A falta de chuva diminuiu o volume de água do
Sistema Cantareira, que abastece São Paulo.
A origem da crise
energética provocada pela estiagem no Sul e no Sudeste no início do ano pode
estar do outro lado do mundo. Segundo meteorologistas ouvidos pela Agência
Brasil, o país está sendo afetado por um ciclo natural de resfriamento do
Oceano Pacífico, que se reflete em alterações climáticas em grande parte do
planeta. Para o Brasil, o fenômeno indica a possibilidade de as chuvas no
centro-sul do país só voltaram ao normal no verão de 2016.
Chamado de oscilação
interdecadal do Pacífico ou oscilação decadal do Pacífico (PDO, na sigla em
inglês), o processo caracteriza-se pela sucessão entre fases quentes e frias na
área tropical do Oceano Pacífico. Os ciclos duram de 20 a 30 anos e são mais
amplos que os fenômenos El Niño e La Niña, que se alternam de dois a sete anos.
Em 1999, o oceano entrou numa fase fria, que deve durar até 2025 e se reflete
em El Niños brandos e La Niñas mais intensos.
Atualmente, o
Pacífico está no auge do ciclo de resfriamento, o que, segundo os
especialistas, historicamente provoca quatro anos seguidos de verões com chuvas
abaixo do normal na região Centro-Sul do Brasil. “Desde 2012, tem chovido
abaixo da média no Sul, no Sudeste e em parte do Centro-Oeste durante o verão.
A princípio, o que está sendo desenhado é as chuvas só voltarem à média em
2016”, diz o meteorologista Alexandre Nascimento, especialista em análises
climáticas da Climatempo.
A partir do segundo
semestre, os modelos climáticos apontam a chegada de um novo El Niño, com
chuvas no Sul e seca no Nordeste. No entanto, por causa do resfriamento do
Oceano Pacífico, o El Niño deverá ser mais fraco que o normal e insuficiente
para recompor os reservatórios. “O próximo verão deverá ter mais chuva que o
anterior, mas as chuvas tendem a continuar irregulares no Sul e no Sudeste”,
adverte Nascimento.
O El Niño é o
aquecimento do Oceano Pacífico na região equatorial. Pesquisadora do Instituto
Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Mary Kayano estudou a relação entre
esse fenômeno e a oscilação decadal do Pacífico e constatou um padrão. “Em
fases frias da PDO, os El Niños são mais brandos. Tanto que o último El Niño
forte ocorreu em 1997, quando o Oceano Pacífico estava numa fase quente”, diz.
Ela, no entanto, evita fazer prognósticos sobre o próximo verão. Segundo a
pesquisadora, o Inpe emite previsões somente para os próximos três meses.
O comportamento
histórico, no entanto, indica que o resfriamento do Pacífico está afetando o
Brasil. Segundo o diretor-geral da MetSul Meteorologia, Eugenio Hackbart, o
Brasil enfrentou uma sequência de verões com estiagem entre o fim dos anos 1950
e o início da década de 1960, quando o Pacífico atravessava um pico de
temperaturas baixas. “Os padrões de circulação atmosférica hoje estão
semelhantes aos daquela época”, compara.
Além das chuvas
irregulares durante o verão, o resfriamento do Oceano Pacífico traz efeitos
distintos conforme as regiões do país, com invernos mais rigorosos no Sul e no
Sudeste. “Ano passado, chegou a nevar perto de Florianópolis”, lembra Hackbart.
O fenômeno provoca ainda cheias acima da média no Amazonas e no Pará. No
entanto, esclarece o diretor da MetSul, não está relacionado à cheia do Rio
Madeira, decorrente de chuvas atípicas na Bolívia.
Apesar das chuvas
acima da média na maior parte do país em março, Nascimento, da Climatempo,
considera que os reservatórios não devem voltar a subir com rapidez por causa
do tipo de chuva que tem atingido a região e da chegada da estação seca ao
Centro-Sul nos próximos meses. “A verdade é que os reservatórios só enchem com
chuvas generalizadas, que duram vários dias e são constantes. Até agora, temos
registrado pancadas, que podem ser fortes, mas são eventos isolados”, explica.
Mesmo com a
possibilidade de mais um verão com chuvas abaixo da média, os meteorologistas
recomendam cuidado com os prognósticos. “A maioria dos estudos sobre os ciclos
no Oceano Pacífico é recente. A gente precisa de séries históricas mais longas
para compreender a extensão do fenômeno”, diz a pesquisadora do Inpe. Hackbart
levanta dúvidas sobre a intensidade do próximo El Niño. “Alguns modelos e
especialistas dizem que o próximo El Niño tem chances de ser forte. Nesse caso,
as chuvas podem ser mais intensas e ajudar os reservatórios”, pondera. (ecodebate)
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