domingo, 27 de abril de 2014

A fome não é um alvo fixo

Embora a expansão produtiva seja essencial num mundo que terá 9 bilhões de pessoas em 2050, ela não basta para vencer a batalha da fome.
Não há bala de prata para vencer a fome que enreda as vidas de 840 milhões de pessoas no planeta. A insegurança alimentar que a reproduz não é um alvo estático, mas um processo. Equacioná-la requer idêntica abrangência e dinamismo.
Esse discernimento é essencial diante de um desafio que se transforma sob impulsos variados, que vão desde legados estruturais de injustiça a eventos extremos, cada vez mais frequentes, de natureza ambiental, econômica ou especulativa.
Todos os recursos são bem-vindos na luta contra a fome; mas a tecnologia essencial é o compromisso político com a sua erradicação. Sem esse passaporte, dificilmente o futuro escapará de reproduzir as iniquidades do passado.
Subtrair espaços à incerteza que interliga o carrossel perverso requer uma agenda de capacitação de governos e de atores sociais, além de ferramentas específicas, de protagonismo público e privado, e legislações que salvaguardem os avanços na forma de políticas de Estado duradouras.
Embora a expansão produtiva seja imprescindível num mundo que terá 9 bilhões de bocas a alimentar em 2050, ela não basta para vencer a batalha da fome. Essa é uma guerra marcada sobretudo pelo desafio do acesso e da qualificação produtiva. Mantidas as tendências atuais, será preciso aumentar a produção em 60% para atender à demanda mundial em 2050 - ainda assim cerca de 300 milhões de pessoas continuarão excluídas do direito à alimentação se não superarmos as barreiras de acesso.
O voluntarismo, que acredita ser suficiente dar liberdade à oferta para saciar a demanda, esbarra nesse cenário desconcertante em que a fome perfila ao lado da fertilidade à espera de políticas públicas que as reconcilie.
Reverter esses paradoxos requer uma ação em diversas frentes. A agricultura familiar é um dos ativos estratégicos nessa travessia. Dois dados resumem seu potencial irradiador: cerca de 70% das pessoas em situação de insegurança alimentar vivem nas áreas rurais dos países em desenvolvimento, e 450 milhões de agricultores familiares - 85% do total nessa categoria - têm como principal recurso produtivo a sua própria força de trabalho. Acudir simultaneamente a urgência, por meio da transferência de recursos, e atacar a dimensão estrutural do problema, vinculando o lado produtivo com o social, foi o que fez do caso brasileiro um êxito reconhecido, a ponto de propiciar as bases para uma meta ainda mais ousada, o "Brasil Sem Miséria", e transformar o programa brasileiro de segurança alimentar, o "Fome Zero", em política referencial no mundo em desenvolvimento.
Nada mais ilustrativo que a amarração de diversas ações do que as compras locais da agricultura familiar para abastecer a alimentação escolar. Compare-se com a alternativa convencional, que durante muito tempo predominou em países pobres e em desenvolvimento, a chamada ajuda alimentar vinculada a importações subsidiadas de excedentes dos celeiros ricos. Frequentemente, seu efeito foi oposto ao benefício prometido. Em muitos países a dependência externa do abastecimento a preços deprimidos tornou inviável o cultivo local, acentuou o êxodo rural, inchou periferias miseráveis e amplificou a fome em vez de combatê-la. No entanto, dezenas de países mostram que há alternativas. Cerca de 60 países em desenvolvimento já alcançaram a Meta do Milênio, de reduzir pela metade a proporção de pessoas subnutridas. O Brasil é um deles e inspira outros países na luta contra a fome.
O papel da FAO é apoiá-los nessa caminhada. Para fazê-lo, a organização enfoca suas ações em torno de cinco objetivos que, juntos, ajudarão países a transformar o sonho da segurança alimentar em realidade: o fortalecimento do compromisso político contra a fome; o uso sustentável dos recursos naturais, a redução da pobreza rural, a facilitação de sistemas de alimentação mais eficientes e inclusivos, e o aumento da resiliência de comunidades rurais a choques externos. O desafio é grande, mas a esperança e as possibilidades também, com a consolidação do apoio à agricultura familiar e o fortalecimento da proteção social como linha de passagem para o crescimento sustentável e inclusivo das nações em desenvolvimento. (OESP)

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