Reverter
o desmatamento, plantar árvores e restaurar a vida selvagem é não só um dever
ético, mas também uma tábua de salvação para a própria humanidade.
Nos
últimos 50 anos, nunca se falou tanto em meio ambiente. Contudo, a situação
ambiental do Planeta piorou e, no rumo atual, pode estar caminhando para um
colapso, caso não haja uma mudança de rumo. O homo sapiens surgiu há cerca de
200 mil anos na África e se espalhou por todos os cantos do Planeta. Na medida
em que o número de habitantes crescia e as atividades antrópicas aumentavam o
grau de dominação e exploração, a natureza definhava. A biodiversidade e as
áreas selvagens do mundo estão perdendo espaço e direitos, enquanto as
civilizações humanas foram se tornando onipresentes em um meio ambiente
degradado.
A
Revolução Industrial e Energética que teve início no final do século XVIII
possibilitou um grande crescimento demoeconômico. Nos últimos 250 anos, a
economia global cresceu 135 vezes, a população mundial cresceu 9,2 vezes e a
renda per capita cresceu 15 vezes. Este elevado crescimento demoeconômico foi
maior do que o de todo o período dos 200 mil anos anteriores, desde o
surgimento do Homo sapiens. Mas todo o crescimento e enriquecimento humano
ocorreu às custas do encolhimento e empobrecimento do meio ambiente. O conjunto
das atividades antrópicas ultrapassou a capacidade de carga da Terra e a Pegada
Ecológica da humanidade extrapolou a Biocapacidade do Planeta. A dívida do ser
humano com a natureza tem crescido enquanto se destrói a base ecológica que
sustenta a economia e a sobrevivência humana.
A
cobertura vegetal é uma das principais vítimas da expansão humana. Estima-se
que havia 6 trilhões de árvores no mundo antes da Revolução Industrial, quando
a população mundial era de menos de 1 bilhão de habitantes (6 mil árvores por
pessoa). Mas o rápido crescimento da produção de bens e serviços provocou a
destruição da metade das florestas do Planeta. O número de árvores no mundo
caiu de 6 trilhões para 3 trilhões de unidades, segundo o estudo publicado na
prestigiosa revista acadêmica Science (Bastin et. al. 05/07/2019). E o pior, os
seres humanos estão destruindo 15 bilhões de árvores por ano, enquanto o
aparecimento de novas unidades e o reflorestamento acrescenta somente 5 bilhões
de árvores. Ou seja, o Planeta está perdendo 10 bilhões de árvores por ano e
pode eliminar todo o estoque de 3 trilhões de árvores em 300 anos.
O gráfico abaixo, do site Our World in Data, no início do Holoceno (há cerca de 10 mil anos) havia 10,6 bilhões de hectares cobertas por florestas, arbustos, pastagens e outros espaços selvagens – representando 71% da superfície terrestre do Planeta. O restante – 29% da superfície terrestre do Planeta – é coberta por gelo, rochas, desertos e terras estéreis.
No final da última grande era glacial, estima-se que 57% das terras habitáveis do mundo eram florestadas. Desde então, pessoas em todas as regiões do mundo queimaram e derrubaram florestas. A área florestal diminuiu de 6 para 4 bilhões de hectares. Isso significa que nossos ancestrais destruíram um terço das antigas florestas – uma área florestal com o dobro do tamanho dos EUA foi perdida.
Existem
duas grandes razões pelas quais os humanos destruíram as florestas e continuam
a fazê-lo: a necessidade de terra e a necessidade de madeira. O crescimento da
civilização necessita madeira para muitos propósitos: como material de
construção para casas, infraestrutura ou navios, para transformá-la em papel e
– o mais importante – como fonte de energia. A queima de madeira é uma
importante fonte de energia onde há árvores, mas não há fontes de energia
modernas disponíveis.
Sem
embargo, de longe, o maior motor da destruição das florestas são a agricultura
e a pecuária. A humanidade derruba florestas principalmente para dar espaço
para os campos cultivarem e pastagens para criar gado. Também derrubamos
florestas para dar lugar a assentamentos ou mineração, mas são pequenas em
comparação com a agricultura. O uso da terra para a agricultura não ocorreu
apenas às custas das florestas do mundo, mas também levou ao enorme declínio de
outros espaços selvagens do mundo, os arbustos e as pastagens, segundo o site
Our World in Data (Max Roser, 20/04/2022).
As
tentativas de deter o desmatamento não têm obtido sucesso. Artigo de Mark
Kinver (BBC News, 12/09/2019) mostra que um acordo global histórico destinado a
interromper o desmatamento falhou. Uma avaliação da Declaração de Nova York
sobre Florestas (NYDF) diz que ela não cumpriu as promessas-chave. Lançado na
cúpula climática da ONU em 2014, visava reduzir à metade o desmatamento até
2020 e atingir o desmatamento zero até 2030. No entanto, o desmatamento
continua a um ritmo alarmante e ameaça agravar as mudanças climáticas
perigosas.
