Proposta
do Brasil para COP21 poderia ser melhor, diz Observatório do Clima
O
Brasil apresentou a meta de diminuir as emissões de gases de efeito estufa em
37% até 2025 e em 43% até 2030, tendo 2005 como ano-base. Para o
secretário-executivo do Observatório do Clima, Carlos Rittl, no entanto, o país
tem capacidade para fazer muito mais e o governo brasileiro terá oportunidade
de melhorar sua contribuição contra o aquecimento global na 21ª Conferência das
Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP21),
que começou em 30/11 e segue até 11/12/15 em Paris.
A
contribuição brasileira levada à COP, chamada Contribuição Nacionalmente
Determinada Pretendida (INDC, na sigla em inglês), contém ainda ações como o
fim do desmatamento ilegal na Amazônia, a restauração e reflorestamento de 12
milhões de hectares, a recuperação de 15 milhões de hectares de pastagens
degradadas e o alcance de 45% na participação de energias renováveis na
composição da matriz energética.
As
contribuições apresentadas pelo Brasil e pelos países da convenção das Nações
Unidas para a COP21 tem o objetivo de limitar o aumento da temperatura média da
Terra a 2ºC até 2100, em relação aos níveis pré-Revolução Industrial.
Ultrapassar esse limite provocaria mudanças climáticas severas.
Segundo
Rittl, é possível limitar as emissões brasileiras em 1 bilhão de toneladas de
gases de efeito estufa até 2030, com ganhos econômicos. “O Brasil apresentou um
meta de redução de emissões com uma direção interessante, uma natureza
interessante, porque trata-se de uma meta que inclui redução absoluta de
redução de gases de efeito estufa, mas o nível de redução de emissão
insuficiente”, disse, contando que hoje o país emite em torno de 1,5 bilhão de
toneladas de gases.
Em
entrevista à Agência Brasil, ele diz que, com a atual meta brasileira “estamos
em uma trajetória de aumento superior a 2ºC”. “Então, temos certeza que o
governo brasileiro tem uma margem de manobra interessante para aumentar seu
nível de ambição”, disse.
O
Observatório é uma rede brasileira de articulação sobre mudanças climáticas
globais e conta com 38 instituições, entre membros e observadores.
Agência
Brasil: Qual sua avaliação sobre as contribuições dos principais atores na
negociação climática?
Carlos
Rittl: A análise da própria Nações Unidas indica que, mesmo com esses esforços,
com essa mobilização, com esse engajamento dos países, nós ainda estaríamos, em
2030, em uma trajetória de aumento de emissões globais, em uma taxa menor do
que ocorre hoje, mas em ascensão, o que é muito preocupante. Outro relatório
produzido pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente mostra que ainda
existe uma grande lacuna entre aquilo que os países estão se comprometendo a
fazer e aquela que seria uma trajetória de segurança climática, aquela que nos daria
maiores chances de limitar o aquecimento global no limite de 2ºC. Outras
análises mostram que, entre os grandes emissores, que inclui Estados Unidos,
União Europeia, China, Índia, Brasil, África do Sul, México, Japão, Rússia,
Canadá, nenhum deles está fazendo o suficiente, todos estão fazendo menos que o
proporcional à sua responsabilidade e sua capacidade de redução de emissões.
Então é necessário fazer muito mais e isso inclui o Brasil.
Agência
Brasil: Durante a COP21 poderemos alcançar um consenso mais positivo?
Carlos
Rittl: A COP é uma oportunidade para que os países apresentem um maior nível de
ambição, isso pode acontecer. Acreditamos que todos colocaram na mesa seus
níveis de ambição inicial e estão preparados para assumir compromissos maiores,
em Paris e no pós-Paris. Com uma meta indicativa conseguimos, sistematicamente,
fazer a análise do impacto agregado das reduções de emissões de todos os países
para identificar qual a lacuna dessas metas, em relação ao que a ciência
recomenda. Então, a negociação de Paris não é só importante para o nível de
ambição que sai de lá, mas para elevar esse nível ao longo do tempo.
Agência
Brasil: O que pode melhorar na meta brasileira?
Carlos
Rittl: Temos capacidade de fazer muito mais. A própria lista de ações que estão
informadas na proposta de compromissos do Brasil demonstra isso. Estamos
discutindo a eliminação do desmatamento ilegal só na Amazônia e só em 2030. Mas
sabemos que, desde 2008 temos um Plano Nacional de Mudanças Climáticas que
estabelece a meta de chegarmos em 2015 com um desmatamento líquido zero em todas
as regiões do país. Então não é possível que em 2030 estejamos almejando algo
inferior ao que estabelecemos como compromisso sete anos atrás.
