O desemprego e a fome foram temas presentes na
campanha eleitoral de 2014.
Ninguém falou em desperdício de alimentos. Por
exemplo, o Brasil joga fora a cada ano R$ 12 bilhões em comida.
Nesse momento em que o país inteiro está voltado
para os grandes temas nacionais, vale a pena lembrar que o desperdício de cada
um de nós poderia alimentar 30 milhões de pessoas. Caberia à sociedade civil, e
ao governo, evitar que tanta comida fosse jogada fora.
O Brasil joga na lata do lixo o equivalente a R$ 12
bilhões em alimentos por ano. Essa montanha de comida daria para alimentar
cerca de 30 milhões de pessoas, ou 8 milhões de famílias durante um ano
inteiro.
O cálculo foi feito pela Secretaria de Agricultura
e Abastecimento do Estado de São Paulo. O número já é conhecido dos políticos
há algum tempo, mas não apareceu nas campanhas dos candidatos que hoje estão
esperando pelo nosso voto.
O desperdício pode parecer um tema de menor visibilidade
e menor atração quando comparado com a fome e o desemprego. Todos os candidatos
à presidente da República e a maioria daqueles que concorrem aos governos dos
Estados falaram nos 12 milhões de desempregados do país. Sem trabalho, nem
salário, as famílias vivem no limiar da fome e da miséria.
Segundo estimativas da Organização das Nações
Unidas para a Agricultura e a Alimentação, a FAO, 10% dos brasileiros são
desnutridos. Somam 17 milhões de pessoas que vivem com fome ou não comem o suficiente
para manter a saúde.
Dentro desse contingente, há mais de cinco milhões
de crianças e idosos, os que mais sofrem com a desnutrição.
Esses números são chocantes e é natural que sejam
usados pelos candidatos nas suas campanhas. No entanto, o gigantesco desperdício
de alimentos também choca e impressiona, justamente porque poderia contribuir
para reduzir a fome. Choca mais ainda porque o desperdício é alguma coisa que
poderia ser evitado, basta decisão e organização para isso.
É por isso que aproveito esse domingo de eleições,
quando estamos escolhendo aqueles que vão conduzir esse país, para falar um
pouco desse tema.
Vivemos numa sociedade acostumada ao desperdício,
jogamos fora energia, bens de consumo, geladeira, TVs, vestimentas... Quanto
mais rica e mais consumista a sociedade, mais ela desperdiça.
A prática norte-americana de trocar seus bens a
cada ano pode parecer compreensível porque seus cidadãos têm poder aquisitivo,
podem estar comprando e assim alimentam o mercado, geram empregos e salários.
Mas quando falamos em alimentos que são jogados
fora num país onde há fome e desnutrição, esse raciocínio fica inaceitável.
A questão não pode ficar de fora do debate nacional
motivado pelas eleições. Seja quem for o vencedor dessas eleições, presidente,
governadores, senadores e deputados, o tema precisa ser tratado com seriedade.
Porque quando falamos em desperdício de alimentos, estamos falando em fome, em
perda de dinheiro, em mal aproveitamento dos nossos recursos e dos nossos
potenciais.
Quanto o Brasil joga fora
Pelos cálculos da Secretaria de Agricultura e
Abastecimento de São Paulo, só os supermercados jogam fora 13 milhões de
toneladas de alimentos a cada ano. Mais de mil toneladas de produtos das feiras
livres vão para o lixo a cada dia. Um quarto de tudo o que se produz em frutas,
verduras e legumes no país é jogado fora. Se fossem recolhidas as sobras dos
restaurantes e cozinhas industriais, seriam toneladas de alimentos. O que
jogamos fora em nossas casas, somariam uma quantidade maior ainda.
Essa realidade faz com que numa mesma sociedade a
fome e a desnutrição convivam ao lado de uma gigantesca sobra de alimentos. Um
sistema gerenciado pelo Estado poderia fazer com que essa "sobra de
comida" chegasse a quem tem fome. É isso o que vêm fazendo dezenas de
organizações não governamentais.
Uma das primeiras iniciativas surgiu de uma ideia
do Betinho, em 1992, quando lançou pelo país inteiro uma campanha contra a
fome. Não era possível que um país de tantos recursos, com safras cada vez
maiores, ainda abrigasse tanta gente passando fome, ele dizia.
Uma das iniciativas mais bem-sucedidas é o
"Mesa São Paulo", do SESC Carmo, em São Paulo, criado ainda em 1994.
Hoje, uma equipe de profissionais treinados e com
veículos percorre dezenas de empresas na cidade, recolhendo doações em
alimento. São quase 40 mil pessoas atendidas em cerca de 200 instituições.
Outra iniciativa conhecida é a "Associação
Prato Cheio", surgida há dois anos e formada por universitários que
passaram a recolher alimentos nos mercados da cidade. Em um ano, foram
coletados mais de 30 mil quilos de alimentos, oferecidos a mais de mil
moradores de rua, mães e crianças carentes.
Há dezenas de outras organizações da sociedade
civil trabalhando das formas mais variadas para reduzir o desperdício e a fome
em todo o país. Numa outra frente, o Conselho Regional de Nutricionistas dos
Estados de São Paulo, Mato Grosso do Sul e Paraná vem promovendo projetos e
orientando nutricionistas de empresas e instituições a reduzirem as perdas de
alimentos.
Desperdício dentro de casa
O desperdício pode ser visto em toda parte. O
restaurante que prepara abobrinhas recheadas, por exemplo, joga fora o miolo e
as pontas dessas abobrinhas. Na seleção dos repolhos que vão aos supermercados,
são descartados todos aqueles que fogem do tamanho padrão.
Mas há outros desperdícios nem sempre visíveis e
que acarretam igualmente grandes prejuízos. Só na agricultura, 20% ou mais de
toda a produção são desperdiçadas. Estima-se que só a mecanização no transporte
e distribuição dos alimentos, e sua acomodação correta nas prateleiras,
poderiam reduzir o desperdício em 15%.
Outro cálculo da Secretaria da Agricultura diz que
30% de toda a comida comprada por uma dona de casa acabam indo para o lixo.
Dados de especialistas em coleta urbana estimam que cada morador das cidades
produza um quilo de lixo por dia. Desse total, de 50% a 70% seriam alimentos.
A mesma Secretaria da Agricultura elaborou um
programa detalhado para evitar perdas em todas as fases da produção e consumo
dos alimentos. O planejamento deve começar pela decisão do plantio, quando são
selecionadas as variedades mais adequadas às condições locais de clima e solo.
Também é preciso considerar as potencialidades do mercado e as melhores épocas
para a comercialização.
Essa espécie de guia ante desperdício passa pela
pré-colheita - sugerindo o uso adequado de adubos e defensivos agrícolas - até
o adequado treinamento da mão-de-obra na colheita e o correto manuseio e
acondicionamento dos produtos.
A lista de cuidados passa pela pós-colheita, pelo
embalamento, o armazenamento e o transporte, até chegar às nossas casas, os
consumidores. Uma das sugestões simples, mas que nem sempre seguimos: devemos
comprar as hortaliças com folhas e talos e utilizá-los na alimentação, pois têm
alto valor nutritivo.
Já há muitos especialistas e instituições
preocupados com o desperdício de alimentos. Falta transformar esses cuidados em
práticas do nosso dia-a-dia e em políticas de administração que devemos cobrar
dos nossos governantes.
Aproveitando o tema e o dia, vale a pena lembrar: o
importante, hoje, é não desperdiçar nosso voto. (uol)
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