Obama
lança a principal iniciativa climática dos EUA
Com o anúncio da proposta de
redução das emissões de dióxido de carbono (CO2) pelas usinas
termelétricas, o governo Barack Obama pretende mostrar à comunidade
internacional que os Estados Unidos estão de fato engajados no combate à
mudança climática, tentando fazer da preocupação com o ambiente uma das marcas
de seu segundo mandato.
Anunciado ontem pela Agência de
Proteção Ambiental (EPA, na sigla em inglês), o plano recebeu críticas de
muitos congressistas, inclusive de democratas que concorrerão às eleições
legislativas de novembro e são de Estados em que a geração de energia a carvão
tem um grande peso.
Pela proposta da EPA, as emissões
de CO2 pelas termelétricas existentes devem ser cortadas em 30% até
2030, na comparação com os níveis que vigoravam em 2005. Metas diferentes para
cada Estado serão definidas, já que o perfil de geração de energia de cada um
deles varia bastante. Segundo a EPA, o projeto vai gerar benefícios climáticos
e em termos de saúde pública de US$ 55 bilhões a US$ 93 bilhões por ano em
2030, mais do que superando os custos anuais estimados de US$ 7,3 bilhões a US$
8,8 bilhões.
Na semana passada, a Câmara
Americana do Comércio divulgou um documento estimando que uma redução de 42%
nas emissões até 2030 - mais do que os 30% anunciados ontem - poderia custar
US$ 50 bilhões por ano à economia dos EUA, além de 200 mil empregos anuais. A
EPA, porém, contestou os números da associação.
Obama rebateu críticas
como essas. "O que nós temos visto sempre é que essas afirmações são
desmentidas quando você realmente dá a trabalhadores e empresas os instrumentos
e os incentivos que eles necessitam para inovar", afirmou o presidente.
A proposta anunciada ontem é um
passo importante na estratégia dos EUA de diminuir em 17% o total de emissões
de gases-estufa até 2020, também em relação aos níveis de 2005. Se alcançar
esse objetivo, o governo Obama aposta que será mais fácil retomar negociações
internacionais relacionadas ao aquecimento global. Será um trunfo para
pressionar grandes emissores, como a China, a se esforçarem mais nessa direção.
Um ponto relevante é que, ao
definir 2005 como ano de referência para os cortes, a proposta da EPA é menos
ambiciosa do que parece à primeira vista. Com o crescimento menor da economia
depois da crise de 2008 e o avanço da geração de energia a partir do gás
natural, devido à revolução do xisto, as emissões de CO2 pelas
usinas termelétricas já existentes recuaram algo como 15% desde 2005. Nesse
cenário, o esforço necessário para diminuí-las até 2030 não é tão grande como
sugere o número anunciado pela EPA.
As propostas não agradaram a
muitos políticos republicanos, como o senador Mitch McConnell, do Kentucky, um
Estado em que o carvão responde por 90% da geração de energia. Líder da minoria
no Senado, ele condenou a medida, classificando-a como uma punhalada no coração
da classe média americana.
Até mesmo a democrata Alison
Grimes, que vai desafiar McConnell nas eleições de novembro, atacou a proposta
do governo. Segundo ela, o projeto da EPA é mais uma prova de que Washington
não está trabalhando pelo Kentucky. Disse que o carvão ajuda milhares de seus conterrâneos
a colocar comida em suas mesas. A reação de Grimes, que parece ter chances de
desbancar McConnnell, é um exemplo das dificuldades que Obama terá de enfrentar
para fazer avançar a sua agenda de combate ao aquecimento global.
O senador Roy Blunt, republicano
de Missouri, foi outro a criticar as medidas. Segundo ele, as políticas vão
destruir empregos e afetar as pessoas que não terão como pagar para aquecer as
suas casas, porque a energia vai ficar mais cara.
As regras da EPA não entrarão em
vigor imediatamente. Há um prazo de 120 dias para a consulta pública, em que
todos os interessantes poderão se manifestar a respeito da proposta, com
comentários e sugestões. Uma regulação final será elaborada, passando a valer a
partir de junho do ano que vem. Os Estados, por sua vez, terão até meados de
2016 para desenvolver os seus planos para implementar as novas regras. A medida
não precisa passar pelo Congresso, porque a EPA tem autoridade para regular a
emissão de gases estufa. No entanto, os congressistas podem eventualmente mudar
o poder que hoje cabe à agência.
UE e
ONGs apoiam o plano, mas com ressalvas
A principal autoridade em mudança
do clima da União Europeia, a comissária Connie Hedegaard, disse que o plano da
administração Obama de cortar emissões de carbono das usinas térmicas em 30% é
"a mais forte ação já tomada pelo governo americano para combater a
mudança climática."
Hedegaard lembrou, no entanto,
que a medida não é suficiente para o tamanho do problema e para que se consiga
um acordo climático robusto em 2015, na conferência de Paris. "A decisão,
claro, manda um sinal positivo para que a conferência de Paris finalize um novo
acordo climático global no ano que vem", disse. "Mas para que Paris
consiga um resultado que garanta um aumento menor que 2°C na temperatura
global, todos os países, incluindo os Estados Unidos, deverão fazer mais."
O Greenpeace-EUA comemorou a
decisão com ressalvas. "Este é um bom começo, mas o governo pode e deve
fortalecer suas metas de redução consideravelmente."
"Metas fortes dos EUA,
apoiadas por ações claras como as propostas agora, podem inspirar ações de
outros países. Este esforço conjunto pode criar os resultados necessários para
o encontro das Nações Unidas em Paris, em 2015", disse Lou Leonard,
vice-presidente para mudança do clima do WWF-US.