Sobre
o aumento da participação de fontes renováveis de energia, podemos ter um
impulso muito maior com energia solar, eólica e biomassa. Depois do anúncio de
compromissos do país para a COP, foi colocado em consulta pública um plano para
expansão da geração de energia no Brasil que inclui o aumento dos investimentos
em combustíveis fósseis. Setenta e um por cento dos investimentos projetados
para os próximos dez anos vão para petróleo, gás natural e carvão mineral. Isso
está em descompasso como essa urgência de reduzir emissões. O Brasil é um país
muito vulnerável. Neste ano, mais de 25% dos municípios brasileiros decretaram
situação de emergência ou calamidade pública em função de desastres naturais
ligados ao clima extremo e sabemos que isso está se agravando, então deve ser
do nosso interesse não só reduzir as emissões para diminuir a nossa
vulnerabilidade, mas para aproveitar o potencial que nós temos.
Agência
Brasil: Sobre o financiamento, qual seria o modelo ideal para o Fundo Verde do
Clima?
Carlos
Rittl: Financiamento é de fato um tema-chave para o sucesso da negociação. Os
países desenvolvidos assumiram, em 2009, o compromisso de chegar até 2020 com
US$ 100 bilhões em recursos para apoiar ações de redução de emissões e de
adaptação de mudanças climáticas em países em desenvolvimento, especialmente
países mais pobres. Foi estabelecido o Fundo Verde do Clima, mas é um grande
fundo ainda sem muitos recursos. Ele precisa ser alimentado com o aumento do
compromisso de apoio por parte de países desenvolvidos, através da criação de
mecanismos inovadores. Por exemplo, está na mesa de negociação uma proposta de
taxação de emissões de transporte aéreo e marítimo internacional. As emissões
de um avião que sai do Brasil para Paris não são atribuídas a nenhum desses
países. As emissões do transporte de carga, de exportação de soja ou carne do
Brasil para China, também não são atribuídas nem ao Brasil nem à China. A
taxação das emissões desse transporte, por um lado, ajudaria a regular as
emissões e promover a eficiência desses sistemas de transporte e, por outro
lado, ajudaria a arrecadar fundos que poderiam alimentar o fundo e aumentar o
aporte internacional de recursos.
Agência
Brasil: Qual deverá ser a contribuição internacional do Brasil?
Carlos
Rittl: O Brasil tem um papel muito importante na cooperação sul-sul, já que o
Brasil é uma grande economia em desenvolvimento e tem um arcabouço de políticas
de ações e um arcabouço institucional que é mais forte do que muitos países,
por exemplo, o continente africano. Nós podemos intensificar nossa cooperação
sul-sul compartilhando o conhecimento que nós temos, seja em monitoramento de
floresta, seja em uma produção mais limpa. Ao longo do tempo, vencendo os
desafios de crescimento e desenvolvimento do país, podemos considerar aportar
recursos ao longo das próximas décadas para manter o Fundo Verde do Clima e
manter o apoio a esses países menos desenvolvidos, que são aqueles que não têm
nenhuma responsabilidade sobre o problema e que pagam um preço muito alto
porque não conseguem lidar com os eventos extremos que já os assolam, como
secas e tempestades e o risco de elevação do nível do mar.
Agência
Brasil: O que representa essa elevação de 2ºC?
Carlos
Rittl: Dois graus é o limite considerado seguro, que ainda permite gerenciar os
impactos sem consequências muito graves. Dados da Universidade Federal de Santa
Catarina, do período de 1991 a 2012, mostram que 127 milhões de brasileiros
estiveram em regiões que foram atingidas por eventos climáticos extremos ou
situação de emergência ou calamidade pública, nesse período de 22 anos. De 2001
a 2012, a intensidade média de eventos foi 40% superior do que da primeira
metade do período. Ou seja, já estamos sujeitos ao aumento da frequência de
desastres e risco maiores.
Com
2ºC, teríamos consequências severas não só para a biodiversidade mas para a
população que depende de um ambiente natural bem conservado para sua
subsistência, seja pela questão da água, seja pela questão dos alimentos
obtidos da natureza.
Com
2ºC, se vivemos hoje uma situação de estresse e de crise hídrica no Brasil, no
Sudeste e no Nordeste, a tendência é que as consequências sejam piores. Estamos
falando de risco crescente para vida, para qualidade de vida, para a economia e
para o ambiente como um todo. Temos que cobrar de todos que estão em Paris que
façam aquilo que é necessário e eles sabem o que é preciso fazer. (ecodebate)
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