Desde
que o NYDF foi lançado há cinco anos, o desmatamento não apenas continuou, como
também acelerou. A quantidade anual de emissões de gases de efeito estufa
resultantes do desmatamento em todo o mundo é equivalente aos gases de efeito
estufa produzidos pela União Europeia. Em média, uma área de cobertura de
árvores do tamanho do Reino Unido foi perdida todos os anos entre 2014 e 2018.
A perda de florestas tropicais representa mais de 90% do desmatamento global,
com o hotspot localizado nas nações da Bacia Amazônica da Bolívia, Brasil,
Colômbia e Peru.
O relatório “Protecting and Restoring Forests: A Story of Large Commitments” (Five-Year Assessment Report, September 2019) mostra que o desmatamento está piorando, cinco anos depois que países e empresas prometeram impedi-lo. Se existiam dúvidas sobre os números do desmatamento (como mostrou Fred Pearce, Yale 360, 09/10/2018), os dados atuais são claros em mostrar o grau de degradação da cobertura vegetal global. O mundo tem cada vez mais gente e cada vez menos árvores. Antes da Revolução a relação era de 6 mil árvores para cada ser humano (cerca de 6 trilhões de árvores para 1 bilhão de seres humanos).
O artigo “Deforestation and world population sustainability: a quantitative analysis”, publicado na revista Nature (Bologna, Aquino, 06/05/2020) mostra a insustentabilidade do crescimento demoeconômico global e conclui: “Com base nas taxas atuais de consumo de recursos e na melhor estimativa de crescimento da taxa tecnológica, nosso estudo mostra que temos uma probabilidade muito baixa, menos de 10% na estimativa mais otimista, de sobreviver sem enfrentar um colapso ambiental catastrófico”.
Evidentemente,
não basta deter o desmatamento e ampliar a área verde para evitar uma crise
climática. Para controlar o aquecimento global é preciso cortar radicalmente as
emissões de gases de efeito estufa. Contudo, o avanço das florestas seria
fundamental como fonte de sequestro do carbono que já está na atmosfera.
No
artigo, Bologna e Aquino dizem o caminho da redução da cobertura verde é
insustentável e apocalíptico: “Em conclusão, nosso modelo mostra que um colapso
catastrófico da população humana, devido ao consumo de recursos é o cenário
mais provável da evolução dinâmica com base nos parâmetros atuais”. Adotando um
modelo combinado determinístico e estocástico, concluímos do ponto de vista
estatístico que a probabilidade de nossa civilização sobreviver é inferior a
10% no cenário mais otimista.
Os
cálculos mostram que, mantendo a taxa real de crescimento populacional e
consumo de recursos, em particular o consumo da floresta, temos algumas décadas
restantes antes de um colapso irreversível de nossa civilização. Para agravar a
situação, ressaltamos mais uma vez que não é realista pensar que o declínio da
população em situação de forte degradação ambiental seria um declínio não
caótico e bem ordenado. Esta consideração leva a um tempo restante ainda mais
curto.
Em 2021, o Brasil foi líder na perda de florestas tropicais no mundo, sendo responsável por 40% da derrubada, segundo dados da Global Forest Watch, ferramenta da organização não governamental WRI (World Resources Institute) em parceria com a Universidade de Maryland, nos EUA. Ao todo, as perdas de florestas tropicais primárias somam 3,75 milhões de hectares (37,5 mil quilômetros quadrados). No Brasil, segundo a plataforma, a perda foi de 1,5 milhão de hectares, ou 15 mil quilômetros quadrados, a maior entre todos os países, como mostra o gráfico abaixo. Isto é preocupante, pois o país abriga a maior floresta tropical do planeta. Além disso, o Brasil tem em seu território aproximadamente 33% das florestas tropicais primárias de todo o mundo.
Desta forma, reverter o desmatamento, plantar árvores e restaurar a vida selvagem é não só um dever ético, mas também uma tábua de salvação para a própria humanidade. Mas de nada adianta plantar árvores se o ser humano continuar na sua marcha louca e insensata para colocar mais gente no mundo e, em média, cada novo habitante vai aumentar o consumo per capita de água, alimentos, moradia, transporte, lazer, etc., o que eleva a Pegada Ecológica bem acima dos limites da Biocapacidade da Terra.
Reservar
metade do Planeta para a natureza é uma forma de evitar o ecocídio e o suicídio
civilizacional. O mundo precisa de algo como seis mil árvores para cada ser
humano para evitar um aquecimento global catastrófico, manter a Terra habitável
e garantir a sobrevivência da biodiversidade do Planeta. (ecodebate)
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