Antropoceno: Ação humana coloca planeta em nova época
geológica, dizem cientistas
Paisagem no
Arizona, EUA/Rochas sedimentares e fósseis serão utilizados para determinar nova
época geológica.
A atividade humana
transformou o planeta de forma tão permanente e vasta nos últimos dois séculos
que a Terra entrou em uma nova época geológica, a Antropocena.
É o que defendem
cientistas e geólogos que discutirão nesta semana o impacto da ação humana e da
natureza sobre os sistemas hídricos globais, na conferência Water in the
Anthropocene (Água no Antropoceno, em tradução livre), organizada pelo Global
Water System Project (GWSP), em Bonn, na Alemanha.
De acordo com os
pesquisadores, o crescimento populacional, a construção de metrópoles, o
desmatamento e o uso de combustíveis fósseis provocaram um efeito no planeta
comparável ao derretimento de geleiras ocorrido há 11.500 anos ─ evento que
marca o início da época Holocena na escala de tempo geológico.
A escala de tempo
geológico estabelece eones, eras, períodos, épocas e idades que permitem
categorizar as diferentes fases que vão da formação da Terra ao presente.
O termo
“Antropoceno“, cunhado pelo Prêmio Nobel de Química Paul Crutzen em 2000 e
adotado por parte da comunidade acadêmica na última década, ainda não é
reconhecido oficialmente.
Segundo a Comissão
Internacional de Estratigrafia (ICS, em inglês), responsável pela definição da
escala de tempo da Terra, estamos, ainda, na época Holocena (iniciada há 11.500
anos).
A Holocena, por sua
vez, faz parte de espaços de tempo geológicos mais extensos: o período
Quaternário (há 1,8 milhões de anos), a era Cenozoica (há 65 milhões de anos) e
o éon Fanerozoico (há 543 milhões de anos).
Para uma ciência que
trabalha com escalas relativas à história de 4,5 bilhões de anos da Terra, o
surgimento do homem (cerca de 200 mil anos atrás) é um fenômeno recente e por
isso costumava ocupar uma posição periférica nos estudos geológicos.
Pela primeira vez, no
entanto, o assunto está sendo analisado formalmente ─ a ICS convocou
especialistas que tem até 2016 para analisar os estratos geológicos e definir o
que seria o fim da época Holocena e o início da Antropocena.
Indícios do
Antropoceno
“O Brasil, que é o
segundo país mais rico em água do mundo, exporta não somente produtos
agrícolas, mas também exporta virtualmente seus recursos naturais para balancear
a ausência de água ou nutrientes do solo em outros países.” Janos Bogardi,
vice-reitor da Universidade da ONU.
“Reconhecer a ideia
do Antropoceno é reconhecer o impacto irreversível das atividades do homem, que
afetam não somente os sistemas de água e recursos naturais do planeta, mas
também o que essas ações significam no futuro das espécies”, disse à BBC Brasil
Janos Bogardi, vice-reitor da Universidade da ONU e um dos moderadores da
conferência em Bonn.
Para demarcar
mudanças na escala de tempo geológica como a proposta do Antropoceno, geólogos
analisam marcas deixadas em rochas sedimentares e organismos fossilizados.
Segundo os
especialistas da GWSP, o homem move mais rochas e sedimentos do que as forças
do gelo, do vento e da água, acelera processos de erosão e libera mais
nitrogênio no ar do que plantas e outros organismos seriam capazes,
principalmente desde a segunda metade do século 21.
Mais do que ocupar a
superfície da Terra de forma extensa, ─ como já aconteceu em épocas anteriores
─ a urbanização, a globalização e o estilo de vida do homem contemporâneo estão
transformando a forma como o planeta funciona.
Dados da GWSP
comprovam que a ação humana é responsável pelo desmatamento de uma área do
tamanho da América do Sul para agricultura e outra do tamanho da África para
pecuária, o que teria impactado o clima, o solo e a vida de espécies no
planeta.
Exportações indiretas
Ação humana teria
causado mudança de Holoceno para Antropoceno
Para Bogardi,
classificar o atual capítulo da história da Terra de Antropoceno funcionaria
não somente como uma mera nomenclatura, mas como um alerta. “As consequências
das ações do homem não afetam o planeta apenas de forma local, mas provocam
coletivamente um impacto na constituição da Terra e discutir isso serve para
minimizar as consequências e danos irreversíveis que afetariam o globo da pior
forma no futuro”, diz.
“O Brasil, que é o
segundo país mais rico em água do mundo, somente atrás da Rússia, exporta não
somente produtos agrícolas para países europeus, mas também exporta
virtualmente seus recursos naturais para balancear a ausência de água ou
nutrientes do solo em outros países.”
De acordo com
Bogardi, o Brasil exporta de forma indireta ─ durante os processos de produção
agrícola e pecuária para exportação ─ 5,7 Km3 de água por ano
somente para a Alemanha.
Por isso, ele
defende, debater o uso dos recursos como a água não seria apenas papel do
Brasil, mas de um esforço conjunto de países. Mas a discussão sobre a nova
época Antropocena seria tanto sobre as “más notícias” e desafios, como sobre
oportunidades e qualidades.
“Parte do crescimento
econômico e desenvolvimento social que o Brasil vive hoje vem dessa enorme
potencialidade do uso de recursos, por exemplo, então a proposta não é acabar
com a ação humana no planeta, mas debater como fazer isso de forma sustentável
para o futuro”, explica. (EcoDebate)
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