Este estudo retrata a situação
atual em nível de Brasil dos principais recicláveis: embalagens de alumínio e
aço, plásticos, papéis e vidro, sob o enfoque econômico e mercadológico.
Levanta quantitativamente a situação atual e potencial da reciclagem brasileira
comparativamente às melhores práticas entre países selecionados. Discute os
preços dos recicláveis no mercado interno comparativamente ao mercado internacional
dos insumos virgens, mostrando que há margem para significativa melhoria nos
preços internos, principalmente se as indústrias forem pressionadas a assumir
suas responsabilidades, de acordo com o Princípio do Poluidor-Pagador.
1. Objetivos
Este estudo visa conhecer a
situação atual e potencial da reciclagem brasileira, à luz da Lei 12.305/2010 e
das melhores práticas entre países selecionados. Para tanto são analisados os
mercados dos cinco recicláveis mais comumente encontrados nas Unidades de Triagem:
embalagens de alumínio e aço, plásticos, papéis e vidro.
2. Métodos
A pesquisa baseia-se em informações
secundárias obtidas por análise documental, sobre produção e consumo aparente
dos recicláveis, disponibilizadas principalmente pelas entidades de classe
representativas dos segmentos mercadológicos analisados. Utiliza-se de
informações levantadas pelo Instituto de Pesquisas Econômicas (IPEA) e pelo
Plano Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), colocado para discussão pública em
2011, entre outras publicações, para a análise da situação da Coleta Seletiva
no País. Utiliza, também, informações de mercado relativas a preços de
comercialização dos recicláveis no mercado brasileiro e os preços dos insumos
virgens no mercado internacional, tecendo comparações.
3. Resultados
Segundo Grippi (2006, p.35) a
reciclagem “é o resultado de uma série de atividades através das quais
materiais que se tornariam lixo ou estão no lixo, são desviados, sendo
coletados, separados e processados, para serem usados como matéria-prima na
manufatura de outros bens, feitos anteriormente apenas com matéria-prima
virgem”.
Estas práticas resultam em aumento
na vida útil dos aterros; geração de emprego e renda; e redução na poluição
gerada pelos processos produtivos – resíduos, efluentes e emissões. Além destas
vantagens, Calderoni (2003) cita aspectos relacionados aos custos: obtenção das
matérias-primas pelas indústrias; aterramento sanitário; transporte, na medida
em que aumentam as distâncias entre os pontos de coleta e os aterros; e a redução
nos custos de produção: energia, matéria-prima e transporte.
O aproveitamento de reciclados é
uma realidade em todo o mundo. Quase todo tipo de resíduo está sendo
reaproveitado no processo de reciclagem – celulose, vidros, plásticos, metais,
embalagens longa vida, pneus e óleos comestíveis. A cadeia produtiva de
produtos a partir de reciclados pode ser vista em três etapas: (i) coleta e
triagem dos resíduos, de acordo com os diferentes tipos e as diversas fontes;
(ii) beneficiamento através da moagem, prensagem, lavagem e secagem; (iii)
reutilização em diferentes segmentos produtivos (SEBRAE, 2008).
A reciclagem é uma atividade
emergente no Brasil, ocupando uma parte importante das matérias-primas de
vários segmentos industriais. As tecnologias e processos industriais têm sido
aprimorados visando o reaproveitamento e a reciclagem dos insumos, resultando
em redução nos impactos ambientais e climáticos, conjugados com a melhoria no
desempenho das empresas. Sebrae (2008) observou maior evolução da indústria de
reciclados comparativamente ao conjunto das indústrias de transformação,
conforme demonstra o Gráfico 1.
Gráfico 1 – Evolução real das
indústrias de reciclagem e transformação (1996=100)
Fonte: Sebrae (2008)
Pode-se dizer que a reciclagem
ocorre por três vias: pré-consumo, quando os rejeitos dos processos produtivos
são reaproveitados sem terem resultado em produtos; pós-consumo, dividida entre
o resultado das Coletas Seletivas, onde os recicáveis são encaminhados para
entidades de catadores conveniadas com as prefeituras, e a coleta informal,
presente nas ruas das cidades e junto aos locais de disposição final.
