quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

O Passado e o Futuro do Cantareira

Imagem do Google maio de 2012
Imagem do Google abril de 2014
No mês em que a crise do maior manancial paulista completa 1 ano, o 'Estado' traz cronologia completa da pior seca da história e uma ferramenta inédita que permite simular como ficará o sistema em 2015.
No dia 27 de janeiro de 2014, a Sabesp emitiu o primeiro alerta público para a seca no Sistema Cantareira. À época, o principal manancial paulista, que abastecia 8,8 milhões de pessoas só na região metropolitana, estava com 23,1% da capacidade, índice mais baixo dos últimos dez anos até então. Segundo a companhia, "a falta de chuvas em dezembro", a pior em 84 anos de registros, "agravou" o problema. "Neste momento é muito importante a sua colaboração. Economize água", pediu aos consumidores em um comunicado de 30 segundos na TV.
Dados oficiais levantados pelo Estadão mostram, contudo, que a estiagem já rondava as represas do manancial. Desde agosto de 2012, o Cantareira recebe um volume de chuva e de seus rios afluentes abaixo da média história. Mesmo assim, a quantidade de água retirada dos reservatórios continuou próxima do limite máximo para atender a Grande São Paulo e mais 5 milhões de pessoas na região de Campinas e Piracicaba. A partir de maio de 2013, o manancial inicia uma trajetória de queda que perdura até hoje, após dois verões.
Um plano de rodízio para os clientes do Cantareira foi feito em janeiro pela Sabesp, conforme revelado pelo Estadão em agosto do ano passado, mas o governo estadual vetou a medida, alegando que ela traria prejuízos à população de baixa renda. Vieram o bônus na conta para quem diminuir o consumo, a transferência de água entre sistemas, uma redução cada vez mais drástica da pressão na rede e, mais recentemente, a multa para os chamados "gastões". Mas as chuvas, não. E até agora todas as ações foram insuficientes para impedir o iminente colapso do Cantareira.
Sem o maior sistema de abastecimento do Estado, os moradores da Grande São Paulo e parte do interior poderão sofrer com longos períodos sem água, uma vez que as obras que podem amenizar a crise só ficam prontas a partir de 2016 e as chuvas continuam uma incógnita. Este especial traz a cronologia completa de 1 ano da crise, com as principais reportagens sobre o tema, um simulador inédito que permite projetar como estará o manancial no decorrer deste ano, além do drama de quem já vive a escassez e as dicas para economizar.
Sistema Volume Morto
Em condições normais, a água sai por gravidade através de uma das seis comportas que ficam distribuídas em uma torre com 18 metros de altura em relação ao nível mínimo de captação.
Em maio de 2014, a Represa Jaguari-Jacareí atingiu o seu nível mínimo. Para manter o abastecimento do maior sistema, a Sabesp instalou 20 bombas e construiu um dique no reservatório para captar a água abaixo das comportas, chamada volume morto.
Com o agravamento da seca no manancial, a Sabesp comprou mais bombas e construiu um canal no meio da represa para que mais de 105 bilhões de litros da segunda cota do volume morto pudessem chegar ao túnel e abastecer a Grande São Paulo.
Medidas adotadas
Redução da pressão
Prática adotada pela Sabesp desde 1997 foi intensificada no começo de 2014, inicialmente no período noturno, para diminuir o desperdício com vazamento na rede. Medida, porém, tem provocado cortes no abastecimento, principalmente em regiões mais altas e periféricas, inclusive durante o dia. Somente em dezembro, a companhia "economizou" 21 bilhões de litros com a redução da pressão, 60% de toda economia obtida no mês. Ação será intensificada.
Programa de Bônus
Medida que dá desconto de até 30% na conta para quem economizar água foi lançada pela Sabesp no dia 1º de fevereiro para os clientes atendidos pelo Cantareira e ampliada em abril para toda a Grande São Paulo e parte do interior. Em dezembro, 78% da população havia reduzido o consumo de água, gerando uma economia de 12,8 bilhões de litros. Programa foi estendido até o fim deste ano.
Transferência de sistemas
Como parte da rede de distribuição da Sabesp é interligada, a companhia começou em 2014 a transferir água dos Sistemas Alto Tietê, Guarapiranga e Rio Claro para bairros da capital que eram abastecidos pelo Cantareira. Medida chegou a resultar em uma redução de 4,8 mil litros por segundo na produção do manancial em crise, mas acabou colocando outro sistema, o Alto Tietê, em estado crítico.
Bombardeio de nuvens
Em fevereiro, a Sabesp contratou por R$ 4,5 milhões uma empresa especializada na técnica de bombardeio de nuvens para provocar chuva artificial sobre as represas do Cantareira. Em julho, quando o volume útil do manancial já havia acabado, a companhia contratou o mesmo serviço, por R$ 3,7 milhões, para fazer chover no Alto Tietê. À época, a Sabesp disse que a prática já havia resultado na queda de 11,5 bilhões de litros no Cantareira. A prática deve continuar.
Multa da água
A sobretaxa na conta de água foi anunciada pela primeira vez em abril pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB) para entrar em vigor no mês seguinte, o que não ocorreu. Em julho, durante a campanha pela reeleição, o tucano desistiu de adotá-la alegando que a população estava economizando. Em dezembro, porém, Alckmin retomou a proposta, que prevê multa de até 100% para quem consumir mais agora do que antes da crise e entrou em vigor no dia 8 de janeiro.
