“É
então este o triste destino que nos espera?”, questiona Carlo Petrini, chef
italiano e fundador do movimento Slow Food, em artigo publicado por II
Manifesto, 31/12/2015.
Como
está a saúde do planeta? Essa pergunta certamente não é fácil de responder,
acima de tudo porque depende de uma infinidade de aspectos e fatores que não
são simples de se avaliar sob um mesmo ponto de vista. Questionar-se sobre qual
é a qualidade no nosso lar comum, todavia, não é somente um dever como
habitantes, mas uma necessidade cada vez mais urgente dado que, evidentemente,
do estado em que se encontra nosso planeta dependem todas as nossas
possibilidades de sobrevivência como espécie humana. Talvez aqui esteja o
primeiro ponto de reflexão: o que está em risco, devido às mudanças climáticas,
a destruição dos recursos naturais, a utilização desenfreada do ambiente para
fins produtivos e erosão dos frágeis habitats devido à pressão demográfica, não
é o planeta e sim o futuro da espécie humana.
A
própria convicção de que 7 bilhões de pessoas podem colocar fim na vida de um
planeta que tem 5 bilhões de anos é, de fato, no mínimo um pouco excêntrica, se
não verdadeiramente megalomaníaca. E é a mesma premissa cultural que faz com
que a relação que temos com a Terra seja tão predatória e de dominação ao invés
que de equilíbrio e adaptação.
Ao
contrário, a realidade é bem diferente porque é possível que outras espécies no
planeta tomem o lugar daquelas que estamos destruindo com nossas produções
aceleradas, os recursos naturais se reconstituirão quando nós não seremos mais
capazes de destruí-los, mas neste meio tempo, esperamos que não, a única coisa
que será perdida verdadeiramente é a espécie humana, com toda a sua potência
produtiva e toda a sua gloriosa civilidade.
É
então este o triste destino que nos espera? Acho que não, porque estou convicto
de que a nossa inteligência, a nossa capacidade de cooperar e o nosso espírito
de sobrevivência farão com que saibamos retomar o contato com a realidade e
inverter este processo autodestrutivo que se enraíza nas revoluções industriais
e que no último século cresceu de uma forma absurda e sem precedentes.
O
ponto é que nós, como sociedade humana, alcançamos de forma hegemônica um
modelo de relações e de interações fundamentado numa economia capitalista que
identifica falsamente o acúmulo de dinheiro com o progresso, mas que na verdade
gera a concorrência desenfreada, a dominação, a injustiça, a desigualdade, o
desperdício, a destruição, a exploração, a pobreza. Uma economia que mata, como
seguidamente tem dito o Papa Francisco que deixou claro na Encíclica Laudato
Si.
Não
apenas, mas somos também capazes de concordar que este seja o modelo “natural”,
que não exista outra forma de habitar a casa comum e de conviver com os nossos
semelhantes e com o ambiente que nos abriga. Por sorte, ao invés, se pode mudar
de direção, mas são necessários novos paradigmas que nos permitam reconstruir a
fibra da nossa convivência sobre novas bases, de cooperação, de auxílio mútuo,
de igualdade. É preciso um caminho comum, onde os países do norte do planeta
(que são os maiores responsáveis pela degradação ambiental e pela exploração
abusiva dos recursos) tenham força e dignidade de assumir a direção para a
mudança. Mesmo porque serão as populações e as áreas do planeta mais frágeis,
devido a pobreza ou a instabilidade histórica, a sofrerem as consequências
catastróficas das mudanças climáticas.
Neste
percurso de renovação, a produção de alimentos pode ser um bom exemplo da força
propulsiva que têm os novos comportamentos virtuosos. Hoje, 70% dos recursos
hídricos são utilizados para a agricultura e pecuária, fertilizantes e
pesticidas representam uma fonte relevante de emissão de gases de efeito
estufa, a criação de animais em escala industrial com os dejetos como grandes
poluentes dos lençóis freáticos, para não falar das enormes áreas de terra
utilizadas para a produção de ração animal, desmatando seguidamente áreas
verdes e utilizando culturas geneticamente modificadas que destroem o
patrimônio da biodiversidade. Ao mesmo tempo, porém, na produção de alimentos
existem sinais de resgate, de novidade, de cura e de atenção, exatamente
aqueles novos paradigmas, dos quais temos extrema necessidade e que
seguidamente não sabemos onde procurar.
Basta
pensar nas experiências dos milhões de agricultores que em cada canto do mundo
estão andando na direção da conservação dos recursos naturais, utilizando
métodos agrícolas em harmonia com a região e com as condições ambientais, que
não somente não impactem nos ecossistemas aos quais estão inseridos, mas do
contrário, aumentam a resiliência e durabilidade. Não somente, mas ao lado
destes produtores existem massas enormes de habitantes das cidades que
escolheram sustentar este esforço, cortando os intermediários e pagando um
preço alto aos produtores, remunerando de forma justa o trabalho pagando
antecipadamente o produto de maneira a não os forçar a contrair empréstimos
desvantajosos, valorizando o trabalho limpo e promovendo o desenvolvimento.
Este novo mundo já está presente, já está difundido, funciona e gera dignidade,
desenvolvimento e satisfação em todos os envolvidos.
E
ainda, na conferência mundial sobre o clima, na recente Conferência de Paris
que tinha o objetivo de fixar práticas e objetivos concretos para conter o
aquecimento global abaixo dos 2°C, o setor da agricultura tem sido
desprezado ao extremo. Como já evidenciado diversas vezes, no texto extraído
das negociações não aparece nenhuma vez os termos “agricultura”,
“biodiversidade” e “cultivo”. Este é um sinal ainda mais desencorajador porque
exemplifica como não nos damos conta que, para sair da crise ambiental na qual
estamos inseridos, não se pode não atribuir um papel importante às atividades
necessárias para a sobrevivência de cada ser humano: o ato de se alimentar.
Toda
a atenção é voltada aos setores de energia, da indústria, dos transportes; é
fato que se fala também de solo e de segurança alimentar, mas não se reconhece
de forma explícita o papel central da relação direta entre clima, cultivo da
terra e alimento.
Voltando
então a pergunta inicial, provavelmente a reflexão sobre a saúde do planeta não
pode ser mensurada se não nos questionarmos também qual é o estado da
comunidade humana que o habita. Que mundo queremos deixar para os nossos
filhos, quais ideias de felicidade queremos buscar e como pensamos em
alcança-la? Eu realmente acredito na nossa capacidade de mudar, de cooperar e
de superar as dificuldades e isso me deixa otimista. É preciso, porém,
continuar a lutar para favorecer a conscientização mundial de que o fetiche a
competição não é compatível com uma vida digna e feliz. Neste sentido, 2016 que
está por começar será um ano de mudanças, e estou convencido que será em termos
positivos. (ecodebate)
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