As informações relativas à Coleta
Seletiva no Brasil mostram diferenças significativas entre as fontes. IBGE
(2010) levantou 994 municípios praticando-a em 2008, onde em 411 a cobertura
abrangia toda a área urbana. A pesquisa Ciclosoft (CEMPRE, 2012b) apurou a
existência de coleta seletiva em 766 municípios brasileiros em 2012, cerca de
14% do total. Destes, 52% estão na Região Sudeste e 34% na Região Sul, com a
penetração da coleta seletiva nas regiões Nordeste, Centro-Oeste, Norte, de
10%, 2% e 2%, respectivamente. Por sua vez, ABRELPE (2012) levantou 3326
municípios com alguma iniciativa de Coleta Seletiva: Postos de Entrega
Voluntária (PEV) ou convênios com cooperativas de catadores, chegando a 60% dos
municípios brasileiros. O fato é que a Coleta Seletiva é pouco praticada no
País por ser muito dispendiosa: Cempre (2012b) estimou o custo médio da Coleta
Seletiva nas grandes cidades em R$ 424,00, cerca de 4,5 vezes superior ao da
coleta convencional, cujo valor médio foi de R$ 95,00.
Apesar dos significativos custos
para as prefeituras municipais, quando sopesada a contribuição dos programas de
Coleta Seletiva em relação ao que é reciclado no país, observa-se, pelos dados
apresentados na Tabela 1, que a participação dos resíduos recuperados por estes
programas é muito pequena, indicando que as maiores contribuições estão na
reciclagem pré-consumo e na coleta informal pós-consumo (BRASIL, 2011).
Tabela 1 – Estimativa da
participação dos programas de coleta seletiva formal no Brasil em 2008
Quantidade de resíduos reciclados no país (mil t/ano) – Item A
Quantidade recuperada por programas oficiais de coleta seletiva (mil t/ano) – Item
B
Participação da coleta seletiva formal na reciclagem total – Item C
Recicláveis – Item A - Item B - Item C
Metais – 9.917,8 – 72,3 – 0,7%
Plástico – 962 (1) – 170,3 – 17,7%
Papel/papelão – 3.827,9 – 285,7 – 7,5%
Vidro – 489 – 50,9 – 10,4%
Tabela 1 – Estimativa da participação dos
programas de coleta seletiva formal no Brasil em 2008
Fonte: BRASIL, 2011
Nota: (1) Dado de 2007
A Política Nacional de Resíduos
Sólidos – Lei 12.305/2010 – busca estimular a reciclagem através de diversas
disposições inseridas no corpo da Lei, como o incentivo à industria da
reciclagem (Artigo 7º); a determinação para que o PNRS estabeleça metas para a
reciclagem (Artigo 15º); e a priorização de acesso aos recursos da União para
os municípios que implantarem a Coleta Seletiva com a participação de
cooperativas de catadores (BRASIL, 2010b). O Decreto 7404/2010, que
regulamentou a referida Lei, dedica o Capítulo II à Coleta Seletiva,
classificando-a como instrumento essencial para o atingimento da meta de
disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos (Artigo 54º da Lei
12.305) (BRASIL, 2010a).
O estímulo econômico para o
desenvolvimento da reciclagem provém da aquisição pela indústria. Somente são
recuperados nas plantas de segregação, e na catação de rua, os materiais com
condições de mercado para a comercialização. Os demais, mesmo teoricamente
passíveis de reaproveitamento, são descartados pelos catadores. Na maioria das
vezes são segregados nas Unidades de Triagem: papéis e papelões; plásticos
compostos por diversos tipos de polímeros; vidros; metais ferrosos (ferro e
aço); e metais não ferrosos (alumínio, cobre, chumbo, níquel e zinco) (GRIPPI,
2006). Os aspectos mercadológicos relativos aos recicláveis abrangidos por este
estudo são abordados a seguir.
