Comércio
usa água despejada por prédio em São Paulo.
Líquido
vem do lençol freático; construtora fala em contaminação e governo não vê
problemas.
A
cada 15 minutos, um espigão recém-inaugurado na esquina das Ruas Augusta e Dona
Antônia de Queirós, na região central de São Paulo, jorra centenas de litros de
água na sarjeta. “Nem que eu tivesse uma caixa d’água de 50 mil litros dariam
para segurar o tanto de água que brota do lençol (freático) que está embaixo da
nossa garagem”, diz o gestor do condomínio Capital Augusta, José França,
de 52 anos.
O
edifício de fachada moderna e com pé-direito alto tem 16 andares, 160
apartamentos e um enorme subsolo usado como garagem. A água límpida e gelada é
jogada na rua por meio de um cano branco que passa por baixo dessa garagem. O
líquido é parecido com o de uma mina e corre como uma nascente por mais de 300
metros ao longo da Augusta, até entrar em um bueiro, na esquina com a
Praça Roosevelt.
Água
límpida
DAEE
informa que para o reuso seria necessária uma autorização especial.
Pela
manhã, alguns comerciantes usam baldes para pegar a água e lavar seus bares.
Outros enchem suas caixas d’água esvaziadas à noite. “A água é limpinha, dá
para lavar minha calçada e alguns carros”, afirma o manobrista Leandro Cardoso,
de 29 anos, que trabalha em um estacionamento na esquina das Ruas Augusta e
Caio Prado.
‘Vontade
de chorar’
Moradores
indignados com o desperdício procuraram a reportagem, após serem informados
pelo governo estadual de que não havia ilegalidade no procedimento adotado pelo
prédio. “Não dá nem para acreditar nisso. É dia e noite essa água jogada fora,
dá vontade de chorar até”, lamenta a aposentada Cleunice de Souza Antunes, de
69 anos, moradora da Rua Caio Prado.
O
problema no edifício da Rua Augusta ocorre em outros da capital construídos
sobre cursos d’água ou lençóis freáticos. Ao erguer a garagem subterrânea, a
construção do Condomínio Capital Augusta atingiu o lençol. Para evitar o
alagamento da garagem, o prédios joga a água em excesso na rua, causando um
desperdício não calculado de água.
“A
água é contaminada, o pessoal da construtora (Esser) falou que não dá para usar
nem para regar as plantas”, acrescentou o gestor do condomínio. Já o
Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE) informou que o prédio, se
quisesse fazer o reuso da água para lavar suas dependências, por exemplo, teria
de pedir autorização ao órgão.
O
DAEE diz ainda que não existe desperdício, uma vez que a água drenada para as
sarjetas “por vários prédios na cidade de São Paulo” acaba sendo lançada em
bueiros. Aí essa água é lançada em uma rede de microdrenagem e chega a um
córrego, completando seu “ciclo hidrológico”, segundo o governo.
Mas
essa mesma água que sai limpa do prédio entra em um córrego poluído, ou seja,
ela precisa ser tratada várias vezes, o que resulta em um custo aos cofres da
Sabesp, responsável pelo tratamento de efluentes na capital paulista.
Responsável
pelo Capital Augusta, a Esser informou que “a água proveniente do sistema de
drenagem é imprópria para o consumo e o contato humano e poderá ser reutilizada
apenas caso haja interesse do condomínio e seus condôminos, que são
responsáveis pelas obras necessárias para sua reutilização e tratamento”. A
empresa diz que o descarte de água é feito “conforme determinação da
legislação”.
“É
um absurdo esse desperdício. Nunca vi coisa igual”, afirma o jornalista Carlos
Alfredo Paiva, de 26 anos, morador ao lado. Outros vizinhos já foram cobrar do
gestor do prédio uma providência contra o desperdício.
Outro
exemplo
Alvo
de protestos de vizinhos por adotar a mesma drenagem de água na sarjeta da Rua
Frei Caneca, o Condomínio Paulista Home Resort obteve autorização para fazer o
reuso da água do lençol freático na lavagem semanal das dependências do prédio.
Vizinhos não se conformam com o
desperdício da água.
Para
lembrar
A
água de reuso é apontada por especialistas como a solução mais barata e viável
para a crise hídrica paulista. Um relatório que foi entregue à Sabesp, em
dezembro/14, aponta que, em dez anos, seria possível criar um sistema que
reutilizasse cerca de 10 m3 por segundo, capaz de abastecer 3,5
milhões de habitantes. (OESP)
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