Especialista
Estocar água. Esta é uma das alternativas que Maria Cecilia Wey de Brito, secretária-geral do ONG WWF-Brasil, indica para a população da Grande São Paulo, diante do colapso total dos reservatórios. "As pessoas tem que estocar água, mesmo com todos os riscos. Se for guardar, faça isso em lugar fechado para não dar dengue. É o que nos restou", afirmou. De acordo com ela, a população também precisa mudar o pensamento em relação às chuvas. Não é porque há precipitações pontuais que os reservatórios irão ficar cheios novamente. Muita gente ainda tem aquela leitura da chuva do dia, uma ilusão de que se chover bastante vai resolver o problema. O governo nos ajudou a ficar em uma situação pior que não vai ser resolvido em médio prazo. Para o Cantareira encher vai ter que ser dilúvio. Não tem área de reservação nova", disse Maria Cecilia. "A possibilidade de ficar sem água vai acontecer. A indústria vai brigar para ter água, o restaurante também, a dona de casa vai precisar para tomar banho e dar de comer. Não vai ser um conflito fácil de se mediar, não sabemos como vai ficar."
Transparência e informação. Ainda de acordo com a especialista, os governos federal, estaduais e municipais precisam deixar claro para a população de que a água pode acabar. "Tem que deixar claro para a população o que está acontecendo, dizer que a água está acabando e que o governo vai ter que tomar atitudes. Precisa informar o horário que vai faltar água e explicar como a Sabesp está manejando o sistema", disse.
Maria Cecilia Wey de Brito, Secretária-Geral da WWF- Brasil e ex-Secretária de biodiversidade e florestas do Ministério do Meio Ambiente.
Depoimentos
Eu acho que vai acabar (a água). Não foi desenvolvido um sistema que pudesse suportar uma estiagem maior. A gente nunca se imaginou em uma situação como essa. Eu pretendo espaçar mais a utilização da água e já venho fazendo isso. É dessa forma que eu vou contribuir. Mas, estocar, ainda não pensei nisso.
Fernando Foggeti, de 48 anos, dono de cervejaria no Paraíso.
O governo esperando que Deus é brasileiro não tem nada a ver. Eles deveriam ter tomado providências em 2004, quando estava sendo alertado que a água estava diminuindo e que iria acontecer isso. Agora, o que vai acontecer não tem como prever, mas que vai ser uma calamidade, isso vai. Já pensou? Do jeito que está, nesse calor insuportável, a chuva que cai evapora por causa do calor. Você acha que vai ter aumento no Cantareira e nas outras represas? Não vai. Tenho muito temor nisso. Não tem mais de onde tirar.
Marilu Romano, de 60 anos, professora, moradora de Pinheiros.
Se as pessoas não souberem preservar, sim (vai acabar a água). Bom, eu trabalho como faxineira e procuro economizar ao máximo, reutilizar a água. Na minha casa tem água um dia e no outro, não. Eu procuro guardar água nos baldinhos e no dia que tem água eu reponho. (Se acabar) Eu vou embora para a minha cidade. Lá é o Nordeste mas ainda tem água. Eu vim há pouco tempo, há uns quatro meses. Eu já sabia que estava sem água aqui e eu tentei arriscar. Até agora está dando para sobreviver, se não der eu volto.
Mariléia Feitosa da Silva, de 21 anos, faxineira e moradora da favela de Paraisópolis.
Parece que as represas foram construídas no lugar errado. Chove e não encher. A gente vai ter que recorrer a caminhão-pipa, ter mina própria e é lógico que vão 'meter a faca'. A água já acabou várias vezes e a gente chama o caminhão quando falta o dia inteiro. Na semana, sempre falta às dezessete horas e nossa cisterna dura até a meia-noite. Estamos fechando sempre uma hora mais cedo.
Genilson Rodrigues, de 30 anos, gerente de restaurante em Pinheiros.
Dicas para economizar
Uma ducha de 15 minutos, com o registro meio aberto, consome 135 litros.
Com a torneira fechada ao se ensaboar, e reduzindo o tempo de água corrente para 5 minutos, o consumo cai para 45 litros.
Escovar os dentes durante cinco minutos com a torneira não muito aberta consome 12 litros de água.
Mas ao apenas molhar a escova e fechar a torneira enquanto escova os dentes e, ainda, enxaguar a boca com um copo de água, é possível economizar mais de 11,5 litros de água.
Uma bacia sanitária com válvula e tempo de acionamento de 6 segundos consome de 10 a 14 litros.
Bacias com volume de descarga reduzido podem economizar de 4 a 8 litros em relação à bacia sanitária tradicional.
Lavar a louça com a torneira meio aberta durante 15 minutos gasta 117 litros de água.
Com a torneira desligada enquanto ensaboa, o consumo cai para 20 litros.
Fazer a barba durante 5 minutos com a torneira meio aberta consome 12 litros de água.
Ao se barbear com a torneira fechada, o consumo cai para 2 a 3 litros.
Molhar as plantas por 10 minutos gasta 186 litros.
No inverno é possível regar dia sim, dia não. O gasto cai para 96 litros de água por dia.
Lavar calçada com a mangueira por 15 minutos leva a um gasto de 279 litros de água.
Usar uma vassoura em vez da mangueira traz 100% de economia de água.
Uma piscina média exposta ao sol e ao vento perde cerca de 3.785 litros de água por mês por evaporação.
Com uma cobertura, a perda é reduzida em 90%, chegando a378,5 litros de evaporação de água por mês.
Lavar o carro por 30 minutos com uma mangueira com meia volta de abertura pode consumir 560 litros.
Para reduzir, basta lavar o carro somente uma vez por mês com balde. Nesse caso, o consumo é de apenas 40 litros. (OESP)

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