3.1 A reciclagem das embalagens de
alumínio
A importância da reciclagem do
alumínio ganha força quando olhamos para o árduo fluxo de transformação do
minério de bauxita em lingotes de alumínio primário, envolvendo diversas etapas
nas fases de mineração, beneficiamento, refinaria – fase do processo que
transforma a bauxita em alumina calcinada – e redução, que consiste na
transformação da alumina em alumínio metálico.
Além da bauxita, o processo de
refinaria utiliza cal, soda cáustica, vapor, óleo combustível, floculante
sintético, energia elétrica e água. Além da alumina, o processo de redução
demanda criolita, fluoreto de alumínio, coque de petróleo, piche, óleo
combustível e energia elétrica. Classificadas em vinte tipos diferentes, as
sucatas, através de processo de fundição e transformação em lingotes, podem ser
reutilizadas infinitas vezes sem que ocorra perda em suas características. No
caso das latas de alumínio a reciclagem é particularmente importante em face do
curto ciclo consumo, reciclagem, novo consumo, da ordem de 42 dias (ABAL,
2012).
Segundo IPEA (2010), a produção de
uma tonelada de alumínio a partir de reciclados, resulta em uma economia de
energia elétrica de 14,93 MWh. Com relação às matérias-primas, implica na
redução de 18,69 m3 de água, 10 t de bauxita, além de outras como
coque, soda cáustica e piche. Evita também as poluições de correntes do
processo de fabricação: cinzas e inertes, poluição da água e do ar.
O Brasil é o sétimo maior produtor
de alumínio primário. O setor apresentou em 2011 o faturamento de US$ 18,4
bilhões, equivalente a 0,7% do PIB brasileiro. Naquele ano a produção atingiu
1.440 mil t de alumínio primário, com o consumo doméstico de transformados de
alumínio em 1.452 mil t. Foram exportadas 656 mil t e importadas 412 mil t
(ABAL, 2012). Contribuiu para este desempenho a recuperação de sucatas, que em
2011 foi de 511 mil toneladas, representando 35,2% do consumo doméstico,
superior à média mundial de 28,3% (base 2010). Na reciclagem de latas de
alumínio para bebidas, naquele ano o País reciclou 248,7 mil t, equivalente a
98,3% da produção. Este índice, bastante satisfatório, supera países como o
Japão (92,6% em 2010), Estados Unidos (65,1%) e a média europeia (66,7%) (ABAL,
2012; ABRALATAS, 2013)
Por tratar-se de setor intensivo no
uso de capital, no Brasil os segmentos deste mercado apresentam-se concentrados
em poucas empresas. Esta concentração de compradores se reflete no preço pago
aos sucateiros: enquanto, na segunda semana de agosto de 2012 a indústria de
reciclagem pagava R$ 2.770,00 por tonelada de latas de alumínio catadas (ABAL,
2012), a tonelada do metal na London Metal Exchange era cotada em US$
1,820.00, equivalentes a R$ 3.640,00 na paridade cambial à época (LME, 2012).
Esta significativa diferença sinaliza para a existência de margem negocial por
parte da indústria.
3.2 A reciclagem das embalagens de
aço
No processo de produção do aço,
composto por uma liga de ferro e carbono, a primeira etapa é chamada de
redução, onde o minério de ferro é liquefeito em combinação com carvão mineral
ou vegetal, dando origem ao ferro gusa. A etapa seguinte, de refino, ocorre em
fornos de aciarias, pela transformação do ferro gusa em aço. A terceira fase é
a da laminação em chapas, bobinas, vergalhões, etc. (INSTITUTO AÇO BRASIL,
2012).
Em 2011 o parque produtor de aço no
Brasil estava composto por 29 usinas administradas por 11 grupos empresariais,
com capacidade instalada de 47,8 milhões t/ano e produção de 35,2 milhões t. O
consumo aparente foi de 25,0 milhões de t. Naquele ano o Brasil foi o 12º exportador
mundial e o 5º se consideradas as exportações líquidas. A participação do setor
de embalagens situava-se em 3,6% (em peso) do total (AÇOBRASIL, 2012).
