terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

‘Arpocalipse’ na China

Crescimento econômico e poluição (‘arpocalipse’) na China
A China apresentou nas últimas 3 décadas o maior crescimento econômico de toda a história da humanidade. Nunca um país cresceu tanto em tão pouco tempo. Também nunca um país teve um impacto negativo tão grande no meio ambiente.
Na verdade, a China sempre foi um país muito avançado culturalmente e esteve na liderança da economia mundial durante séculos antes do início da Revolução Industrial e Energética ocorrida na Europa no final do século XVIII. A decadência chinesa coincidiu com o fim da dinastia Qing (1644-1912), que teve início quando os manchus invadiram a China em 1644 e derrotaram a dinastia Ming (1368-1644). Enquanto o Ocidente avançava, os imperadores Jiaqing (1796-1820) e Daoguang (1820-1850) não deram sequência ao estilo administrativo de seus antecessores e Estado chinês, conservador e rígido, não conseguiu evitar as ameaças externas, como na Primeira Guerra do Ópio (1839-1842) que, entre outras atrocidades, fez a China ceder a cidade de Hong Kong para a Inglaterra. Também a Guerra Sino-Japonesa (1894-1895) tornou a ilha de Taiwan uma colônia do Japão. O 12º imperador da dinastia Qing – Puyi (1908 -1912) foi forçado a abdicar, quando da criação da República da China em 1912, liderada por Sun Yat-Sen. Depois dos sofrimentos da Segunda Guerra Mundial, Mao Tse-tung liderou a formação da República Popular da China, em 1949.
Os 30 primeiros anos da República Comunista não foram fáceis e houve vários fracassos que aumentaram a pobreza do país, tais como:
1) o Grande Salto Adiante (1958-1960), cujos efeitos acarretaram a morte de milhões de pessoas devido à fome.
2) a Revolução Cultural que desorganizou o funcionamento do Estado e dos serviços públicos jogando o país em um caos econômico. Foi somente em 1978 que o movimento liderado por Deng Xioping (1904-1997) colocou em prática o programa conhecido como as quatro modernizações que fariam da China o país de destaque que é atualmente em termos de crescimento econômico.
O Produto Interno Bruto (PIB) da China, em 1980, era de apenas 247 bilhões de dólares (em poder de paridade de compra), segundo dados do FMI. Neste ano, o PIB dos Estados Unidos era de 2,788 trilhões de dólares e do Brasil era de 446 bilhões de dólares. Ou seja, a economia americana era 11,3 vezes maior do que a economia chinesa e mesmo o Brasil tinha um PIB 1,8 vezes maior do que o da China. Em 2013 a situação era bem diferente, pois os EUA tinham um PIB de 16,2 trilhões de dólares, a China de 13,6 trilhões e o Brasil de 2,5 trilhões de dólares. Em 2013, a economia americana era apenas 1,2 vezes maior do que a chinesa que, por sua vez, já era 5,5 vezes maior do que a Brasileira. As tendências atuais apontam que a China vai ultrapassar os EUA até 2017, quando será 6 vezes maior do que o Brasil. Até 2021 (quando se faz 100 anos do partido comunista), a China deve colocar uma nave tripulada na Lua, ampliando um grande programa de conquistas espaciais.
Sem dúvidas o salto da China em pouco mais de 3 décadas é impressionante. Segundo dados do Banco Mundial a China tinha 85% da população em situação de extrema pobreza em 1980 e caiu para 12% em 2010. A china tinha uma população de 1,360 bilhão de habitantes em 2010, sendo 163 milhões de pessoas consideradas muito pobres. Se a pobreza tivesse o mesmo nível de 1980 (85%) então a China teria 1,156 bilhão de pobres extremos. Então pode-se considerar que a China retirou o equivalente a 992 milhões de pessoas da extrema pobreza (US$ 1,25 ao dia) no espaço de 30 anos. A esperança de vida ao nascer era de 44 anos em 1950 e passou para 74 anos em 2010. Os ganhos econômicos e sociais foram realmente espetaculares.
Porém, o recém-concluído (novembro de 2013) Terceiro Plenário do Comitê Central do Partido Comunista – sessão de estratégia que acompanha uma vez por década a transição de liderança da China – teve que considerar que todo o sucesso econômico do país se deu às custas do agravamento da situação do meio ambiente e da depleção dos recursos naturais. O progresso humano chinês ocorreu em detrimento do regresso ambiental.
Embora a China tenha gasto mais dinheiro do que qualquer outra nação para evitar a erosão dos solos e garantir o abastecimento de água, apenas cerca de 11% das florestas da China têm funcionamento ecológico saudável. A Academia Chinesa de Ciências relatou que 43% das águas superficiais estão muito poluídas e impróprias para o uso, assim como 57% das águas subterrâneas – a principal fonte de água potável para centenas de milhões de pessoas que vivem nas cidades. A poluição do solo é tão extensa que o governo considera os dados sobre o assunto um segredo de Estado.
A autossuficiência alimentar, uma tradição cultural na China, já não garante o abastecimento e o país teve que importar volumes recordes de grãos em 2013. A demanda total de energia na China continua a disparar e o país se tornou o principal importador de petróleo, superando os EUA. O carvão mineral, fonte de grande parte da poluição do ar do país – continua em situação crítica e deve ter o seu uso aumentado em 70% ao longo das próximas duas décadas. Todas estas questões estão ligadas à transformação urbana-industrial em curso na China. Até 2030, estima-se que entre 300 e 400 milhões de pessoas vão se deslocar de áreas rurais para as cidades. A China já se tornou a maior emissora de gases de efeito estufa e deve continuar atingindo números recordes a cada ano.
Embora os dirigentes da China não tratem as questões do aquecimento global com a urgência necessária, os problemas da poluição do ar são encarados pela população como fundamentais, necessitando atitudes imediatas para o que é chamado de “arpocalipse”.
Em Xangai, nos momentos mais críticos, as autoridades têm alertado as crianças e os idosos para ficar dentro de casa, pois a exposição à poluição teria consequências perigosas para a saúde. Centenas de voos e eventos esportivos foram cancelados, enquanto máscaras e purificadores de ar se esgotam nas lojas. Em diversas ocasiões, o nível de poluição, de acordo com o Índice de Qualidade do Ar, pairava no “muito” e “severamente” poluídos, ficando em até 31 vezes os níveis recomendados.
Reportagem do jornal The Guardian, de 16 de janeiro de 2014, mostra que Beijing chegou a registrar, no início do ano, uma poluição do ar 26 vezes o nível considerado seguro pela Organização Mundial de Saúde. A poluição do ar tem assolado a maioria das grandes cidades chinesas, onde a proteção ambiental tem sido sacrificada em prol do desenvolvimento econômico. A queima de carvão e as emissões dos automóveis têm sido as principais fontes de poluição, reduzindo a visibilidade a várias centenas de metros e causando diversos problemas de saúde na população.
Existem dúvidas se a economia chinesa ainda tem fôlego e recursos para crescer. O PIB chinês, provavelmente, pode se tornar o maior do mundo. Mas resta saber se a população vai ter oxigênio para respirar, água saudável para beber e as mínimas condições de qualidade de ar para respirar, evitando o permanente estado de ‘arpocalipse’. (ecodebate)

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