“Na ausência de um ajuste
significativo da maneira como bilhões de seres humanos vivem, partes da Terra provavelmente se tornarão próximas a
inabitáveis e outras partes t017)errivelmente
inóspitas, antes do final deste século” - David Wallace-Wells (09/07/2017).
Apesar do frio que atingiu diversas
regiões do Brasil e da América do Sul nos meses de junho e julho, o ano de 2017
deve ficar entre os quatro mais quentes da série histórica que começou em 1880.
O mundo convive com grandes contrastes dos efeitos climáticos extremos.
Enquanto várias regiões do hemisfério Norte marcaram altas recordes de
temperatura (como Phoenix no Arizona e Ahvaz no Irã), houve baixas temperaturas
em diversas localidades do hemisfério Sul. Ou seja, o aquecimento global não
apresenta uma tendência de elevação continua e uniforme, mas sim uma espiral
que flutua e varia, mas com inclinação ascendente no longo prazo, como mostra a
curva de Keeling (ALVES, 16/11/2016).
A novidade é que os quatro anos mais
quentes já registrados estão na atual década. Pela primeira vez, os quatro
últimos anos cronológicos também serão os anos mais quentes da série divulgada
pela NOAA. No passado, anos de recorde de temperatura como 1998, 2005 e 2010
eram seguidos de anos bem mais frios. Porém, desde 2014, o piso se elevou e as
temperaturas entraram em um outro patamar de aquecimento, com 0,74ºC acima da
média do século XX em 2014, 0,90ºC em 2015, 0,94ºC em 2016 e algo entre 0,74ºC
e O,90ºC em 2017.
O mês mais frio dos últimos quatro
anos foi fevereiro de 2014, com 0,48ºC acima da média do século XX. O mês de
junho de 2017 foi o mais frio do ano até aqui, mas apresentou anomalia de 0,82ºC
acima da média do século XX e foi o terceiro mês de junho mais quente dos 137
anos da série.
O primeiro semestre de 2017 foi o segundo mais
quente da série histórica para o período de janeiro a junho, conforme mostra o
gráfico abaixo. O primeiro semestre mais quente já registrado foi em 2016, com
anomalia de 1,07ºC acima da média do século XX. O segundo mais quente, com
0,91ºC. acontece agora em 2017. Em 2015 foi de 0,86ºC e em 2014 foi de 0,72ºC.
A linha de tendência entre 1970 e 2017 mostra com o aumento da temperatura tem
sido 0,17ºC por década. A continuar essa tendência a temperatura irá aumentar
mais 1,4ºC até o final do século XXI. Acrescentando o que já subiu, o mundo
ultrapassaria, com folga, o limite de 2ºC estabelecido no Acordo de Paris.
Os dados do primeiro semestre de 2017
confirmam que o mundo está batendo todos os recordes de temperatura antes de
2014 e o ritmo está se acelerando. O gráfico abaixo mostra que o mundo ruma
para a temperatura mais alta dos últimos 5 milhões de anos. Nota-se que poucas
vezes na história, nos últimos 5 milhões de anos, a temperatura ficou acima da
média do século XX. O Antropoceno está rompendo com o equilíbrio climático que
houve no Holoceno e que possibilitou o florescimento da civilização humana.
Se o aquecimento global continuar no
ritmo atual, a civilização estará no caminho de uma catástrofe. Como mostrou o
jornalista David Wallace-Wells, no artigo “The Uninhabitable Earth”, na revista
New York Magazine (09/07/2017): “Na ausência de um ajuste significativo da
maneira como bilhões de seres humanos vivem, partes da Terra provavelmente se
tornarão próximas a inabitáveis e outras partes terrivelmente inóspitas, antes
do final deste século”.
Um estudo das universidades de New
South Wales, na Austrália, e de Purdue, nos Estados Unidos, publicado na
“Proceedings of the National Academy of Sciences”, em 2010, afirma um aumento
de apenas 4ºC medidos por um termômetro úmido levaria metade da população
mundial a enfrentar um calor equivalente a máximas registradas em poucos locais
atualmente. Embora seja improvável que isso aconteça ainda neste século, é possível
que já no próximo, várias regiões estejam sob calor intolerável para humanos e
outros mamíferos. O estudo também ressalta que o calor já é uma das principais
causas de morte por fenômenos naturais e que muitos acreditam, erroneamente,
que a humanidade pode simplesmente se adaptar a temperaturas mais altas. A
fisiologia humana não suporta temperaturas acima de 50ºC. Ou seja, o
aquecimento global pode deixar até metade do planeta inabitável.
Em artigo de abril de 2017,
“Communicating the deadly consequences of global warming for human heat
stress”, publicado também na PNAS, os autores consideram a temperatura média
global do ar está relacionada de forma não linear ao estresse térmico, o que
significa que o mesmo aquecimento futuro, tal como realizado até o momento,
pode desencadear aumentos maiores nos impactos sociais do que historicamente
experimentados. Esta não linearidade é maior para as métricas de estresse
térmico que integram o efeito do aumento da umidade. O artigo mostra que, mesmo
em um clima mantido abaixo da meta de 2ºC do Acordo de Paris, as alterações
climáticas podem se tornar estressadas por calor, expondo mais de 350 milhões
de pessoas a um calor mortal até 2050.
Sem dúvida, acompanhando o aumento da
temperatura global, durante os últimos 50 anos, as ondas de calor ficaram cada
vez mais frequentes. A duração, a frequência e a intensidade das mesmas
provavelmente aumentarão na maioria das zonas terrestres ao longo deste século
antecipando o “cenário de Mad Max” em diversas regiões do Planeta. Artigo de
Emily Atkin (20/07/2017) mostra que as ondas mortais de calor são a maior
ameaça desse século.
E o mais grave é que uma Terra
inabitável e inóspita levará a autodestruição humana, mas também pode levar
junto milhões de espécies que nada tem a ver com os erros egoísticos dos seres
terrestres que se julgam superiores e os mais inteligentes. A humanidade pode
estar rumando para o suicídio, podendo também gerar um ecocídio e um holocausto
biológico de proporções épicas.
A última vez que a temperatura
ultrapassou os 2ºC, no Planeta, foi no período Eemiano (há cerca de 120 mil
anos) e provocou o aumento do nível dos oceanos em algo como 5 a 9 metros. Tudo
indica que a temperatura no século XXI vai ultrapassar os 2ºC em relação ao
período pré-industrial. Os prejuízos poderão ser incalculáveis.
De fato, estamos entrando em um período de
emergência climática. Ao invés de recuar como fez Donald Trump, o mundo precisa
ir além do Acordo de Paris e acelerar o processo de descarbonização da
economia. Caso não haja uma reorientação do estilo de produção e consumo, a
catástrofe climática pode gerar um cenário de Armagedon antes do final do
século XXI e algo muito pior no século XXII. (ecodebate)
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