Aumento da pobreza na América Latina é sinal negativo para os ODS e a agenda pós-2015
A América
Latina e Caribe (ALC) viveu um momento de grande crescimento econômico entre
2002 e 2008. Em 2009 houve recessão em função do impacto da crise
internacional, mas a região se recuperou em 2010 e 2011. Os primeiros 11 ou 12
anos do século XXI deixaram para trás o fantasma da “década perdida”. Neste
período, houve um processo de valorização cambial e de recuperação da renda. A
maioria dos governos – com alguma orientação de esquerda – aumentaram os gastos
sociais, possibilitando uma redução da pobreza e avanços no sistema de proteção
social.
O número
absoluto de habitantes vivendo na pobreza na América Latina caiu de 215 milhões
em 1999 para 164 milhões em 2012, uma redução de 51 milhões de pessoas em 10
anos. Em termos relativos a queda foi mais expressiva, passando de 43,8% em
1999, para 28,1% em 2012. O número de pessoas vivendo na extrema pobreza
(indigência) era de 91 milhões em 1999 e caiu para 66 milhões em 2012, ou, em
termos relativos, de 18,6% para 11,3% no mesmo período.
Tudo
indicava que a pobreza extrema poderia ser erradicada em um futuro próximo,
sendo que a meta 1 dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) poderia
ser alcançada em 2015 e a meta 1 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável
(ODS) poderia ser alcançada até 2030.
Porém, o
processo de redução da pobreza na região foi interrompido em 2013 e 2014,
segundo dados do relatório Panorama Social da América Latina 2014, apresentado
em Santiago do Chile, dia 26/01/2015, pela Comissão Econômica para a América
Latina e o Caribe (CEPAL).
As novas
estimativas da CEPAL apontam que o número de pobres subiu, em termos absolutos,
para 167 milhões de pessoas em 2014, com estabilidade da taxa em torno de 28%.
Contudo, houve um aumento absoluto e relativo da pobreza extrema (indigência)
que passou de 66 milhões de pessoas (11,3% do total) em 2012 – nível mais baixo
já alcançado, para 71 milhões de pessoas (12%) em 2014. Apesar disto, cinco
países registraram diminuição de mais de 1% nos níveis de pobreza: Paraguai, El
Salvador, Colômbia, Peru e Chile.
A reversão
das conquistas recentes está estreitamente relacionada ao desempenho
macroeconômico da região e a crise que atinge, principalmente, Venezuela,
Argentina e Brasil. A queda do preço das commodities prejudica as exportações latino-americanas.
O Brasil teve um déficit recorde em transações correntes, de cerca de US$ 90
bilhões em 2014. É um número insustentável e que tende a desvalorizar a moeda
nacional e a aumentar os preços internos, prejudicando toda a população,
principalmente suas parcelas mais pobres.
A indigência
no Brasil, em termos percentuais, não só aumentou em 2014, como deve aumentar
ainda mais em 2015, mas também é maior do que na Argentina, no Chile, no Peru e
no Uruguai. Talvez por isto o governo brasileiro tenha abandonado o lema: “País
rico é país sem pobreza”.
As
estimativas do Fundo Monetário Internacional (FMI) para o ano de 2015, indicam
recessão ainda mais forte para Venezuela e Argentina e queda da renda per
capita no Brasil. Institutos de pesquisa brasileiros já projetam queda do PIB
no país e agravamento da situação macroeconômica em decorrência do déficit
fiscal e das crises hídricas e energéticas.
Ou seja, os
números apresentados pelo Panorama Social da América Latina 2014, da CEPAL, são
bastante preocupantes em termos da inclusão social. Embora a incidência da
pobreza multidimensional tenha se reduzido entre 2005 e 2012 em 17 países da
região, os últimos resultados indicam que a ALC terá anos difíceis pela frente.
A reunião da
3ª Cúpula de Chefes de Estado da Comunidade de Estados Latino-Americanos e
Caribenhos (CELAC) ocorrida na Costa Rica no final de janeiro de 2015 teve como
tema central a luta contra a pobreza, sendo que o compromisso proposto pelo
Equador foi de estabelecer na região uma “zona livre de pobreza”. Porém, os
dados de 2013 e 2014 mostram aumento da pobreza e tudo indica que o número de
pobres e indigentes vai aumentar em 2015. Isto pode ser o prenúncio de uma
mudança também no ciclo político da América Latina.
Em relação
às condições de vida, a ONU tem uma agenda muito bem-intencionada para depois
de 2015, conforme proposto nos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável
(ODS). Mas o pressuposto básico para o sucesso dos ODS é o tal do “crescimento
sustentado”. Mas o mundo caminha para a estagnação secular e alguns países da
ALC (Brasil, Argentina e Venezuela) terão estagflação em 2015. Uma crise na ALC
pode também ser o prenúncio de problemas mais globais. Os próximos 15 anos
podem ser bem piores do que o último quindênio. (ecodebate)
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