Para advogado, incentivos em curto prazo prejudicam o planeta e
consumidor deve pressionar empresas para mudar atitudes.
Usina de carvão na Alemanha lança CO2 na atmosfera.
O enfrentamento
das mudanças climáticas é uma luta que a humanidade está travando contra si
mesma na busca de um modelo de desenvolvimento sustentável. E, por enquanto,
não está se saindo muito bem nisso. "Estamos contra as cordas e
atordoados", diz o advogado de Direito Internacional Eduardo Felipe
Matias, autor do livro A Humanidade Contra as Cordas (Paz e Terra), lançado dia
08/04/14 em São Paulo. A boa notícia é que não vai ser fácil, mas ainda dá
tempo de virar o jogo, diz ele.
O título do livro faz uma analogia com uma
luta de boxe. Em que estágio estamos dessa luta, e como estamos nos saindo?
A analogia é
exatamente essa; estamos contra a cordas e atordoados, especialmente porque
fomos nós mesmos que nos colocamos nessa situação complicada. Se você parar
para pensar quem é o vilão nessa história, ele é todo o nosso modelo econômico
de sociedade. Estamos diretamente inseridos nisso, e não há como fugir (dessa
responsabilidade). Há uma inércia muito grande que precisa ser combatida. A
tendência é que essa inércia prevaleça e a gente continue a fazer as coisas do
mesmo jeito, até porque isso favorece os grupos já dominantes nessas
circunstâncias.
Qual é a responsabilidade dos indivíduos
nessa luta?
Cada indivíduo é
importante como uma parte desse sistema no qual estamos inseridos, seja como
eleitores, como consumidores ou simplesmente como cidadãos. Então, nossa
participação é fundamental. Nesse ponto eu faço um paralelo entre duas crises:
a financeira e a ambiental. Uma conclusão que permeia todo o livro é que o
principal problema que vivemos é o dos incentivos equivocados; incentivos de
curto prazo, voltados para o lucro imediato. O consumidor tem o papel de
pressionar as empresas e também de persuadi-las, porque a partir do momento que
ele ganha consciência e começa a privilegiar empresas sustentáveis, ele manda
uma mensagem para as outras empresas que aquilo é importante.
E as empresas?
As empresas têm um
funil pela frente. Seja pela escassez de recursos seja pela pressão do consumo
consciente, as empresas que saírem na frente e passarem primeiro por esse funil
da sustentabilidade sairão na frente, com vantagens, enquanto que as passarem
por último correrão risco até de perecer.
O senhor vê isso acontecendo já? Essa mudança
de atitude em favor da sustentabilidade?
Sim, acho que está
acontecendo, mas de forma ainda muito insipiente, se pensarmos no tamanho do
problema - que o novo relatório do IPCC (Painel Intergovernamental sobre
Mudanças Climáticas) mostra ser grande. Deveríamos estar muito mais adiantados.
A imagem que eu uso no livro é de um círculo virtuoso da sustentabilidade; o
objetivo é mostrar quais são os atores e quais são os instrumentos que esses
atores têm para tentar reverter essa situação. Não vai haver uma bala de prata
e não é um grande ator ou um grande acordo internacional que vai resolver o
problema; a gente tem de acionar todos esses atores ao mesmo tempo, agora.
Como o Brasil se encaixa nesse círculo
virtuoso? O País está fazendo um bom papel?
Acho que o Brasil
está perdendo a oportunidade de se tornar um Estado líder nessa área. Do mesmo
jeito que as primeiras empresas que passarem pelo funil da sustentabilidade vão
se beneficiar, os Estados também vão. Os países que criam incentivos na direção
correta, investem em pesquisa e desenvolvimento, e que entendem essa tendência
de sustentabilidade, vão sair na frente. O Brasil tem tudo para ser um país de
ponta nessa área, por conta de suas atribuições ambientais e até pelo
pioneirismo em certas áreas que, infelizmente, estão sendo deixadas de lado,
como a do etanol. Então, vemos que pode ser uma oportunidade perdida.
A atual crise da água em São Paulo tem
relação com isso?
Com certeza. No
livro, falo dos limites do planeta que não podem ser extrapolados, e o da água
é o mais evidente. Nesta segunda, vi uma estatística que o desperdício de água
potável no Brasil supera 38%. É um absurdo, que mostra com a gente age de
maneira imediatista, como se os recursos fossem infinitos, ignorando
completamente a necessidade de preservação a longo prazo.
E o novo relatório do IPCC confirma tudo
isso?
Sim, confirma com
95% de certeza que nós somos os culpados (pelas mudanças climáticas), e que as
consequências são graves e já começaram a aparecer. Então, está mais claro do
que nunca que quem nos colocou contra as cordas fomos nós mesmos, e que para sair
delas precisamos mudar nossa atitude nessa luta.
Ainda dá para ganhar a luta?
Dá, mas vai exigir
um esforço considerável. “Temos de continuar lutando e ganhar a luta, ou
seremos nocauteados, mas não podemos ignorar o fato de que o prejuízo causado
já foi grande, e por isso há a necessidade de se adaptar a esse mal que já foi
causado pela violência e inimigas da cidade”. (OESP)
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