A exemplo do alumínio e vidro, o
aço pode ser reciclado indefinidamente sem sofrer degradação. Para tanto, as
sucatas são levadas diretamente aos fornos das aciarias, com múltiplas
vantagens em relação ao uso do ferro gusa: redução em 85% da poluição do ar,
76% na poluição da água e 40% no consumo de água; eliminação dos impactos das
atividades de mineração do ferro e do carvão; eliminação da queima do carvão
vegetal; etc. (INESFA, 2012; CALDERONI, 2003).
A taxa de reciclagem de aço é
relevante: tomando-se como exemplo o ano de 2008, para a produção das 33,8
milhões de toneladas de aço bruto no País foram utilizadas cerca de 10,2
milhões de toneladas de sucatas, correspondendo a 30,1% do total (ABEAÇO,
2013). Considerando-se especificamente as embalagens de aço esta relação
melhora devido ao menor ciclo de vida da embalagem e a maior facilidade de coleta
e envio para a reciclagem: ainda com base no ano de 2008, das 33,8 milhões de
toneladas, 575 mil foram destinadas à produção de folhas de aço para
embalagens. Sobre esta parcela o índice de reciclagem foi de 47% (ABEAÇO,
2013).
O nível brasileiro na reciclagem de
embalagens de aço possui significativa margem para evolução, pois a taxa média
desta reciclagem na Europa em 2008 foi de 71%, elevando-se para 72% em 2010,
com países como Bélgica, Alemanha e Holanda reciclando 98%, 94% e 88%,
respectivamente APEAL (2013).
Assim como a indústria do alumínio,
o reduzido número de aciarias e siderúrguicas em nível nacional caracterizam
estruturas oligopolistas de mercado. Esta característica se reflete em perda de
barganha por preços pelos sucateiros. A perda fica evidenciada quando se
compara os preços praticados no mercado nacional com a cotação do aço no
mercado internacional: na segunda semana de agosto de 2012 os catadores estavam
recebendo valores entre R$ 140,00 e R$ 370,00 por tonelada de sucata, enquanto
a mesma quantidade do metal estava cotada em US$ 345.00 na LME, equivalentes a
R$ 690,00 pela paridade cambial à época (CEMPRE, 2012c; LME, 2012).
3.3 A reciclagem dos plásticos
A crescente utilização dos
plásticos decorrente da frequente preferência de uso pelos agentes econômicos,
tanto de produção como consumo, em face das suas características, que muitas
vezes concilia aspectos como leveza, resistência, durabilidade, beleza e preço.
A maior produção e consumo faz com que sua participação na gravimetria dos
RSU seja relevante, apesar do seu baixo peso relativo frente a metais, papéis e
vidros. Por outro lado, demandam elevado consumo energético para a produção dos
polímeros; utilizam recursos naturais não renováveis para sua fabricação; e
emitem, tanto para a produção como na decomposição, substâncias com
propriedades cancerígenas. A demorada decomposição resulta em danos ao meio
ambiente, com prejuízos à fauna terrestre e aquática. A poluição do mar por
plásticos e os malefícios aos animais marinhos é relevante (NUCCI, 2010).
A produção de polímeros plásticos
tem como matéria-prima essencial as resinas oriundas do petróleo (DECOMTEC,
2009). O consumo aparente de resinas termoplásticas no Brasil em 2011 atingiu
6.502 mil t. Destas, 50,2% foram utilizadas em plásticos de vida curta e 49,8%
em plásticos de vida longa. As importações destas resinas, de 1.771 mil t,
superaram as exportações, de 1.433 mil t. Com base nestes parâmetros, a
produção brasileira de resinas em 2011 pode ser estimada em 6.164 mil t (ABIPLAST,
2011; PLASTIVIDA, 2012).
Além das vantagens relacionadas com
a economia de petróleo, insumo para a produção das resinas, o uso de plástico
reciclado proporciona redução no dispêndio de energia elétrica de 6,74 MWh/t
para 1,44 MWh/t (CALDERONI, 2003). Como a geração de energia implica em aumento
nas emissões de GEE, a reciclagem de plásticos, ao economizá-la, está
contribuindo para a redução do aquecimento global.
