Unidade de conservação nas áreas urbanas
ajudariam a preservar recursos hídricos
Escassez está associada a fatores como a falta de
planejamento dos assentamentos e equívocos no manejo do uso do mineral.
Criar e manter unidades de conservação (UCs) da
natureza nas áreas urbanas pode ser uma resposta para a falta de água. A
escassez está associada a fatores como a carência de planejamento dos assentamentos
urbanos, os equívocos no manejo do uso do mineral, a utilização de equipamentos
urbanos de distribuição ineficientes e responsáveis por enormes desperdícios, e
a pouca consciência do brasileiro em relação à escassez deste recurso.
A avaliação foi feita pelo biólogo e diretor do
Departamento de Áreas Protegidas (DAP) do Ministério do Meio Ambiente, Sérgio
Henrique Collaço de Carvalho.
Segundo ele, a existência de unidades de conservação
dentro e no entorno das cidades ajudaria na estabilização do regime de
precipitação de chuvas e reteria água no subsolo e lençóis freáticos. O
desmatamento e a impermeabilização do solo fazem com que a água da chuva chegue
mais rápido aos cursos d’água e ao mar, além de modificar o regime de
precipitação.
Sem consciência
”Esses fatores influenciam no clima, provocando
períodos de estiagem, com escassez de água e crise de abastecimento, sendo que,
imediatamente depois, vem o período de chuvas, acarretando alagamentos e a
ideia de abundância do recurso”, explica Collaço.
Quem vive no Nordeste tem uma percepção mais realista
sobre a necessidade de se poupar o recurso, lembra Collaço: “Só o nordestino
tem essa percepção e está acostumado com a escassez de água.”
À exceção do Nordeste, as demais regiões não têm essa
consciência, avalia o diretor do DAP/MMA. Segundo ele, no País, boa parte das
cidades não reservou espaços para UCs, que ajudam na reserva e provimento de
água, como ocorre em cidades planejadas como Brasília.
As UCs favorecem a recarga de água nos reservatórios.
“Em áreas desflorestadas e asfaltadas, a água que cai no chão impermeabilizado,
sem vegetação nativa ou com pasto, corre muito rápido para dentro dos corpos
hídricos, escorre e vai embora, em direção a alguma bacia hidrográfica e segue
para o mar, ou pode cair num reservatório, que tem superfície muito grande e
onde muita água se perde por evaporação”, acrescenta.
Infiltração
Num ambiente natural, diz ele, o quadro é outro. ”A
água cai nas folhas, há a colaboração do sombreamento, criando um ambiente no
qual a água penetra muito mais lentamente no solo e no corpo hídrico,
infiltrando mais e fazendo a recarga de mananciais e do sistema superficial, o
que garante sua provisão ao longo do tempo”, salienta. “Nessa situação, mais
favorável, quando acaba o período de chuva ainda existe água no subsolo,
vertendo nas nascentes e chegando aos cursos d’água.”
Sérgio Collaço insiste: as UCs são espaços
especialmente protegidos e a principal estratégia de conservação da biodiversidade.
“Quando delimitada, é usada como fonte e reserva de recurso natural, além de
preservar a paisagem. ”É assim em todo o mundo”, exemplifica.
“De forma planejada, uma UC garante a conservação da
biodiversidade, estoca recurso natural para se fazer manejo sustentável de
longo prazo, sob vários graus de restrições do acesso aos recursos naturais ali
existentes”, afirma o biólogo.
Amazônia
O conceito de Unidade de Conservação surgiu no Brasil
ainda na década de 1930, ganhando força no final dos anos 1970 e novamente nos
anos 1990 e 2000 na Amazônia.
“A questão é que a maior parte das áreas de
conservação da biodiversidade está localizada na região Amazônica, fora das
áreas urbanas e distantes da população, em ambiente rural ou remoto, como na
própria Amazônia, nos rincões do Jalapão, entre outros lugares”, lamenta
Collaço.
No caso da crise hídrica, o fim da resiliência
(capacidade de se adaptar ou evoluir positivamente na adversidade) está
associado ao fim das áreas naturais e a alteração drástica do ambiente que
poderia armazenar água da chuva, avalia o diretor do DAP/MMA.
“Belo Horizonte não teve esse cuidado e a falta de
planejamento urbano, e a explosão demográfica engoliram essas áreas naturais,
que deveriam ter sido preservadas para garantir a recarga de água, de forma
mais resiliente, no subsolo”, salienta.
Planejamento
Brasília é o exemplo contrário. Collaço acredita que
a cidade, nesse sentido, foi melhor planejada no seu desenvolvimento e atraiu
menos gente por não ter a dinâmica econômica de Belo Horizonte.
A capital do País possui amplos espaços de
preservação que garantem a qualidade do abastecimento, quase todo proveniente
de UCs. São exemplos o sistema Santa Maria-Torto (localizado no Parque Nacional
de Brasília e abastece a parte norte da cidade) e o sistema de Sobradinho (na
reserva biológica da Contagem), que, há anos, possuem tanto qualidade quanto
volume de água. Ele garante: “São sistemas bem estáveis e que flutuam muito
menos em função do regime de chuvas do que os sistemas localizados fora de
UCs.”
Além destes, o sistema do Descoberto foi protegido
pela gestão da Área de Proteção Ambiental (APA) de mesmo nome, hoje sob gestão
do Instituto Chico Mentes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), sendo que
esta APA garantiu a boa gestão do uso do solo desde sua criação na década de
1980.
De forma semelhante, a cidade de Belo Horizonte conta
hoje com a APA Sul, criada somente em 2001 pelo governo estadual, e que deve
ter o mesmo papel de proteção de mananciais da APA do Descoberto, no DF, com o
desafio de recuperar a resiliência do manancial que abastece a cidade de BH e
sua região metropolitana. (ecodebate)
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