Brasil tem condições de chegar ao desmatamento zero, diz
secretário do MCTI
Em entrevista a programa televisivo, o secretário de Políticas e
Programas de Pesquisa e Desenvolvimento do Ministério da Ciência, Tecnologia e
Inovação (MCTI), Carlos Nobre, destacou a viabilidade de o país reduzir ainda
mais o desmatamento e contribuir para a diminuição das emissões de gases de
efeito estufa. “Há condições plenas de chegarmos ao desmatamento zero”, afirmou
o climatologista.
Na conversa com o jornalista José Roberto de Toledo, no programa A
Notícia da Rede TV, que foi ao ar em 16/06/14,
Nobre lembrou que o país tem, cada vez mais, se aproximado da meta
estabelecida pelo governo de reduzir os desmatamentos na Amazônia para 3.600 km2
por ano até 2020.
“O Brasil iniciou com muito sucesso uma política pública de redução do
desmatamento. Nós saímos de 27 mil km2, de 2004 para 2005, desmatados na Amazônia e
numa área grande do Cerrado. Nos últimos anos, ficamos em torno de 5.000 km2 e o esforço é ainda maior”, disse o cientista ao ressaltar a redução de
80% dos desflorestamentos no período entre 2008 e 2010.
A expectativa é de que esse comportamento se mantenha em novas análises
referentes aos últimos anos. Na sua avaliação, trata-se de um fator relevante
para o Brasil, já que o desmatamento contribui para grande parte das emissões.
Para exemplificar, o pesquisador compara o tamanho de um campo de futebol a 10.000
km2 de floresta desflorestada, o que
representaria de 120 a 150 toneladas de gás carbônico a serem enviadas à
atmosfera.
Segundo Nobre, de cerca de 2 milhões de km2 existentes
no Brasil, em forma de pastagens, estão degradados ou sendo convertidos para
formas de agricultura mais produtivas, com a produção, por exemplo, de
bioetanol (combustível renovável produzido a partir de resíduos
agroindustriais, como o bagaço de cana). Para o secretário, apostar na energia
renovável e numa agricultura mais eficiente é uma estratégia significativa
diante do desafio de evitar um processo acelerado de aquecimento global.
Produtividade agrícola
O cientista destaca, ainda, o desacoplamento das emissões com o
crescimento econômico. “A agricultura brasileira aumentou a sua produtividade,
nesses últimos oito anos, como ocorreu na Amazônia e o desmatamento caiu”, frisou
o pesquisador ao defender a necessidade de mais ciência, precisão e alta
tecnologia e tecnificação no campo, bem como redução da área plantada e maior
produção.
“Hoje a agricultura moderna brasileira já se deu conta de que o caminho
da agricultura mundial é o aumento da produtividade. No Brasil, ainda que
tenhamos excelentes exemplos de agricultura de ponta com altíssima
produtividade, o potencial está longe de ser atingido”, ressaltou o cientista,
que sustenta a importância de o país conhecer melhor a sua biodiversidade e
descobrir novas maneiras de agregar valor aos produtos agrícolas.
Ele citou o exemplo da produção de açaí no Norte do país: “Um hectare em
produção de açaí rende em média entre R$ 2 mil e 2,5 mil de lucro para o
produtor, enquanto um hectare destinado à criação de gado rende entre R$ 150 e
200”. A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), comentou o
secretário, descobriu uma substância extraída do açaí que atua como um
importante corante para mostrar placas bacterianas.
“Então nós temos muito que ir para essa economia da biodiversidade
brasileira, que é um enorme potencial que o Brasil ainda não explorou, mantendo
a integridade dos ecossistemas”, disse. “Esse é um desafio também de ciência,
de desenvolver conhecimento, e de descobrir novos usos dos produtos da
biodiversidade.”
A ideia é aproveitar a vocação do país para a produção de bioenergia,
bioetanol e seus bioprodutos, como fertilizantes, cosméticos, alimentos e
plásticos. “A indústria chamada química verde está indo muito nesta direção. O
Brasil tem tudo para ser um grande líder da chamada bioeconomia do futuro, quer
dizer: numa economia muito baseada nos recursos naturais”, afirmou.
Aquecimento global
Na avaliação do especialista em mudanças climáticas, embora o desmatamento
tropical tenha registrado queda no Brasil e em outras regiões do planeta, isso
não reduz as preocupações quanto ao aquecimento global. Ele lembra que a
temperatura global aqueceu, em média, cerca de 1°C no continente e pouco
menos (entre 0,6 e 0,7°C) na superfície do oceano desde 1860. “É pisar no
acelerador da máquina climática planetária numa velocidade 50 vezes maior do
que os ciclos naturais, essa é a grande preocupação”, alertou.
Nobre explicou que as sociedades modernas têm injetado uma grande
quantidade de gases na atmosfera que causam o aquecimento – especialmente a
partir da queima de combustíveis fósseis e das florestas e com as atividades
agrícolas –, enquanto a atmosfera não consegue se livrar de 50% desses gases
que, em quantidade excessiva, causam o aquecimento da Terra.
Mesmo que os países reduzam o desmatamento a zero, se o aquecimento
continuar a maioria das florestas tropicais não resistirá a 4 ou 5°C de
aquecimento, disse. “As espécies não se desenvolveram em ambientes com essas
temperaturas e extremos climáticos. Se o clima mudar muito e houver um
descontrole completo do clima, se não conseguirmos reduzir as emissões vamos
ver globalmente um total rearranjo dos ecossistemas dos grandes biomas”,
reforçou.
As projeções agora, na avaliação de Nobre, dependem muito da efetividade
do acordo global dos países feitos na Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre
Mudança do Clima, que tem como um dos aspectos centrais a redução dos riscos
futuros de um superaquecimento. Para evitar isso, as nações concordaram em
fazer todos os esforços para limitar as emissões. O entrevistado analisou que o
desafio agora, para essa sociedade dependente de alimentos e de confortos, é
virar a página e entrar num modelo que mantenha a segurança alimentar,
energética, hídrica e, ao mesmo tempo, reduza as emissões.
“Então esse tem sido o grande dilema: a ciência enxerga esses riscos e
comunica. A convenção climática também aceita que esses riscos existem, tanto é
que, em 2009, em Copenhague, todos os países concordaram que nós não devemos
deixar o planeta aquecer mais que 2°C, mas as emissões não estão reduzindo,
estão aumentando ano após ano”, enfatizou. (ecodebate)
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