Negociadores do clima se
encontram esta semana e na próxima em Bonn, na Alemanha, para uma rodada
técnica sobre o novo acordo e a conferência climática deste ano, em Lima, no
Peru. Ambientalistas esperam que a iniciativa de Barack Obama impulsione o
ritmo lento das negociações até agora.
Plano
para reduzir emissão de carbono nos EUA deve alterar cenário energético
Amy Harder e Gautam Naik = The Wall Street
Journal, de Washington
A Agência de Proteção Ambiental dos
Estados Unidos (EPA) divulgou ontem um projeto de lei para regular as emissões
de dióxido de carbono de centenas de usinas de energia em todo o país, a pedra
fundamental da agenda do presidente Barack Obama para combater as mudanças do
clima.
A nova regra propõe que as usinas
de energia reduzam as emissões de dióxido de carbono em 30% até 2030 em relação
aos níveis de 2005, uma meta agressiva que marca a primeira tentativa de
limitar este poluente.
"É como eliminar a poluição
anual de carbono de dois terços de todos os carros e caminhões dos EUA",
disse a diretora da EPA, Gina McCarthy, durante o discurso de anúncio do plano.
O projeto de lei busca encontrar
um equilíbrio entre o que os ambientalistas exigem - uma meta ambiciosa - e o
que as concessionárias de energia querem, incluindo flexibilidade e um prazo
longo de adaptação.
A queima de carvão produz mais
dióxido de carbono que o petróleo e o gás natural, mas é também a fonte de
energia mais abundante e barata, responsável por 40% da eletricidade americana.
A indústria de energia gera cerca de 33% das emissões de carbono dos EUA,
segundo a EPA.
O presidente Obama ressaltou os
benefícios que a nova regra deve trazer à saúde pública e rebateu as críticas
de que ela prejudicaria a economia. "Ela será um grande incentivo para que
Estados e consumidores se tornem mais eficientes" no consumo de energia,
disse ele numa teleconferência com a Associação Americana do Pulmão. "Como
resultado, sua conta de eletricidade vai diminuir, já que esses padrões vão incentivar
investimentos em eficiência energética e no combate ao desperdício."
Obama observou que as emissões de
carbono caíram nos últimos anos, mas disse que mais precisa ser feito.
"Não é suficiente se
olharmos as projeções do caminho que estamos seguindo", disse.
O governo Obama está divulgando o
projeto meses antes das eleições regionais que ocorrem no meio do mandato
presidencial, em que vários candidatos à reeleição do partido governista, o
Democrata, já estão sendo pressionados em seus Estados pelo Partido
Republicano, de oposição, em função dessas iniciativas sobre o clima. Obama
pediu à EPA para elaborar a proposta depois que o Congresso não aprovou outra
lei sobre o clima em 2010.
O deputado democrata Nick Rahall,
de Virgínia Ocidental, Estado que é o segundo maior produtor de carvão do país,
depois de Wyoming, prometeu apoiar uma legislação bipartidária para barrar o
projeto.
"Essas novas regras ameaçam
nossa economia e é um claro desrespeito para com o sustento de nossos mineiros
de carvão e milhares de famílias", diz Rahall, que é candidato à reeleição
este ano.
Apesar das desavenças domésticas,
a iniciativa do governo americano tem um objetivo internacional mais amplo:
incentivar outros grandes países emissores, principalmente a China, a cortar
suas próprias emissões de forma mais agressiva.
Não será uma tarefa fácil. Muitos
países em desenvolvimento ainda estão numa trajetória de longo prazo para
tentar industrializar suas economias e continuam resistindo a grandes cortes
nas emissões de carbono.
A China, o maior emissor de
dióxido de carbono do mundo, está cogitando lançar um programa para o comércio
de carbono em todo o país nos próximos dez anos, mas também continua abrindo
novas usinas a carvão.
"Não importa qual seja sua
visão sobre as mudanças climáticas, estas reduções [dos EUA] serão ofuscadas
pelo aumento de emissões em outras partes do mundo", diz Stephen Eule,
vice-presidente do Instituto para a Energia do Século 21, que faz parte da
Câmara de Comércio dos EUA.
Os cientistas já alertaram que,
se a temperatura global aumentar em mais de dois graus Celcius, poderia
desencadear mudanças climáticas de alto impacto, cujos riscos podem ser
inaceitavelmente elevados. Em uma reunião em Cancún, em 2010, esse cenário
levou cerca de 200 países a concordar com cortes de emissões para garantir que
o limite de dois graus não seja ultrapassado.
Até agora, porém, as ações desses
países não produziram efeitos e as emissões de dióxido de carbono continuam a subir.
Nos EUA, associações comerciais,
incluindo a Câmara de Comércio dos EUA, já estão criticando a EPA pelo custo da
nova regra. A câmara divulgou um relatório na semana passada dizendo que o
plano custaria US$ 50 bilhões por ano à economia. A entidade previu que as
regras poderiam forçar o fechamento de usinas a carvão que produzem 114.000
megawatts nos próximos 16 anos e levar a um aumento nos preços da energia
elétrica para os consumidores de US$ 17 bilhões por ano durante esse período.
Mas grupos que favorecem as
restrições às emissões de dióxido de carbono, como o Conselho de Defesa dos
Recursos Naturais, preveem que o novo plano resultará em preços mais baixos de
energia elétrica através de economias geradas pela eficiência energética.
Produtores de carvão tendem a
serem os que têm mais a perder com a nova regra, mas empresas que utilizam
fontes que não emitem tanto dióxido de carbono – nuclear, gás natural ou
energia renovável, incluindo a eólica e a solar - provavelmente vão se
beneficiar, dizem analistas. (antp)
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