domingo, 29 de março de 2015

A guerra pela água já é uma realidade?

Relembre três conflitos famosos que tiveram a disputa por recursos hídricos como um dos seus principais componentes. Confira também os "pontos quentes" do mapa mundial que poderão vivenciar guerras pela água no futuro.
Pode ser difícil de imaginar, mas houve  um momento em que Leonardo da Vinci, aquele considerado uma das mentes mais criativas na História humana, e Nicolau Maquiavel, cuja derivação de seu nome se tornou sinônimo de manipulação, uniram forças e usaram da água como instrumento de guerra. Antes de os dois gênios da Renascença criarem as obras que imortalizariam para sempre seu nomes ao longo dos séculos, eles criaram um plano para cortar o abastecimento de água de Pisa, cidade vizinha que estava em conflito com a Florença dos dois, criando diversos canais e barragens pelo vale do rio Arno.
Apesar de o plano “maquiavélico” não ter dado certo, isso só mostra que tensões violentas por conta da água, ou pela falta dela, não são novidade alguma. No momento em que a principal cidade brasileira e a maior da América do Sul passa por uma severa falta d’água, principalmente pela contínua má gestão do governo estadual ao longo dos últimos anos, um cenário distópico já está sendo visualizado pela população da cidade que conta com mais de 10 milhões de habitantes.
Para Brahma Chellaney, autor de Water, Peace and War: Confronting the Global Water Crisis, a água cria instabilidade de maneiras surpreendentes e mesmo que, até o momento, as guerras modernas ainda não tenham sido travadas pela água em si, o elemento foi um fato decisivo em muitas delas. Como exemplo, Chellaney cita que a água foi uma das fagulhas que incendiou, ironicamente,  a Primavera Árabe – uma vez que a crise que elevou o preço dos alimentos alguns anos antes foi causada pela escassez de água potável. Outro caso é exemplificado numa espécie de “teoria do caos”: a falta de terras com recurso hídricos fez a empresa Daewoo, da Coreia do Sul, impulsionar a queda do presidente da distante ilha de Madagascar, na África, em 2009.
Confira abaixo três dos conflitos mais famosos que tiveram a água como grande “incendiário”:
Bolívia: até mesmo a chuva
Em 2000, na cidade de Cochabamba, ocorreu a privatização da água e do já precário sistema de abastecimento e redes de esgoto, que ficou a cargo da Aguas del Tunari, um consórcio criado com capitais estrangeiros. Da noite para o dia, a população com cerca de 700 mil habitantes aumentou as tarifas em até 300% sem que houvesse sequer melhora nos serviços ou ampliação da área de cobertura para as zonas mais pobres.
Quando, de uma hora para a outra, a água, que assim como o ar deveria ser considerado um bem comum, se transformou em uma mercadoria cara ou simplesmente inacessível para a pobre população, as pessoas foram proibidas inclusive de coletar a água da chuva, não tendo outra escolha a não ser irem para as ruas protestarem. Após dias de conflito das forças armadas bolivianas lutando contra os próprios bolivianos em nome dos lucros de uma empresa estrangeira, um jovem de 17 anos morreu com um tiro de sniper do exército boliviano. O presidente Hugo Banzer cedeu à pressão popular e anulou o contrato de concessão, retornando à prefeitura de Cochabamba o controle da água e a infame lei 2029, que previa a privatização de toda a água da Bolívia, caiu.
China e Tibete: água é controle
Em uma reportagem sobre os problemas de escassez de água, a revista The Economist apontou que palavra chinesa para “política” (zhenghzi) tem um de seus caracteres similar a uma imagem parecida com gotas de água próximas a uma plataforma ou barragem. A sugestão do parágrafo inicial do texto, de que para os chineses a política e o controle de água são equivalentes, é justificável: como Maquiavel e da Vinci almejaram em Florença 500 anos atrás, a China tem em suas mãos o destino da população de seus vizinhos, pois os principais rios da Ásia (Mekong e Ganges) nascem na terra de Dalai Lama.
Esse é um dos maiores motivos pelo qual o exército chinês entrou e se instalou no Tibete há mais de 50 anos. Não foi exatamente por morrer de amores pelos monges budistas da região, mas sim por esta se tratar de um ponto estratégico geograficamente. Myanmar, Tailândia, Laos, Camboja, Vietnã, Bangladesh e, principalmente, Índia, são todos países que dependem dos rios que descem as geleiras do Himalaia e desafogam suas águas no Oceano Índico.
Oriente Médio: a guerra dos seis dias que dura 50 anos
Quando a Síria anunciou seu plano de obstruir um dos afluentes do Rio Jordão e desviá-lo para irrigar suas plantações, foi dado o primeiro passo para os seis dias de junho de 1967 que colocariam Israel contra a Síria, Egito e Jordânia, naquilo que ficou conhecido como a Guerra dos Seis Dias.
No momento em que o último tiro foi dado, o Egito tinha a Faixa de Gaza e o deserto do Sinai; a Síria ficou sem as colinas de Golã – onde nasce o Jordão, vital para o abastecimento de água em Israel; e a Jordânia, que só entrou na guerra na última hora, perdendo tudo o que anexara em 1948. Israel ocupou a Cisjordânia e Jerusalém Oriental e foi o grande vencedor da guerra-relâmpago.
E o futuro?
Cada vez mais estudos apontam que a escassez de água potável levará, invariavelmente, que países entrem em conflito – diplomático ou armado – por regiões abundantes de recursos hídricos. Veja no mapa abaixo, os “pontos quentes” que poderão vivenciar guerras pela água no futuro. (revistaforum)

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