quarta-feira, 3 de dezembro de 2025

Decrescimento demográfico global: danação ou redenção?

 
O decrescimento demográfico global é um fenômeno complexo, podendo ser visto como dano devido a desafios econômicos, como a diminuição da mão de obra e o envelhecimento populacional, mas também como redenção, pela possibilidade de menor pressão sobre o meio ambiente e maior investimento em qualidade de vida e inovação. A transição não é um evento simples, e seu impacto dependerá de como os governos e sociedades se adaptarem através de políticas que promovam produtividade e bem-estar social.

Os desafios (dano)

Mão de obra e economia: Uma população menor significa uma força de trabalho mais enxuta, o que pode desacelerar o crescimento econômico. Países como o Brasil estão perdendo o "bônus demográfico".

Sistemas de bem-estar social: Com mais pessoas idosas e menos jovens entrando no mercado de trabalho, os sistemas de previdência social e de saúde podem ficar desequilibrados, pois mais recursos serão necessários para sustentar a população mais velha.

Dificuldade de adaptação: Muitos países não estão preparados para essa transição, necessitando de políticas de longo prazo para aumentar a produtividade e se adaptar à nova dinâmica demográfica.

As oportunidades (redenção)

Sustentabilidade ambiental: Menos pessoas e um menor consumo podem significar uma redução na degradação ambiental e na emissão de CO2.

Redução de custos sociais: Menor necessidade de gastos com moradia e cuidados infantis pode liberar recursos para serem direcionados a áreas como pesquisa e desenvolvimento, tecnologias avançadas e outras prioridades sociais.

Qualidade de vida: Uma população menor pode significar uma maior qualidade de vida em termos de acesso a recursos e um menor "estresse" sobre o planeta e a sociedade como um todo.

Inovação: Os recursos liberados podem ser investidos em aumentar a produtividade através da inovação tecnológica e da educação, garantindo o bem-estar mesmo com uma população menor.

Fosso demográfico global: regiões com alto crescimento e com decrescimento populacional

Como lidar com o futuro

Planejamento de longo prazo: É fundamental que governos e formuladores de políticas planejem a transição demográfica de forma proativa, focando em aumentar a produtividade e a resiliência econômica.

Foco na produtividade: Em vez de tentar reverter a queda da natalidade, que está ligada a fatores sociais e de emancipação feminina, o foco deve ser em como aumentar a produtividade da mão de obra existente e futura.

Políticas adequadas: É preciso implementar políticas que promovam o aumento da produtividade, a melhoria do sistema educacional e a adaptação dos sistemas de proteção social para construir uma sociedade mais sustentável e equilibrada.

As taxas globais de fecundidade vêm caindo há décadas e estão atingindo níveis historicamente baixos

“Árvores não crescem até o céu” (Provérbio popular)

O mundo atravessa uma transformação demográfica sem precedentes. Pela primeira vez na história, haverá mais idosos do que crianças e a humanidade vivenciará um declínio populacional contínuo a partir da década de 2080, mesmo em um contexto de crescente abundância econômica.

Artigo dos pesquisadores Bloom, Kuhn e Prettner para a revista F&D do FMI (Junho/2025) mostra que o decrescimento populacional traz desafios, mas também oportunidades. Segundo os autores, as taxas globais de fecundidade vêm caindo há décadas e estão atingindo níveis historicamente baixos. Embora a população humana já ultrapasse 8 bilhões e possa chegar a 10 bilhões até 2050, o impulso do crescimento está se dissipando devido ao declínio em seu motor mais poderoso: a fecundidade. Nos próximos 25 anos, o Leste Asiático, a Europa e a Rússia sofrerão declínios populacionais significativos.

O que isso significará para o futuro da humanidade é bastante ambíguo. Por um lado, alguns temem que este fenômeno possa prejudicar o progresso econômico, pois haverá menos trabalhadores, cientistas e inovadores. Isso pode levar à escassez de novas ideias e à estagnação econômica a longo prazo. Além disso, à medida que as populações diminuem, a proporção de idosos tende a se expandir, pesando sobre as economias e desafiando a sustentabilidade das redes de segurança social e das aposentadorias e pensões.

Por outro lado, menos crianças e populações menores significarão menor necessidade de gastos com moradia e cuidados infantis, liberando recursos para outros usos, como pesquisa e desenvolvimento e adoção de tecnologias avançadas. O declínio nas taxas de fecundidade pode favorecer o crescimento econômico, estimulando a expansão da participação na força de trabalho entre os idosos, o aumento da poupança e a maior acumulação de capital físico e humano. O declínio populacional também pode reduzir as pressões sobre o meio ambiente, associadas às mudanças climáticas, ao esgotamento dos recursos naturais e à degradação ambiental.

Claramente, os formuladores de políticas enfrentam escolhas cruciais na gestão das tendências demográficas em desenvolvimento. As respostas podem incluir medidas para incentivar a fecundidade, ajustes nas políticas de migração, expansão da educação e esforços para incentivar a inovação. Juntamente com os avanços na digitalização, automação e inteligência artificial, o declínio populacional iminente de algumas nações representa um desafio significativo, mas também uma oportunidade potencial para as economias nacionais e para o bem-estar global.
O IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) estima que a população brasileira parará de crescer em 2041; na imagem, movimento no comércio na Ladeira Porto Geral, em São Paulo/SP.

População mundial chegará a 8,09 bilhões em 2025

Como mostrei no artigo “Decrescimento populacional com prosperidade social na Coreia do Sul” (Alves, 06/10/2025) a Coreia do Sul tem uma das taxas de fecundidade mais baixas do mundo e já experimenta o decrescimento populacional, mesmo assim continua mantendo crescimento da renda per capita e aumento do poder de compra da população.

O economista Adair Turner, em artigo recente (PS, 03/10/2025), mostrou que a estabilização populacional e o eventual declínio demográfico global facilitariam o enfrentamento do maior desafio ambiental de todos: as mudanças climáticas. Com as temperaturas globais aumentando a um ritmo alarmante, a principal prioridade é reduzir as emissões per capita, melhorando o acesso à energia e garantindo a prosperidade por meio da implantação das tecnologias limpas atualmente disponíveis.

Bloom et al (2025) concluem dizendo que o mundo está vivenciando uma mudança demográfica drástica, do rápido crescimento populacional no século passado ao decrescimento no final do século atual. A queda implacável e abrupta da fecundidade é o principal impulsionador dessa transição, que necessariamente envolve um aumento historicamente sem precedentes no número de pessoas em idade avançada.

População brasileira em 2025

Os formuladores de políticas fariam bem em prestar muita atenção às evidências emergentes e ao discurso global sobre as consequências econômicas e sociais dessas mudanças demográficas. Eles podem não aceitar todas as consequências, mas pelo menos serão capazes de apontar estratégias plausíveis para lidar com elas. (ecodebate)

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