Depois
dos 150 chefes de estado deixarem Paris nas mãos de seus negociadores para
discutir o futuro do Planeta na COP21. Os países membros do G77 querem
financiamento para se adaptar aos impactos das mudanças climáticas e suas
consequências e para a transição para uma energia verde. Sem garantias
econômicas nada acontecerá, esta tem sido a premissa da sustentabilidade: Quem
paga a conta?
A
urgência demanda que medidas sérias sejam adotadas para reduzir as emissões de
gases do efeito estufa para que a temperatura global não ultrapasse os 2°C ou teremos impactos irreversíveis. Até 12/12/15 saberíamos se
realmente os homens do poder desejam minimizar os efeitos das mudanças
climáticas ou irão se curvar mais uma vez ao atual modelo econômico e suas
consequências devastadoras. Neste ínterim, a palavra sustentabilidade será
usada e abusada. O que já foi esperança se tornou um jargão com pouca
credibilidade!
Um
recorte para o ano de 1995, quando eu estava tentando completar meu doutorado
na Universidade de Nottingham (Inglaterra) e tive a oportunidade de participar
oficialmente da minha primeira conferência acadêmica internacional que discutia
o desenvolvimento sustentável, em Manchester. Já no início, assisti a uma
palestra de uma doutoranda russa que havia entrevistado acadêmicos nos Estados
Unidos e na nova Rússia (pós-dissolução da União Soviética), pedindo para eles
descreverem o que entendiam sobre desenvolvimento sustentável. Foram 74
diferentes definições e eu acabei também sabendo que a palavra sustentabilidade
não existe no vocábulo russo, sendo que a mais próxima seria “estabilidade”.
Uma resposta de um professor se destacava no estudo: “Estabilidade para mim é ter
pão sobre a mesa”. Simples e direto, diante de um estado que não mais garantia
o básico, o que importava era garantir a sobrevivência física de sua família!
Para mim,
desde então, a sustentabilidade tomou outra dimensão. Em dois anos de pesquisa,
eu já havia lido dezenas de livros e artigos científicos que debatiam a
economia, energia, exploração de recursos naturais não renováveis,
globalização, explosão demográfica, impactos socioambientais, pensamento
sistêmico, ecologia industrial e a proposta de desenvolvimento sustentável. Na
ocasião apresentei meu primeiro artigo em conferência e que tentava fazer
sentido disto tudo. O título era provocador: “The Big Brothers: Trasnational
Corporations, Trade Organizations and Multilateral Financial Institutions” (em
português Os Grandes Irmãos: Empresas Transnacionais, Organizações de Comércio
e Instituições Financeiras Multilaterais), numa referência ao romance de George
Orwell, de 1984, depois transformado em filme. Neste eu apresentava minhas
dúvidas e sérias preocupações que com o modelo econômico mundial, onde seria
muito difícil vingar a sustentabilidade sob esta tríade dos Big Brothers. Na
ocasião, o organizador da conferência, Prof. Richard Welford, da Universidade
de Huddersfield, também editava um novo livro: “Hijacking Environmentalism:
Corporate Responses to Sustainable Development”, numa tradução livre, seria
algo como: “Sequestro do Ambientalismo: Resposta das Empresas para o
Desenvolvimento Sustentável”, e acabou me convidando para colocar meu artigo em
forma de capítulo no livro, tendo ele como coautor. O livro composto por dez
capítulos apresentava uma dura crítica de como o termo “desenvolvimento
sustentável” vinha sendo desfigurado de sua proposta, se traduzindo em soluções
rasas e de marketing empresarial. A “lavagem verde” vinha prevalecendo, isto é,
uma apropriação das virtudes ambientais por parte das empresas, num jogo de faz
de conta!
20 anos
depois, vemos a lama da Samarco, Vale e BH Billinton, destruir a bacia do Rio
Doce e a possibilidade de renda de centenas de pessoas, revelando da pior forma
o quanto estamos desprotegidos e o quanto temos de lutar para que as pessoas
“tenham pão na mesa”, diante da irresponsabilidade e negligência dos setores
privados e públicos; Vemos uma empresa como a Vale ser desqualificada do Índice
de Sustentabilidade da BM&FBovespa, quando eu me pergunto: Como ela foi
parar lá diante das suas atividades nefastas já denunciadas antes do crime de
Mariana?; Vemos o Senado Federal aprovar a PL 654/2015, que acelera a liberação
de licenças ambientais para grandes empreendimentos em infraestrutura,
reduzindo o prazo de liberação para 60 dias, demonstrando o quanto somos reféns
do modelo politico-propina-empresa; Vemos os discursos sobre a importância da
sustentabilidade na boca do povo e ao mesmo tempo as pessoas se digladiando
para consumir nas “Black Fridays” ao redor do mundo; Vemos discursos oficiais
da presidência da República falando em controle de desmatamento e energia
limpa, enquanto nos impõe a Usina de Belo Monte e aumenta a participação da
energia suja no sistema!
Enfim,
vemos que o livro de Welford, de 1995, nunca esteve tão atual e o quanto ainda
temos de barreiras pela frente para alcançar a sustentabilidade. Só nos resta
saber se ainda há tempo para chegar a algum lugar, sem sequestros no meio da
estrada, sem emissões e com o pão garantido! (ecodebate)
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