um ambiente de extremos. Muito calor, muito frio,
muita chuva ou neve, muita seca. Qual a diferença? Os períodos de calor e seca
tendem a ser mais longos e frequentes que os períodos de frio e precipitação. O
número de dias e noites quentes aumenta, o número de dias e noites frias
diminui. As chuvas e as nevascas tendem a ser mais fortes, porém concentradas
em menos dias. Muita precipitação, concentrada em pouco tempo. O ano de 2013
foi o quarto mais quente desde que se começou a registrar temperaturas com
instrumentos, em 1880. Dos 10 anos mais quentes registrados, nove são do século
21. O mais quente foi 2010.
A relação entre
maiores temperaturas médias e nevascas fortes é fácil de entender. O
aquecimento faz com que a atmosfera concentre mais umidade. No inverno, se
houver grandes concentrações de ar frio (como está acontecendo), será maior o
risco de grandes nevascas. É também essa umidade retida em maior quantidade na
atmosfera que explica o aumento das chuvas torrenciais. Até aqui, é questão de
física clássica trocada em miúdos. A capacidade do ar de reter vapor de água aumenta
exponencialmente com a elevação da temperatura.
Então, é possível
dizer que as nevascas nos Estados Unidos, a onda recorde de calor no Brasil e
na Austrália, a seca na Califórnia são resultados da mudança climática que já
está afetando nossa vida diária? Não é tão simples. Se 99% dos cientistas
concordam que o aquecimento global provoca a mudança climática, que leva a
quadro de extremos de temperatura, seca e precipitação, não há esse mesmo grau
de concordância sobre a possibilidade de atribuir à mudança climática um evento
em particular, como os que acabei de mencionar.
Os cientistas estão
divididos em dois grupos. Nenhum dos dois tem dúvida de que a mudança climática
é real e que sua aceleração é causada pelas emissões de gases estufa oriundas
da atividade humana. Há um aquecimento causado pelo ciclo natural do planeta,
mas sem a contribuição humana, esse aquecimento e seus efeitos seriam muito
mais lentos. O aquecimento rápido que se está observando só pode ser explicado
pela ação humana. Contudo, uma parte dos cientistas diz que os modelos e dados
disponíveis hoje não permitem dizer se a nevasca nos Estados Unidos ou a onda
de calor na Austrália e no Brasil já refletem a mudança climática em curso.
Outros dizem que as
anomalias se tornaram tão frequentes, por tantas décadas, e se aproximam tanto
daquilo que os modelos preveem que é possível dizer que estamos diante das
primeiras manifestações concretas da mudança climática. Uma coisa é certa. As
condições climáticas ficaram mais extremas em todo o planeta. Os recordes de
calor, secas, chuvas, frio e neve vêm sendo batidos com maior frequência.
Falando de um efeito concreto: todos os anos, de 2005 a 2013, eventos
climáticos extremos afetaram a produção agrícola em todas as partes do
planeta.O índice de preços de alimentos da FAO subiu muito e nunca mais voltou
aos níveis pré-2005.
Vivemos verdadeira
“inflação climática”. A propósito, 2005 foi um ano de furacões, entre eles o
Katrina, que destruiu Nova Orleans. Nesse período, no Brasil, tivemos várias
quebras na safra de cana, que reduziram a produção de etanol e elevaram o preço
do açúcar. Cresce o número de climatologistas que dizem não ser mais possível
negar que essa série significativa de eventos extremos seja resultado da
mudança climática em curso. Para meus olhos de leigo, o clima anda esquisito
demais para ser considerado normal. Só se for o “novo normal”, mas, aí, já é a
mudança climática. (ecodebate)
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