“Há três aspectos do crescimento da população que podem ser
examinados separadamente, na análise dos efeitos do crescimento da população
sobre o crescimento da renda per capita: a) o volume da população; b) sua taxa
de crescimento; e c) sua distribuição por idade” Ansley Coale e Edgar
Hoover (1958).
Taxas de mortalidade e de
natalidade sempre foram altas, desde o surgimento do Homo sapiens, há cerca de
200 mil anos. Para se contrapor às mortes precoces, as sociedades humanas se
organizaram para manter altas taxas de fecundidade. Na luta pela sobrevivência
e pela continuidade das gerações as mulheres precisavam ter muitos filhos para
se contrapor à baixa esperança de vida ao nascer.
Porém, esta história imemorial
começou a mudar depois da Revolução Industrial e Energética, com o avanço dos
meios de transporte que deram agilidade nas trocas do comércio, possibilitando
incorporação de novas terras agricultáveis e dos melhoramentos da medicina e do
saneamento básico. As taxas brutas de mortalidade começaram a cair nos países
europeus e de colonização inglesa no século XIX e a queda se generalizou para
todos os países ao longo do século XX. O aumento da sobrevivência possibilitou
a redução da fecundidade, pois já não era necessário tantos nascimentos para
repor os falecimentos. Embora a França tenha sido precocemente pioneira ainda
na primeira metade do século XIX, a redução da fecundidade é um fenômeno que se
espalhou pelo mundo essencialmente do século XX.
O fenômeno da passagem de altas
taxas para baixas taxas de mortalidade e natalidade é conhecido como transição
demográfica e acontece de maneira sincrônica com o desenvolvimento econômico. O
avanço da modernização econômica acelera a transição demográfica, mas o
desenrolar da transição demográfica também atua no sentido de acelerar o
aumento da renda per capita. Um fenômeno reforça o outro
O gráfico abaixo mostra que a População Economicamente Ativa (PEA) era de 31,3% da população total em 1970 e passou para 49% em 2010. Isto quer dizer que cada pessoa na PEA dividia, aproximadamente, sua renda com outros dois dependentes, enquanto, em 2010, divide aproximadamente com apenas um dependente. Exemplificando: considerando a produtividade constante, se cada pessoa da PEA ganhava 100 unidades monetárias em 1970 a renda per capita era de aproximadamente 33 unidades monetárias e, em 2010, passou, aproximadamente para 50 unidades monetárias. Ou seja, apenas pelo efeito do bônus demográfico houve um aumento da renda per capita de 50%.
Portanto, o bônus demográfico no Brasil começou no início da década de 1970. Mas a literatura demográfica e econômica brasileira demorou a perceber as vantagens da mudança da estrutura etária provocada pela transição demográfica. Mesmo no mundo houve um reconhecimento tardio deste fenômeno. Embora o famoso livro População e Desenvolvimento Econômico, de Coale e Hoover, publicado em 1958, já tenha chamado a atenção para os efeitos benéficos da transição da estrutura etária, este tema não entrou nos planos de ação das Conferências Internacionais de População organizadas pela ONU: Bucareste, 1974; México, 1984 e Cairo, 1994.
Quem melhor compreendeu as
vantagens do bônus demográfico foi o Japão, os Tigres Asiáticos (Coreia do Sul,
Taiwan, Singapura e Hong Kong) e depois a China. O bônus demográfico foi
fundamental para possibilitar o aumento das taxas de poupança e investimento e
para viabilizar o alto crescimento da renda per capita destes países do leste
asiático.
No Brasil a discussão do bônus
demográfico só chegou nos anos 2000 e mesmo assim houve resistência por parte
dos demógrafos antineomalthusianos que, explicita ou implicitamente, reforçaram
a perspectiva do pronatalismo antropocêntrico e ecocida e engrossaram as fileiras
do conservadorismo moral e do fundamentalismo religioso.
De qualquer forma, a década
2011-20 era fundamental para o aproveito do bônus demográfico, pois a Razão de
Dependência (RD) estava em seu nível histórico mais baixo. Seria o período
ideal para o Brasil dar um salto na renda per capita e garantir melhor
desenvolvimento humano. Entretanto, o país está vivendo a sua pior década em
termos econômicos de todos os tempos, com grande volume de pessoas fora do
mercado de trabalho.
Para entender as origens do conceito de bônus demográfico e tentar reconstruir a conjuntura que permitiu a aceitação do conceito no Brasil, os mecanismos que viabilizaram a sua difusão na sociedade brasileira e o debate sobre o seu término, ver o texto “Bônus demográfico no Brasil: do nascimento tardio à morte precoce pela Covid-19” (Alves, ago/2020). (ecodebate)
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