terça-feira, 9 de dezembro de 2014

As eleições e o desperdício dos alimentos

O desemprego e a fome foram temas presentes na campanha eleitoral de 2014.
Ninguém falou em desperdício de alimentos. Por exemplo, o Brasil joga fora a cada ano R$ 12 bilhões em comida.
Nesse momento em que o país inteiro está voltado para os grandes temas nacionais, vale a pena lembrar que o desperdício de cada um de nós poderia alimentar 30 milhões de pessoas. Caberia à sociedade civil, e ao governo, evitar que tanta comida fosse jogada fora.
O Brasil joga na lata do lixo o equivalente a R$ 12 bilhões em alimentos por ano. Essa montanha de comida daria para alimentar cerca de 30 milhões de pessoas, ou 8 milhões de famílias durante um ano inteiro.
O cálculo foi feito pela Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo. O número já é conhecido dos políticos há algum tempo, mas não apareceu nas campanhas dos candidatos que hoje estão esperando pelo nosso voto.
O desperdício pode parecer um tema de menor visibilidade e menor atração quando comparado com a fome e o desemprego. Todos os candidatos à presidente da República e a maioria daqueles que concorrem aos governos dos Estados falaram nos 12 milhões de desempregados do país. Sem trabalho, nem salário, as famílias vivem no limiar da fome e da miséria.
Segundo estimativas da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação, a FAO, 10% dos brasileiros são desnutridos. Somam 17 milhões de pessoas que vivem com fome ou não comem o suficiente para manter a saúde.
Dentro desse contingente, há mais de cinco milhões de crianças e idosos, os que mais sofrem com a desnutrição.
Esses números são chocantes e é natural que sejam usados pelos candidatos nas suas campanhas. No entanto, o gigantesco desperdício de alimentos também choca e impressiona, justamente porque poderia contribuir para reduzir a fome. Choca mais ainda porque o desperdício é alguma coisa que poderia ser evitado, basta decisão e organização para isso.
É por isso que aproveito esse domingo de eleições, quando estamos escolhendo aqueles que vão conduzir esse país, para falar um pouco desse tema.
Vivemos numa sociedade acostumada ao desperdício, jogamos fora energia, bens de consumo, geladeira, TVs, vestimentas... Quanto mais rica e mais consumista a sociedade, mais ela desperdiça.
A prática norte-americana de trocar seus bens a cada ano pode parecer compreensível porque seus cidadãos têm poder aquisitivo, podem estar comprando e assim alimentam o mercado, geram empregos e salários.
Mas quando falamos em alimentos que são jogados fora num país onde há fome e desnutrição, esse raciocínio fica inaceitável.
A questão não pode ficar de fora do debate nacional motivado pelas eleições. Seja quem for o vencedor dessas eleições, presidente, governadores, senadores e deputados, o tema precisa ser tratado com seriedade. Porque quando falamos em desperdício de alimentos, estamos falando em fome, em perda de dinheiro, em mal aproveitamento dos nossos recursos e dos nossos potenciais.
Quanto o Brasil joga fora
Pelos cálculos da Secretaria de Agricultura e Abastecimento de São Paulo, só os supermercados jogam fora 13 milhões de toneladas de alimentos a cada ano. Mais de mil toneladas de produtos das feiras livres vão para o lixo a cada dia. Um quarto de tudo o que se produz em frutas, verduras e legumes no país é jogado fora. Se fossem recolhidas as sobras dos restaurantes e cozinhas industriais, seriam toneladas de alimentos. O que jogamos fora em nossas casas, somariam uma quantidade maior ainda.
Essa realidade faz com que numa mesma sociedade a fome e a desnutrição convivam ao lado de uma gigantesca sobra de alimentos. Um sistema gerenciado pelo Estado poderia fazer com que essa "sobra de comida" chegasse a quem tem fome. É isso o que vêm fazendo dezenas de organizações não governamentais.
Uma das primeiras iniciativas surgiu de uma ideia do Betinho, em 1992, quando lançou pelo país inteiro uma campanha contra a fome. Não era possível que um país de tantos recursos, com safras cada vez maiores, ainda abrigasse tanta gente passando fome, ele dizia.
Uma das iniciativas mais bem-sucedidas é o "Mesa São Paulo", do SESC Carmo, em São Paulo, criado ainda em 1994.
Hoje, uma equipe de profissionais treinados e com veículos percorre dezenas de empresas na cidade, recolhendo doações em alimento. São quase 40 mil pessoas atendidas em cerca de 200 instituições.
Outra iniciativa conhecida é a "Associação Prato Cheio", surgida há dois anos e formada por universitários que passaram a recolher alimentos nos mercados da cidade. Em um ano, foram coletados mais de 30 mil quilos de alimentos, oferecidos a mais de mil moradores de rua, mães e crianças carentes.
Há dezenas de outras organizações da sociedade civil trabalhando das formas mais variadas para reduzir o desperdício e a fome em todo o país. Numa outra frente, o Conselho Regional de Nutricionistas dos Estados de São Paulo, Mato Grosso do Sul e Paraná vem promovendo projetos e orientando nutricionistas de empresas e instituições a reduzirem as perdas de alimentos.
Desperdício dentro de casa
O desperdício pode ser visto em toda parte. O restaurante que prepara abobrinhas recheadas, por exemplo, joga fora o miolo e as pontas dessas abobrinhas. Na seleção dos repolhos que vão aos supermercados, são descartados todos aqueles que fogem do tamanho padrão.
Mas há outros desperdícios nem sempre visíveis e que acarretam igualmente grandes prejuízos. Só na agricultura, 20% ou mais de toda a produção são desperdiçadas. Estima-se que só a mecanização no transporte e distribuição dos alimentos, e sua acomodação correta nas prateleiras, poderiam reduzir o desperdício em 15%.
Outro cálculo da Secretaria da Agricultura diz que 30% de toda a comida comprada por uma dona de casa acabam indo para o lixo. Dados de especialistas em coleta urbana estimam que cada morador das cidades produza um quilo de lixo por dia. Desse total, de 50% a 70% seriam alimentos.
A mesma Secretaria da Agricultura elaborou um programa detalhado para evitar perdas em todas as fases da produção e consumo dos alimentos. O planejamento deve começar pela decisão do plantio, quando são selecionadas as variedades mais adequadas às condições locais de clima e solo. Também é preciso considerar as potencialidades do mercado e as melhores épocas para a comercialização.
Essa espécie de guia ante desperdício passa pela pré-colheita - sugerindo o uso adequado de adubos e defensivos agrícolas - até o adequado treinamento da mão-de-obra na colheita e o correto manuseio e acondicionamento dos produtos.
A lista de cuidados passa pela pós-colheita, pelo embalamento, o armazenamento e o transporte, até chegar às nossas casas, os consumidores. Uma das sugestões simples, mas que nem sempre seguimos: devemos comprar as hortaliças com folhas e talos e utilizá-los na alimentação, pois têm alto valor nutritivo.
Já há muitos especialistas e instituições preocupados com o desperdício de alimentos. Falta transformar esses cuidados em práticas do nosso dia-a-dia e em políticas de administração que devemos cobrar dos nossos governantes.
Aproveitando o tema e o dia, vale a pena lembrar: o importante, hoje, é não desperdiçar nosso voto. (uol)

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