Em 2011 a reciclagem era realizada
por 815 indústrias concentradas na região sudeste e sul. Essas indústrias
reciclaram 1.077 mil t em 2011, sendo que 32% foram oriundos de aparas da
indústria e 68% da reciclagem pós-consumo. Daí pode-se calcular que a
quantidade de plásticos pós-consumo processadas pela indústria da reciclagem
foi de 732 mil t. O índice de reciclagem mecânica de plásticos pós-consumo
(IRmP) foi de 21,7% para o ano de 2011. Embora Plastivida (2012) não traga
diretamente a informação, a quantidade de plásticos pós-consumo geradas pode
ser calculada como de 3.373 mil t. Naquele ano, no contexto mundial, países
como Suécia, Alemanha e Noruega apresentam IRmP de 35,0%, 33% e 33%
respectivamente, mostrando que há espaço para o crescimento da reciclagem
mecânica de plásticos pós-consumo no Brasil (CEMPRE, 2012a; PLASTIVIDA, 2012).
Em agosto de 2012, Cempre (2012c)
informava as cotações relativas aos reciclados politereftalato de etileno
(PET), plástico rígido – polietileno de alta densidade (PEAD) e plástico filme
– polietileno de baixa densidade (PEBD) e polipropileno (PP) – em diversos
municípios brasileiros. Em Porto Alegre a tonelada era comercializada aos
preços de R$ 1.620, R$ 650 e R$ 300, respectivamente. Tomando-se o caso do
plástico filme como exemplo, no mercado internacional, Platts (2012) informava
como cotação de fechamento de julho/2012 os preços de US$ 1.289/t de PEBD e US$
1.136/t de PP (polímeros virgens), equivalentes a cerca de R$ 2.578 e R$ 2.272,
respectivamente, pela paridade cambial à época. Embora seja natural o preço
inferior para os reciclaveis, dada a perda de qualidade do material no processo
de reciclagem, a grande diferença de preços permite supor que existe margem
para a melhoria dos preços pagos aos catadores.
3.4 A reciclagem do papel
Na produção do papel pode ser
utilizada celulose de fibra longa ou de fibra curta. A fibra longa é extraída
principalmente do pinus e utilizada na fabricação de papéis que demandam
resistência, como embalagens e papel-jornal. A fibra curta é retirada
principalmente do eucalipto e utilizada para a produção de papéis de impressão
e de fins sanitários. Além das fibras, o setor produz pastas de alto rendimento
(PAR). Os papéis são classificados pela sua finalidade: escrita e impressão;
embalagens (inclui diversos papéis, como o ondulado e o seda papel);
papel-cartão; sanitários e os ditos especiais (autoadesivos, decorativos,
crepados, etc.).
O processo de reciclagem do papel é
semelhante ao da celulose virgem: mistura com água e trituração (hidrapulper),
formando uma pasta de celulose. No caso do reciclável há necessidade de outras
operações, como peneiramento, limpeza química, refinamento e branqueamento,
previamente à produção do papel. Segundo Calderoni (2003), o uso de reciclados
resulta em ganhos energéticos – de 4,98 MWh/t para 1,47 MWh/t – e de consumo de
água: redução de 29.202 l/t.
Segundo Bracelpa (2012), o Brasil
possui uma área de floresta plantada de 7 milhões de hectares, onde 2,2 milhões
ha são florestas de eucalipto e pinus destinadas à produção de celulose e
papel. O Brasil é o quarto maior produtor mundial de celulose e o décimo maior
produtor de papel. São 220 empresas em atividade no país com atividade em 540
municípios localizados em 18 estados. A Tabela 2 mostra os dados de produção de
celulose e papel relativos ao ano de 2011.
Tabela 2 – Desempenho do setor de
celulose e papel em 2011, em mil t.
