Um estudo sobre as práticas de transição para a agroecologia no Brasil
identificou os principais desafios e oportunidades enfrentados por agricultores
e organizações de apoio nessa trajetória. Trata-se da publicação Agroecologias
do Brasil: potenciais brasileiros para uma agricultura regenerativa a partir da
transição para a agroecologia, um amplo levantamento realizado pela
World-Transforming Technologies (WTT), com apoio do Instituto Ibirapitanga e da
Porticus.
“O principal objetivo desse levantamento é dar visibilidade às
diferentes práticas de agroecologia no país, que pode ser descrita como uma
forma de produzir alimentos saudáveis, sem prejudicar o meio ambiente,
promovendo a sustentabilidade social e econômica das comunidades rurais. Até
então, não havia um mapeamento tão amplo e detalhado dos vários territórios
onde se pratica agroecologia em solo brasileiro e a equipe da WTT se debruçou
sobre várias fontes de informação para construir o que talvez seja o mapa mais
detalhado sobre esse assunto”, explica Andre Wongtschowski, diretor de Inovação
da WTT.
A pesquisa identificou 33 “viveiros” da agroecologia em diferentes
regiões do país, cada um com características e desafios próprios mas, ao mesmo
tempo, com similaridades importantes dentro da imensa diversidade encontrada.
Exemplo disso é que esses territórios puderam ser classificados em três grandes tipos de agroecologia: as camponesas, em que prevalecem atividades circunscritas nas áreas dos estabelecimentos unifamiliares; as territoriais, baseadas em processos territoriais de gestão e manejo comunitário dos recursos naturais; e as intermediárias, em que prevalecem estabelecimentos unifamiliares, mas que são predominantemente baseadas em produtos da sociobiodiversidade.
“Isso mostra que há práticas que unem as várias agroecologias acontecendo no Brasil, ao mesmo tempo em que as especificidades de cada território são fundamentais para compreender os desafios e as potencialidades da agroecologia no país”, afirma Wongtschowski.
Nesta perspectiva, a publicação ressalta que sistemas agroalimentares
desempenham papel econômico central para a manutenção da vida e sobrevivência
de mais de 2 bilhões de pessoas no mundo, o que representa cerca de 10% da
economia global, segundo dados da Organização das Nações Unidas (ONU). Por
outro lado, apesar dos relevantes avanços tecnológicos que contribuíram para
aumentar a produção de alimentos nas últimas décadas, os sistemas
agroalimentares de hoje também são responsáveis por impactos negativos, tais
como o agravamento da emergência climática, perigos para a biodiversidade, a
poluição das águas e do solo, além do risco crescente do surgimento de novas
doenças infecciosas.
Não à toa, pesquisadores do mundo todo têm chamado a atenção para o que
se convencionou chamar de “limites planetários”, uma espécie de fronteira para
que a humanidade continue existindo de forma segura no planeta Terra. Dentre os
nove limites planetários já identificados, quatro deles — mudanças climáticas,
interferência nos ciclos globais de nitrogênio e fósforo, queda da taxa de
biodiversidade e mudanças no uso da terra — já estão comprometidos, em grande
parte por conta do modelo vigente de produção agropecuária, que vem minando a
capacidade da Terra de sustentar a vida humana e das demais espécies.
Por isso, a transição agroecológica representa uma importante missão
para o desenvolvimento sustentável do Brasil. “A política científica do país
deve acompanhar e se integrar a agricultores e agricultoras, suas organizações,
instituições de pesquisa nos territórios e seus sistemas de incentivo e
financiamento, para acelerar e apoiar a difusão deste modelo de agricultura
que, para além do sustentável, se propõe a regenerar ecossistemas e relações
sociais”, recomenda a publicação.
Para que isso seja possível, no entanto, os investimentos ainda
precisam de melhor direcionamento para que as práticas sejam efetivamente
transformadoras. Ainda que o Brasil invista cerca de 1,2% do PIB
(aproximadamente R$ 90 bilhões) em pesquisa e desenvolvimento, apenas uma
pequena parcela desse desenvolvimento científico é orientado por missões que
sejam estratégicas. Ou seja, muito pouco da ciência produzida é feita de
maneira a buscar soluções para os graves problemas sociais ou ambientais do
país.
“Diante deste cenário, é urgente e necessário que se identifique os desafios de inovação da agricultura ecológica, de modo que ela possa ter capacidade para se expandir, em termos sociais e econômicos, dentro das comunidades de agricultura familiar. Afinal, existe um grande potencial de preservação das paisagens naturais que estas práticas agroecológicas podem proporcionar”, sugere o estudo.
A partir dos desafios e oportunidades identificados, a equipe de pesquisa da WTT, juntamente com apoiadores, seguirá em uma nova fase da pesquisa, com lançamento previsto para julho deste ano. “O próximo passo será descrever, desenvolver e disseminar inovações de base científico-tecnológico que ajudem as agricultoras e agricultores a superar esses desafios, dando um novo impulso às agroecológicas no Brasil. Sabemos que esse é apenas um primeiro passo para que a nossa agropecuária possa também ser ecológica e tenha sustentabilidade para o longo prazo”, enfatiza Andre Wongtschowski. (ecodebate)
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