Portugal terá eleições no dia
10 de março de 2024. O presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, dissolveu
o Parlamento e confirmou a realização de eleições legislativas antecipadas após
a demissão, no início de novembro de 2023, do primeiro-ministro socialista, António
Costa. Um dos temas debatidos é a demografia e o decrescimento populacional.
Portugal – mesmo sendo um
país pequeno em termos territoriais e populacionais – foi uma potência mundial
entre os séculos XVI e XVIII, tendo conquistado colônias nas Américas, na
África e na Ásia. Mas Portugal ficou para trás após a revolução industrial que
foi a responsável pela decolagem da Inglaterra, do norte da Europa e depois dos
Estados Unidos.
Portugal ficou muito menor
econômica e politicamente depois da Independência do Brasil, em 1822, e se
enfraqueceu ainda mais no século XX, quando passou por várias mudanças, como o
fim da monarquia e a implantação da República em 1910, a ditadura salazarista
de 1933 a 1974. A Revolução dos Cravos, de 1974, possibilitou a redemocratização
do país e a entrada na União Europeia em 1986. Houve uma euforia com a
integração europeia, mas a crise econômica recente levantado dúvidas sobre o
futuro.
A população portuguesa
cresceu, em ritmo lento, nos séculos XIX e XX, e vai apresentar decrescimento
no século XXI, tendo uma estrutura etária envelhecida. O gráfico abaixo (painel
do lado esquerdo) mostra a evolução da população total de Portugal de 1950 a
2100. A população portuguesa era de 8,4 milhões de habitantes em 1950, chegou
ao pico populacional em 2009, com 10,6 milhões e já apresentou uma pequena
redução para 10,2 milhões de habitantes em 2023.
As projeções da Divisão de
População da ONU mostram diversos cenários demográficos para o restante do
século. Na projeção média (a mais provável), a população portuguesa vai
decrescer para 6,9 milhões de habitantes em 2100. Podendo ser 10 milhões na
projeção alta ou 5 milhões na projeção mais baixa.
A expectativa de vida ao nascer de Portugal estava pouco acima de 50 anos na década de 1950 e chegou a 80 anos na década passada (acima da expectativa de vida dos EUA que até hoje não chegou aos 80 anos). A expectativa de vida caiu durante a pandemia, mas já está se recuperando e deve ultrapassar 90 anos em 2100 (como mostra o gráfico abaixo, painel da direita).
O aprofundamento da transição demográfica implica diminuição dos grupos jovens e de aumento da proporção dos grupos mais idosos. O gráfico abaixo (da esquerda) mostra que a população portuguesa de 0 a 14 anos estava em torno de 2,5 milhões de jovens entre 1950 e 1990, caiu pela metade e deve chegar a menos de 1 milhão de jovens em 2100. O número de idosos (gráfico da direita) era de 1 milhão de pessoas de 60 anos e mais de idade em 1950, deve ultrapassar 3,5 milhões de pessoas em meados do atual século e deve diminuir para 3 milhões de idosos em 2100.
O decrescimento populacional é o resultado do aprofundamento da transição demográfica e da transformação da estrutura etária. Os gráficos abaixo mostram o estreitamento da base e o alargamento do topo das pirâmides populacionais de Portugal entre 1950 e 2100. A pirâmide etária de 1950 tinha uma base larga e um topo estreito, devido às altas taxas de natalidade e mortalidade. Alguns “dentes” da pirâmide são resultados do aumento da mortalidade e redução da natalidade ocorrido durante as duas Grandes Guerras da metade do século XX.
A pirâmide populacional de 2022 mostra uma redução do tamanho dos grupos etários abaixo de 50 anos, refletindo a rápida queda nas taxas de fecundidade que ocorreu a partir da década de 1970, especialmente após a Revolução dos Cravos, de 1974. Já a pirâmide de 2100 apresenta uma base estreita e um topo largo em decorrência da manutenção secular de taxas de fecundidade abaixo do nível de reposição. Portanto, a principal característica demográfica portuguesa no atual século é o envelhecimento populacional, com decrescimento demográfico.