Itens – Produção – Importações –
Exportações – Consumo aparente – Recuperação de aparas – Taxa (%) de
recuperação
Celulose – 13.922 – 392 – 8.478 –
5.856 - _ - _
Papel – 10.159 – 1.455 – 2.052 –
9.562 – 4.351 – 45,5
Fonte: Bracelpa, 2012
O índice de reciclagem brasileiro
em 2011 foi de 45,5%, bastante inferior aos índices apresentados em 2010 por
países como Coreia do Sul (91,6%), Alemanha (84,8%) e Japão (79,3%), e de
países em desenvolvimento, como Indonésia (53,4%) e México (48,8%),
demonstrando que há espaço para a evolução dessa reciclagem no país (BRACELPA,
2012).
Embora o número de indústrias seja
significativo, o setor apresenta concentração, com poucas empresas respondendo
pela maior parte do mercado. Atuam em regime de oligopólio em relação aos
consumidores e de oligopsônio em relação aos elos da cadeia de reciclagem
(CALDERONI, 2003). O acompanhamento dos preços no mercado interno de
recicláveis e a cotação internacional das fibras permite observar grande diferença
entre os preços, a exemplo das cotações de 21 de agosto de 2012. Naquele dia a
BHKP (fibra curta) estava cotada na Europa a US$ 765/t e a NBSK (fibra longa),
a US$ 780/t (FOEX, 2012). Convertidos em reais, equivaliam a R$ 1530 e 1560.
Por outro lado, no mercado de Porto Alegre os recicladores eram remunerados em
R$ 450/t de papel branco (fibra curta) e R$ 290/t do papelão (fibra longa)
(CEMPRE, 2012c). Embora esta comparação direta não seja tecnicamente adequada,
serve como parâmetro de preços relativos, sinalizando que existe margem para
melhoria nos preços pagos aos recicladores.
3.5 A reciclagem do vidro
A fabricação de vidro decorre de
operações sobre a massa fundida de vidro – obtida através da fusão da sílica
combinada com outros materiais fundentes, estabilizantes, afinantes e corantes
– para conformá-la no artigo desejado: chapas, garrafas, pratos, fibras, etc.
(AKERMAN, 2000).
O setor vidreiro do Brasil,
composto pelos segmentos de embalagem, utensílios domésticos, vidros técnicos e
vidros planos, atingiu em 2008 a capacidade instalada de 3.002 mil t. Com
relação ao segmento de embalagens, que concentra amplamente a reciclagem
pós-consumo, a capacidade instalada era de 1.292 mil t e o consumo aparente:
1.041 mil t (ABRELPE, 2012; BRASIL, 2011).
O vidro pode ser reciclado
infinitas vezes sem perda de propriedades e mantida integralmente a
equivalência de peso entre os cacos e os novos produtos. Porém à necessidade da
retirada de impurezas que possam contaminar o vidro a ser produzido, como rótulos
e tampas de embalagens. Os cacos de vidros planos não podem ser misturados aos
de embalagens (ABIVIDRO, 2012).
O uso de cacos como matéria-prima
requer menos energia para a fusão do que uma nova composição, pois necessita
apenas do aquecimento, sem as reações químicas que ocorrem na transformação da
composição em vidro. Tem papel estratégico, pois pode ser enfornado em
substituição às matérias-primas no caso de falta delas ou pane no sistema de
produção da composição (AKERMAN, 2000).
A produção de uma tonelada de vidro
demanda areia (720 kg), barrilha (198 kg), calcário (115 kg), dolomita (36 kg)
e feldspato (20 kg). Destes, a barrilha tem um custo maior: a proporção citada
corresponde a um dispêndio da ordem de R$ 136 para a indústria (IPEA, 2010). Em
agosto de 2012 Cempre (2012c) informava preços pagos aos recicladores pela
tonelada de vidro incolor entre R$ 40 a tonelada em Aracaju (SE) e R$ 265 em
Itabira (MG). São valores que não cobrem sequer o custo da Coleta Seletiva. A
baixa remuneração dos recicladores pode estar relacionada com os mecanismos de
mercado, pois, enquanto prevalece uma situação de oligopólio na produção de
vidros para embalagens e de oligopsônio na compra dos cacos, os sucateiros são
numerosos e pouco organizados (CALDERONI, 2003). Se a indústria de vidros gasta
R$ 136 para a aquisição de Feldspato, para citar apenas um dos componentes para
a produção de 1 tonelada de vidro, porque remunerar em apenas R$ 40 o
catador?
