Crescimento econômico e poluição (‘arpocalipse’) na China
A China apresentou nas últimas 3 décadas o maior crescimento
econômico de toda a história da humanidade. Nunca um país cresceu tanto em tão
pouco tempo. Também nunca um país teve um impacto negativo tão grande no meio
ambiente.
Na verdade, a China sempre foi um país muito avançado
culturalmente e esteve na liderança da economia mundial durante séculos antes
do início da Revolução Industrial e Energética ocorrida na Europa no final do
século XVIII. A decadência chinesa coincidiu com o fim da dinastia Qing
(1644-1912), que teve início quando os manchus invadiram a China em 1644 e
derrotaram a dinastia Ming (1368-1644). Enquanto o Ocidente avançava, os
imperadores Jiaqing (1796-1820) e Daoguang (1820-1850) não deram sequência ao
estilo administrativo de seus antecessores e Estado chinês, conservador e
rígido, não conseguiu evitar as ameaças externas, como na Primeira Guerra do
Ópio (1839-1842) que, entre outras atrocidades, fez a China ceder a cidade de
Hong Kong para a Inglaterra. Também a Guerra Sino-Japonesa (1894-1895) tornou a
ilha de Taiwan uma colônia do Japão. O 12º imperador da dinastia Qing – Puyi
(1908 -1912) foi forçado a abdicar, quando da criação da República da China em
1912, liderada por Sun Yat-Sen. Depois dos sofrimentos da Segunda Guerra
Mundial, Mao Tse-tung liderou a formação da República Popular da China, em
1949.
Os 30 primeiros anos da República Comunista não foram fáceis
e houve vários fracassos que aumentaram a pobreza do país, tais como:
1) o Grande Salto Adiante (1958-1960), cujos efeitos
acarretaram a morte de milhões de pessoas devido à fome.
2) a Revolução Cultural que desorganizou o funcionamento do
Estado e dos serviços públicos jogando o país em um caos econômico. Foi somente
em 1978 que o movimento liderado por Deng Xioping (1904-1997) colocou em
prática o programa conhecido como as quatro modernizações que fariam da China o
país de destaque que é atualmente em termos de crescimento econômico.
O Produto Interno Bruto (PIB) da China, em 1980, era de
apenas 247 bilhões de dólares (em poder de paridade de compra), segundo dados
do FMI. Neste ano, o PIB dos Estados Unidos era de 2,788 trilhões de dólares e
do Brasil era de 446 bilhões de dólares. Ou seja, a economia americana era 11,3
vezes maior do que a economia chinesa e mesmo o Brasil tinha um PIB 1,8 vezes
maior do que o da China. Em 2013 a situação era bem diferente, pois os EUA
tinham um PIB de 16,2 trilhões de dólares, a China de 13,6 trilhões e o Brasil
de 2,5 trilhões de dólares. Em 2013, a economia americana era apenas 1,2 vezes
maior do que a chinesa que, por sua vez, já era 5,5 vezes maior do que a
Brasileira. As tendências atuais apontam que a China vai ultrapassar os EUA até
2017, quando será 6 vezes maior do que o Brasil. Até 2021 (quando se faz 100
anos do partido comunista), a China deve colocar uma nave tripulada na Lua,
ampliando um grande programa de conquistas espaciais.
Sem dúvidas o salto da China em pouco mais de 3 décadas é
impressionante. Segundo dados do Banco Mundial a China tinha 85% da população
em situação de extrema pobreza em 1980 e caiu para 12% em 2010. A china tinha
uma população de 1,360 bilhão de habitantes em 2010, sendo 163 milhões de
pessoas consideradas muito pobres. Se a pobreza tivesse o mesmo nível de 1980
(85%) então a China teria 1,156 bilhão de pobres extremos. Então pode-se
considerar que a China retirou o equivalente a 992 milhões de pessoas da
extrema pobreza (US$ 1,25 ao dia) no espaço de 30 anos. A esperança de vida ao
nascer era de 44 anos em 1950 e passou para 74 anos em 2010. Os ganhos
econômicos e sociais foram realmente espetaculares.
Porém, o recém-concluído (novembro de 2013) Terceiro
Plenário do Comitê Central do Partido Comunista – sessão de estratégia que
acompanha uma vez por década a transição de liderança da China – teve que
considerar que todo o sucesso econômico do país se deu às custas do agravamento
da situação do meio ambiente e da depleção dos recursos naturais. O progresso
humano chinês ocorreu em detrimento do regresso ambiental.
Embora a China tenha gasto mais dinheiro do que qualquer
outra nação para evitar a erosão dos solos e garantir o abastecimento de água,
apenas cerca de 11% das florestas da China têm funcionamento ecológico
saudável. A Academia Chinesa de Ciências relatou que 43% das águas superficiais
estão muito poluídas e impróprias para o uso, assim como 57% das águas
subterrâneas – a principal fonte de água potável para centenas de milhões de
pessoas que vivem nas cidades. A poluição do solo é tão extensa que o governo
considera os dados sobre o assunto um segredo de Estado.
A autossuficiência alimentar, uma tradição cultural na
China, já não garante o abastecimento e o país teve que importar volumes
recordes de grãos em 2013. A demanda total de energia na China continua a
disparar e o país se tornou o principal importador de petróleo, superando os
EUA. O carvão mineral, fonte de grande parte da poluição do ar do país –
continua em situação crítica e deve ter o seu uso aumentado em 70% ao longo das
próximas duas décadas. Todas estas questões estão ligadas à transformação
urbana-industrial em curso na China. Até 2030, estima-se que entre 300 e 400
milhões de pessoas vão se deslocar de áreas rurais para as cidades. A China já
se tornou a maior emissora de gases de efeito estufa e deve continuar atingindo
números recordes a cada ano.
Embora os dirigentes da China não tratem as questões do
aquecimento global com a urgência necessária, os problemas da poluição do ar
são encarados pela população como fundamentais, necessitando atitudes imediatas
para o que é chamado de “arpocalipse”.
Em Xangai, nos momentos mais críticos, as autoridades têm
alertado as crianças e os idosos para ficar dentro de casa, pois a exposição à
poluição teria consequências perigosas para a saúde. Centenas de voos e eventos
esportivos foram cancelados, enquanto máscaras e purificadores de ar se esgotam
nas lojas. Em diversas ocasiões, o nível de poluição, de acordo com o Índice de
Qualidade do Ar, pairava no “muito” e “severamente” poluídos, ficando em até 31
vezes os níveis recomendados.
Reportagem do jornal The Guardian, de 16 de janeiro de 2014,
mostra que Beijing chegou a registrar, no início do ano, uma poluição do ar 26
vezes o nível considerado seguro pela Organização Mundial de Saúde. A poluição
do ar tem assolado a maioria das grandes cidades chinesas, onde a proteção
ambiental tem sido sacrificada em prol do desenvolvimento econômico. A queima
de carvão e as emissões dos automóveis têm sido as principais fontes de
poluição, reduzindo a visibilidade a várias centenas de metros e causando
diversos problemas de saúde na população.
Existem dúvidas se a economia chinesa ainda tem fôlego e
recursos para crescer. O PIB chinês, provavelmente, pode se tornar o maior do
mundo. Mas resta saber se a população vai ter oxigênio para respirar, água
saudável para beber e as mínimas condições de qualidade de ar para respirar,
evitando o permanente estado de ‘arpocalipse’. (ecodebate)
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