Nova pesquisa
publicada na revista Science descreve como o Brasil diminuiu o ritmo do
desmatamento de suas florestas ao mesmo tempo em que aumentou a produção de
alimento.
Que o Brasil é o país
do futebol todos sabem, mas o que poucos sabem é que o país é liderança mundial
na redução de emissões de gases de efeito estufa. Um novo estudo publicado na
revista Science divulga a primeira análise aprofundada de como o Brasil
alcançou o status de líder global na redução de emissões proveniente da
derrubada de florestas e, ao mesmo tempo, conseguiu aumentar a sua produção
agrícola.
“O Brasil é conhecido
como um dos principais favoritos para vencer a Copa do Mundo, mas também lidera
o mundo na mitigação das mudanças climáticas”, diz o principal autor do estudo,
Daniel Nepstad que dirige o Earth Innovation Institute (EII) e é um dos
principais autores do recente relatório do IPCC.
Desde 2004, o ritmo
da perda de florestas da Amazônia pelo desmatamento tem reduzido em taxas nunca
antes registradas. Se compararmos essa redução com a média histórica nesse
período (1995-2004), chegaremos a conclusão que cerca de 86 mil quilômetros
quadrados de florestas, aproximadamente 14,3 milhões de campos de futebol,
deixaram de ser desmatados até 2013,. Preservar essas florestas equivale a uma
redução de 70% no desmatamento e 3,2 bilhões de toneladas de CO2 mantido fora
da atmosfera – mais de três vezes do que poderia ser feito se nós colocássemos
toda a frota de automóvel americana fora estradas durante um ano. Esse número é
tão representativo que a queda do desmatamento em 2013 representa sozinha uma
redução de 1,5% nas emissões globais em um único ano.
Neste novo estudo, um
grupo de 17 cientistas e economistas dos EUA e da América do Sul pretendem
entender o que levou a essa mudança. Eles descobriram que se trata de uma
combinação de ousadas políticas públicas, restrição do mercado aos fazendeiros
e pecuaristas que desmataram , e a criação de vastos territórios como áreas
protegidas, ainda permitindo o crescimento da produção da soja e da carne
bovina do país.
“Não existe um único
motivo ou explicação para essa queda tão significativa das taxas de
desmatamento da Amazônia nos últimos 9 anos”, afirma Ane Alencar, uma das
diretoras do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia e co-autora do estudo.
“Esse foi o resultado de uma combinação de fatores que incluiu o aumento da
governança nas áreas de fronteira, políticas publicas de comando e controle e
de fomento mais eficientes e integradas, e um mercado mais exigente e eficiente
explicando grande parte desta redução”.
O sucesso do Brasil
aponta para o potencial que as nações tropicais tem para produzir mais
alimentos sem destruir as florestas, mas os autores alertam que essa conquista
pode ter seus dias contados se além de políticas punitivas e de restrição de
mercado, não houverem novos incentivos positivos para os agricultores rurais.
“Estes ganhos são
globalmente significativos, mas frágeis”, explica Nepstad. “Estamos esbarrando
nos limites do que pode ser alcançado através de medidas punitivas. Com o
aumento da demanda global por soja e carne bovina novamente, vamos precisar de
uma nova abordagem para manter o desmatamento nas taxas atuais.”
Entre 1999 e 2004, a
pressão sobre as florestas tropicais da Amazônia aumentou drasticamente, ao
mesmo tempo que o mercado de commodities agrícolas, principalmente o da soja,
sofreu uma drástica expansão. Neste período, a derrubada de florestas da
Amazônia atingiu taxas alarmantes, representando mais que um estado de Sergipe
desmatado a cada ano entre 2002 e 2004. Embora o Código Florestal brasileiro
exigisse dos agricultores manter 80% de suas terras como floresta nativa, essas
regras foram em grande parte descumpridas.
“O Código Florestal
tinha pouca credibilidade antes de 2004, em parte porque suas regras foram
alteradas de forma abrupta”, diz Claudia Stickler, co-autora do estudo.
“O novo código
florestal precisa de estímulos para ser cumprido. Por isso, para reduzir o
desmatamento na Amazônia é importante não somente ter políticas públicas
assertivas e que funcionem para estimular o produtor, mas também é preciso
engajar as indústrias do ramo agropecuárias nesta luta” diz Andrea Azevedo,
diretora de políticas publicas do IPAM. “Precisamos que o mercado comece a
cobrar o cumprimento do código de seus fornecedores e agora isso vai ficar
muito mais fácil com o Cadastro Ambiental Rural, obrigatório para toda
propriedade rural”.
