O Dia Mundial da Água é pauta de toda a grande mídia, com
grande destaque para o crescente estresse hídrico e a severa ameaça de escassez
em escala global. Em todo o planeta, aqui inclusive, incontáveis discursos,
solenidades, eventos e ‘festividades’ comemoraram o Dia Mundial da Água e
‘destacaram’ a sua importância cotidiana na vida de todos.
Mas, no geral, foi mais um grande tema de fundamental
importância que caiu no vazio da alienação e do consumismo. Mais uma vez, como
em outros temas absolutamente fundamentais, como as mudanças climáticas e a
crise alimentar, prevalece a atitude do tipo ‘Tô nem aí’. Mesmo sendo,
aparentemente, inútil reavaliar a grave situação atual, ainda assim acho que
precisamos manter o tema em discussão, se pretendemos a construção de um futuro
minimamente suportável.
O Brasil, nos fóruns internacionais, sempre reafirmou sua
posição contrária ao reconhecimento do acesso à água potável como direito
humano. Essa é a posição histórica dos governos brasileiros. Não é estranho que
isso aconteça em um país no qual a água sempre foi um instrumento de poder,
controlado pelas oligarquias (políticas e econômicas) e pela sempre pujante
indústria da seca.
É essa visão econômica que orienta o conceito da não
cobrança da captação da água bruta, que tanto favorece o agronegócio. A
irrigação é responsável por quase 70% do consumo de água, com um desperdício de
até 50% da água captada. O problema é conhecido há décadas, mas, até agora, não
existe um único programa público de redução de perdas e de adoção de sistemas
eficientes de irrigação. O perdulário pivô central ainda reina absoluto no
país.
Os sistemas de distribuição de água tratada, públicos e
privados, em média, desperdiçam 40% da água distribuída por falhas operacionais
(vazamentos, rompimentos de adutoras, etc.). As campanhas que incentivam o
cidadão/ consumidor a reduzir o consumo pessoal e familiar são necessárias, mas
não são justas. O consumidor urbano não é responsável pelo consumo maior da
água bruta (é a agricultura irrigada), nem pelo maior desperdício de água
tratada (é a operação ineficiente do sistema).
É claro que, na qualidade de consumidores, precisamos mudar
nossa atitude em relação à demanda de água. Precisamos, de fato, ser mais
responsáveis pela água que consumimos. Mas, acima de tudo, é como cidadãos que
precisamos mudar nossa atitude.
Como cidadãos e eleitores, temos o poder de dizer que a água
é um direito humano fundamental, essencial para garantir o direito à vida. Se a
alienação e o consumismo prevalecerem, como agora, nada mudará em nosso futuro.
Ou melhor, mudará para pior, porque a escassez será crescente.
Cedo ou tarde, arcaremos com as consequências do que
decidirmos. Ou do que deixarmos que os outros decidam por nós. (ecodebate)
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