A mudança na estrutura etária gera efeitos diferenciados na razão entre a população em idade ativa e inativa ao longo do tempo. O gráfico abaixo mostra a razão de dependência da população portuguesa de 1950 a 2100. Nota-se que havia 75 pessoas consideradas dependentes para cada 100 pessoas em idade produtiva. A razão caiu para 60 na virada do século e voltou para a casa de 65 em 2022. Este foi o período mais favorável ao aproveitamento do 1º bônus demográfico. Porém, a razão de dependência vai subir rapidamente nos próximos 20 anos, passando a ter mais pessoas em idade dependente do que pessoas em idade ativa. Nesta nova configuração, para avançar nos indicadores de desenvolvimento humano, Portugal terá que aproveitar o 2º bônus demográfico (relacionado ao aumento da produtividade) e o 3º bônus (relacionado à longevidade).
O PIB de Portugal cresceu mais do que o PIB mundial logo após a Revolução dos Cravos. Mas, como proporção do PIB global, iniciou um processo de longo declínio, passando de 0,45% no início dos anos 1990 para cerca de 0,25% na atual década (gráfico abaixo, do lado esquerdo). A renda per capita portuguesa (em preços correntes em poder de paridade de compra) se manteve acima da renda média mundial e tem se beneficiado de ter uma moeda comum da União Europeia (gráfico do lado direito). Portugal já foi considerado um país frágil e com grandes dificuldades econômicas, mas tem conseguido manter uma elevada renda per capita.
O crescimento demoeconômico, em geral, tem impacto negativo sobre o meio ambiente, pois um volume maior da produção e consumo de bens e serviços significa maior extração de recursos ecossistêmicos, com o consequente aumento da poluição e das emissões de gases de efeito estufa. Promover o desenvolvimento socioeconômico conjuntamente com a sustentabilidade ambiental continua sendo uma meta utópica ainda distante de ser colocado em prática.
O crescimento econômico de Portugal nos últimos 60 anos tem aumentado a sobrecarga ambiental. Segundo o Instituto Global Footprint Network, Portugal tinha, em 1961 uma Pegada Ecológica per capita de 2,26 hectares globais (gha) e uma Biocapacidade per capita de 1,24 gha. Portanto havia déficit de 1,02 gha. Mas com o crescimento econômico a Pegada Ecológica per capita passou para 4,55 gha e a Biocapacidade se manteve no mesmo patamar, 1,29 gha em 2018. Assim, o déficit ecológico per capita passou para 3,26 gha, o que representa um déficit relativo de 253%, conforme mostra a figura abaixo.
A dinâmica demográfica de Portugal vai apresentar decrescimento populacional no século XXI e vai chegar em 2100 com uma população menor do que aquela de 1950. Há quem diga que Portugal vai enfrentar um “colapso demográfico”. Mas, na verdade, a chamada crise demográfica é um mito propagado pela ideologia pronatalista, antropocêntrica e ecocida. O crescimento demográfico infinito é impossível de ocorrer em um Planeta finito. Um dia o crescimento tem que chegar ao fim. Como mostrou Edward Abbey (1927-1989): “Crescimento pelo crescimento é a ideologia da célula cancerosa”.
Evidentemente, o decrescimento demográfico traz desafios e oportunidades. O maior desafio decorre do envelhecimento populacional e do aumento da razão de dependência demográfica. Mas com o aumento da produtividade da força de trabalho (2º bônus demográfico) e a maior inserção da população idosa no processo produtivo (3º bônus demográfico) pode existir prosperidade social em Portugal.
Concomitantemente ao decrescimento demográfico pode haver um florescimento do meio ambiente, com menor Pegada Ecológica e incrementos na Biocapacidade do país. (ecodebate)
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