Entre 2005 e 2007, a
rentabilidade da soja despencou, criando uma oportunidade de mudança no padrão
de perda florestal através de politicas publicas inovadoras e de incentivos a
cadeia produtiva de alimentos . Devido à pressão pública, inicialmente liderada
pelo Greenpeace, tornou-se arriscado para as empresas serem associadas ao
desmatamento. Depois de intensas negociações, a maioria dos compradores de soja
da Amazônia se uniram para apoiar um acordo e comprar apenas a soja cultivada
em terras que tinham sido desmatadas antes de 2006 na região, levando os
agricultores a usarem suas fazendas de forma mais produtiva.
Em 2008, o governo
deu um passo além, lançando um esquema criativo em que os agricultores de
municípios inteiros foram retirados dos créditos agrícolas, caso esses
municípios tivessem altas taxas de desmatamento. Enquanto isso, o governo
criava vastas áreas destinadas a conservação e proteção das populações
indígenas e tradicionais, tirando estas terras do mercado de grilagem e
impedindo a expansão da fronteira agrícola. O resultado deste processo foi a
queda de 70% do desmatamento em relação a sua média de anos anteriores em
apenas oito anos.
No entanto, a
sustentabilidade destes resultados depende da vontade continuada de lideranças
políticas e os perfis de risco das corporações nacionais e internacionais
ligadas as commodities agrícolas. Ambos serão testados enquanto a demanda por
soja e carne bovina cresce e comunidades locais lutam para se capitalizarem. Um
exemplo disso é o recente repique do desmatamento no ultimo ano (aumentando 28%
em 2013 em relação a 2012).
Os autores acreditam
que para manter os progressos conseguidos até aqui, é necessário começar a
integrar os incentivos positivos principalmente para aqueles produtores que
estão fazendo tudo certo do ponto de vista ambiental. Para expandir os
incentivos positivos, os autores convocam uma “abordagem territorial” que
definirá metas para a redução do desmatamento em escala regional. Os
agricultores de regiões que atendessem a esses objetivos seriam recompensados
com acesso preferencial ao financiamento e compradores.
Esta abordagem tem
funcionado para mudar outras práticas agrícolas e de pecuária, tais como
medidas de segurança para evitar a febre aftosa. Ela alinha ação positiva com o
ganho econômico incentiva a autofiscalização dentro da região, em vez de
depender somente de políticas de comando e controle e monitoramento que muitas
vezes são caras e difíceis de chegar em todos os cantos da região.
Os compradores
internacionais de carne bovina e soja podem desempenhar um papel importante na
gratificação dos esforços positivos naqueles territórios com desmatamento
reduzido e assim fortalecer o papel do estado na implementação de suas
políticas de produção sustentável na Amazônia.
“Nós achamos que
grandes compradores de soja e carne bovina, os agricultores locais, ambientalistas
e os líderes políticos podem se unir para criar uma abordagem coordenada que
irá funcionar em longo prazo”, diz McGrath. “A sobrevivência em longo prazo das
florestas amazônicas depende disso.”
Esta mudança é
importante não apenas para o Brasil, mas para o resto do mundo, pois o maior
potencial para a expansão agrícola hoje é encontrado no Brasil e em outros
países tropicais, e perda de floresta tropical é responsável por 15% das
emissões de dióxido de carbono global. Impedir a perda deste patrimônio que é a
floresta Amazônica, pode ter benefícios não somente para os Amazonas, mas
também para as outras regiões do Brasil, da América do Sul e até dos EUA que
tem o seu regime de chuvas afetado pela dinâmica do desmatamento da região.
“O grande desafio
global é produzir mais alimentos, para mais pessoas, em áreas menores de terra,
e ao mesmo tempo reverter à perda de florestas tropicais”, explica Nepstad. “O
Brasil tem mostrado ao mundo que isso pode ser feito.”
A coautora Ane
Alencar, do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), acrescenta:
“Agora, temos de mostrar que a diminuição drástica do desmatamento que temos
alcançado pode se tornar permanente – e que é realmente possível manter 80% da
floresta em pé para gerações futuras.” (ecodebate)
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