Impactos no desenvolvimento e
desigualdades
O documento “A primeira
infância no centro da crise climática”, produzido pelo Núcleo Ciência Pela
Infância (NCPI), compila evidências que demonstram como as mudanças no clima e
a intensificação de eventos extremos afetam diretamente a saúde, nutrição, aprendizado
e bem-estar infantil no Brasil.
Estima-se que 40 milhões de
crianças e adolescentes brasileiros enfrentam ao menos um risco climático,
sendo que 1,1 milhão sofre com a escassez de água. Globalmente, quase 1 bilhão
de crianças vivem em áreas ameaçadas por eventos extremos.
O cenário é agravado pelo
aumento na frequência e intensidade dos eventos climáticos no Brasil. Dados
mostram um salto expressivo, passando de 1.779 eventos em 2015 para 6.772 em
2023. Ondas de calor, chuvas torrenciais, secas prolongadas e incêndios
florestais impõem riscos significativos, em especial para quem está no começo
da vida. Uma projeção indica que crianças nascidas em 2020 viverão, em média,
6,8 vezes mais ondas de calor e 2,8 vezes mais inundações de rios e perdas de safra
ao longo da vida do que aquelas nascidas em 1960.
Estresse tóxico e prejuízos à
saúde mental, perda de moradia, deslocamentos forçados e o aumento de doenças
infecciosas são apenas alguns dos impactos diretos da crise climática na vida
das crianças na primeira infância.
Os riscos envolvem também
perdas agrícolas e insegurança alimentar, acesso menor a educação de qualidade
e cuidados com a saúde, morte precoce, entre outros.
Esses efeitos são
desproporcionalmente sentidos por populações vulneráveis, como crianças negras,
indígenas e moradoras das regiões Norte e Nordeste do Brasil, reflexo do
racismo ambiental potencializado ainda mais pela pobreza.
O Brasil tem cerca de 18,1
milhões de crianças na primeira infância. Dessas, 8,1 milhões vivem em situação
de pobreza ou extrema pobreza. Além disso, 37,4% das crianças brasileiras de 0
a 4 anos (uma em cada três) vivem em situação de insegurança alimentar, o maior
índice entre todas as faixas etárias. Ao todo, 5,4 milhões de crianças até 4
anos enfrentam algum grau de insegurança alimentar.
A crise climática também
intensifica vulnerabilidades e afeta as relações familiares, comprometendo o
desenvolvimento infantil. A perda de renda e o deslocamento forçado dificultam
a frequência escolar. No país, mais de 4 milhões de pessoas foram desalojadas
por eventos climáticos extremos entre 2013 e 2023. Nas enchentes do Rio Grande
do Sul em 2024, 580 mil pessoas foram desalojadas e mais de 3.930 crianças de 0
a 5 anos foram acolhidas em abrigos públicos.
Crianças deslocadas ainda enfrentam maiores riscos: em abrigos temporários, a incidência de doenças diarreicas é 34% superior à média nacional, e a desnutrição aguda é até 2,5 vezes mais frequente. Projeções indicam também que, até 2050, cerca de 216 milhões de pessoas poderão ser forçadas a migrar devido ao clima, sendo aproximadamente 40% desse contingente composto por crianças.
Impactos na educação
A educação infantil também é
diretamente afetada pela crise climática, que prejudica a concentração das
crianças e destroem a infraestrutura escolar. “Não podemos esquecer que, em
momentos de crise, as escolas viram abrigos as aulas são interrompidas. Sem
aulas, as desigualdades educacionais aumentam ainda mais”, pondera Castro.
Apenas em 2024, cerca de 1,18
milhão de crianças e adolescentes tiveram as aulas suspensas no Brasil,
principalmente por alagamentos. Nas enchentes do Rio Grande do Sul, por
exemplo, estima-se que 55.749 horas-aula foram perdidas na educação básica, com
prejuízos materiais estimados em R$ 2,36 bilhões.
Vale ressaltar que a falta de acesso a espaços verdes nas escolas é uma realidade: 43,5% das escolas de educação infantil em capitais brasileiras não possuem áreas verdes, índice que sobe para 52,4% nas escolas localizadas em favelas e comunidades urbanas.
Crianças e adolescentes são os mais impactados pelos riscos climáticos
Políticas pública de
prevenção
Segundo a publicação, é
fundamental investir em proteção imediata, adaptação, infraestrutura e serviços
resilientes para minimizar esses impactos.
“Proteger a primeira infância diante da emergência climática não é uma escolha, é uma prioridade. Precisamos de políticas públicas urgentes, baseadas em evidências, que considerem as desigualdades sociais e coloquem bebês e crianças no centro das estratégias de adaptação e prevenção”, defende Alicia Matijasevich, professora associada do Departamento de Medicina Preventiva, Faculdade de Medicina da USP, também coordenadora do working paper.
Os impactos da crise climática na vida das crianças
Recomendações incluem fortalecer
a atenção primária à saúde, modernizar saneamento, promover agroecologia e
agricultura familiar integrada a programas de transferência de renda,
estabelecer espaços seguros para acolhimento infantil em deslocamento,
fortalecer saúde mental infantil, priorizar reassentamento digno, criar zonas
climatizadas em creches (bairros densos podem ser 5°C mais quentes, escolas
podem não ter áreas verdes), capacitar educadores e promover a escuta e
participação das crianças na prevenção. (ecodebate)
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