Apesar do evidente desestímulo
resultante dos baixos preços, em 2007 a parcela reciclada dos vidros de
embalagens atingiu 47%. Estima-se que outra parcela, de 33%, ficou retida nas
residências para algum tipo de reuso, com os 20% restantes sendo descartados
junto com o lixo domiciliar (ABRELPE, 2012). Na UE o índice desta reciclagem
tem se mantido estável em 68% (FEVE, 2012).
4. Conclusões
A Tabela 3 sumariza diversas das
informações citadas ao longo do texto. A reciclagem potencial informa os
volumes que poderiam ser reciclados caso o Brasil atingisse os melhores
desempenhos informados na literatura. O potencial de incremento resulta da
diferença entre a quantidade atualmente reciclada (C) e a reciclagem potencial
(B). No caso das embalagens de alumínio, como o Brasil lidera o ranking de
reciclagem, o potencial de incremento foi considerado zero.
Tabela 3 – Resumo da recuperação
atual e potencial de reciclados no Brasil, em mil t
Reciclável/ano – Consumo aparente (A) – Reciclagem potencial (B) –
Reciclagem atual (C) – Potencial incremento (B-C)
Lata alumínio (2010) – 253 – 249 (Brasil-98,3%) 249 – 0
Lata de aço (2008) – 575 – 563 (Bélgica-98%) 270 – 293
Plásticos (2011) – 3.373 – 1.181 (Suécia-35%) – 732 – 449
Papel/papelão – 9.562 – 8.759 (Coreia-91,6%) – 4.351 – 4.408
Vidros (2008) – 1.041 – 708 (EU-68%) – 489 – 219
Totais – 14.804 – 11.460 – 6.091 – 5.369
Fonte: Abralatas (2013), Abeaço
(2013), Bracelpa (2012), Plastivida (2012), Abrelpe (2012), Brasil (2011).
Os resultados expostos na Tabela 3
servem como estimativas da situação atual brasileira do aproveitamento de
recicláveis e o potencial de incremento até os níveis dos melhores desempenhos
em nível mundial. Os resultados devem ser tomados com cautela, pois se trata de
dados secundários, coletados em diversas fontes, que os apresentam sem explicar
as metodologias adotadas na coleta das informações.
Vistos de forma conjunta, os cinco
principais recicláveis presentes no lixo do brasileiro resultam em um consumo
aparente anual de cerca de 14,8 milhões de toneladas, onde, as melhores
práticas permitiriam o reaproveitamento de 11,5 milhões (77%). No entanto,
apenas 6,1 milhões estão sendo reciclados (41%). Portanto existe um potencial
mínimo de 36%, ou cerca de 1/3 do consumo, para evolução.
Com relação aos custos da Coleta
Seletiva, observa-se que, em última análise, são arcados pela sociedade num
todo. Como a remuneração auferida pelos catadores na comercialização,
apresentados caso a caso nos tópicos anteriores, é significativamente inferior
aos preços internacionais dos insumos virgens, fica evidenciado que a sociedade
está, indiretamente, subsidiando a indústria. Enquanto a indústria, pelo
Princípio do Poluidor-Pagador, deveria arcar financeiramente sobre sua parcela
de responsabilidade na geração dos resíduos relativos aos produtos que
comercializa, ao contrário, beneficia-se com a barganha que possui sobre a
atividade recicladora, pagando preços insuficientes para a sobrevivência dos
catadores, que, por sua vez, pressionam os municípios por melhores condições de
renda, quando esta pressão deveria recair sobre o segmento industrial. A
situação atual poderá ser melhor equalizada na medida da evolução
organizacional da atividade recicladora e da percepção do alcance do Princípio
do Poluidor-Pagador pelos governos e pela sociedade brasileira. (ecodebate)
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