IPCC: mundo está pouco preparado para impactos das mudanças climáticas
Planeta já sente as consequências do aquecimento e no futuro ameaças
serão amplificadas, conclui relatório divulgado neste domingo.
Reunião do IPCC aconteceu em Yokohama, no Japão.
Mudança climática
não é um problema para o fim do século. Já está acontecendo agora, causando
impactos ao ambiente e aos seres humanos em todos os continentes e através dos
oceanos. Para o futuro, vai amplificar os riscos relacionados ao clima já
existentes e criar novos riscos para os sistemas naturais e humanos. E, por
enquanto, o mundo está muito pouco preparado para lidar com essa situação.
Em poucas palavras,
esse é o quadro pintado pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças
Climáticas (IPCC) na segunda parte do seu quinto relatório, divulgado
em 30/03/14, à noite (horário de Brasília) em Yokohama, no Japão.
A mensagem está
presente no "Sumário para Formuladores de Políticas", uma introdução
não-técnica do documento de mais de 2 mil páginas e 30 capítulos, que trata
dos impactos, adaptação e vulnerabilidade às mudanças climáticas.
Junto com a
constatação de que o mundo já está pagando a conta pelas emissões desenfreadas
de gases de efeito estufa a partir da Revolução Industrial, o relatório aponta
que ainda há oportunidades para lidar com os riscos. Na maior parte dos casos,
medidas sérias de adaptação, aliadas com outras para reduzir as emissões do
planeta, podem fazer com que riscos que seriam de alto nível se nada for feito,
caiam para um risco médio ou baixo.
No entanto, quanto
mais tempo se levar para fazer isso, a dificuldade vai aumentar, assim como os
custos. "Magnitudes crescentes de aquecimento aumentam a probabilidade de
impactos severos, generalizados e irreversíveis", afirma o sumário. E
com o tempo vai se chegar a um limite em que talvez não haja mais o que
fazer."A mensagem mais importante deste relatório é que gestão da mudança
climática é um desafio de gerenciamento de riscos. Vemos uma ampla gama de
possíveis resultados - alguns deles muito sérios. E também vemos as mudanças
climáticas interagindo com outros fatores, muitas vezes agindo como um
multiplicador dessas ameaças", disse ao Estado o pesquisador
norte-americano Chris Field, co-chair do Grupo de Trabalho 2, do IPCC, que
elaborou o documento.
"O problema
real não é se teremos 2 °C ou 3 °C de aquecimento, mas se, uma seca, por
exemplo, vai aumentar a propensão a incêndios que uma vez que começam acabam se
estendendo por milhares de quilômetros quadrados. Enquadramos o desafio das
alterações climáticas de uma forma a permitir que as pessoas entendam que é uma
questão de gerenciamento de risco e de aplicar as ferramentas que já temos para
fazer esta gestão de uma forma mais inteligente", complementa.
Field lembra que a
adaptação não é uma tarefa exótica, que nenhum governo nunca tentou. O
relatório ressalta várias experiências que estão sendo feitas ao longo do
mundo, mas ainda em uma escala muito pequena, que precisa se expandir.
"Acho que está
claro que em todo o mundo ainda não estamos preparado para o riscos que estamos
enfrentando agora. Muito do desafio de lidar com a mudança climática é que as
pessoas tendem a pensar que é necessário um passo gigante, que vamos fazer uma
coisa e estaremos todos preparados, mas uma coisa que vem do relatório é que
para lidar com a mudança do clima talvez sejam necessários 500 pequenos
passos."
Dimensão humana
Os impactos já
observados afetam a agricultura, a disponibilidade de água, a saúde humana, os
ecossistemas no continente e nos oceanos e alguns modos de vida. Em geral, os
problemas têm ocorrido em todo o mundo, sejam países ricos ou pobres, mas o
grau de vulnerabilidade varia, normalmente sendo maior entre os mais
marginalizados.
Ao longo do século
21, as mudanças climáticas podem "desacelerar o crescimento econômico,
fazer com que a redução da pobreza seja mais difícil, erodir ainda mais a
segurança alimentar, e prolongar as existentes e criar novas armadilhas da
pobreza, particularmente nas áreas urbanas e pontos onde há muita
fome".
Este relatório, ao
contrário dos anteriores do IPCC, teve um foco maior na "dimensão
humana", explica Field. "Mais atenção sobre como as pessoas serão
afetadas pode ajudar a garantir que elas saiam de uma condição de fome ou
violência e tenham vidas mais confortáveis", diz.
A iniciativa foi
bem recebida por ONGs ambientalistas que acompanharam os trabalhos na semana
que passou. "Pela primeira vez o IPCC tem um capítulo inteiro sobre
segurança humana, que fala sobre conflitos violentos, migração. As mudanças
climáticas não são só um problema para ursos polares, recifes de corais e a
floresta tropical, mas é sobre nós", afirma Kaisa Kosonen, do Greenpeace.
O relatório também
traz de modo mais aprofundado a questão da segurança alimentar, que ajuda a
compor esse quadro mais humano. No relatório de 2007, o IPCC colocava, por
exemplo, a possibilidade de que em algumas regiões mais altas e mais frias
poderiam se beneficiar se tornando mais aptas para a agricultura - o que talvez
pudesse compensar as perdas em outras regiões.
Agora o texto é
claro em mostrar que o que já temos visto são somente os impactos negativos. E
aponta também para a relação mais abrangente do problema, relacionado com o
aumento de preços dos alimentos. "O documento reconhece que um clima mais
extremo significa também que enfrentaremos os preços dos alimentos mais
extremos", comenta Tim Gore, da ONG Oxfam. "A nova história dos
impactos climáticos nos alimentos é que não é apenas sobre os pequenos
produtores nos países pobres, mas como os grandes produtores exportam e os
altos preços vão afetar milhões de pessoas nas áreas rurais e urbanas",
complementa. (OESP)
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