Um
fato universalmente identificado na demografia é o desequilíbrio na razão de
sexo ao nascer. Em todos os países nascem mais homens do que mulheres. Na média
mundial, a razão de sexo ao nascer varia entre 3% e 5% a favor dos homens.
Números muito acima desta média, podem indicar alguma forma de preferência
pelos filhos do sexo masculino ou a prática de “femicídio” ou “fetocídio”, como
ocorre na China.
A
razão de sexo ao nascer na América Latina e Caribe (ALC) é de 1,05 crianças do
sexo masculino para cada 1 criança do sexo feminino. Contudo, a razão de sexo
vai se invertendo com o avançar das idades. Existem em alguns países da região
uma enorme sobremortalidade masculina nas idades jovens em decorrência,
principalmente, dos homicídios e dos acidentes de trânsito. O Brasil e,
especialmente, El Salvador são países com alta incidência de sobremortalidade
masculina de jovens. Juntando-se a isto a sobremortalidade masculina por causas
“naturais” no topo da distribuição de sexo e idade da população, percebemos que
a ALC apresenta um grande excedente de mulheres na parte superior da estrutura
de idades.
Na
China há muitos mais homens do que mulheres na população total e o sexo
masculino predomina em todos os grupos etários até 69 anos. As mulheres são
maioria somente nos grupos acima de 70 anos. Na média da América Latina e
Caribe as mulheres superam os homens após os 50 anos. No Brasil as mulheres
superam os homens a partir dos 25 anos. Porém, o país com maior superávit
feminino é El Salvador que tem taxas de mortalidade masculina muito altas em
decorrência da violência e dos homicídios. Reduzir a sobremortalidade masculina
jovem é fundamental para diminuir o desequilíbrio de sexos na pirâmide etária.
Contudo,
todos os países possuem um superávit de mulheres nas partes altas da pirâmide
populacional. A especificidade da América Latina é que o superávit feminino
ocorre precocemente nos grupos etários. Quanto menor é a razão de sexo, maior é
a proporção de mulheres idosas morando sozinhas nos domicílios particulares. Na
literatura demográfica, especialmente a partir dos estudos da doutora Elza
Berquó, esse fenômeno foi denominado de “pirâmide da solidão”, indicando a
existência de um crescente número de mulheres idosas sem cônjuges no topo da
estrutura etária.
Lendo
os trabalhos de Berquó e trabalhando com a ideia de “capital marital”, a
antropóloga Mirian Goldenberg disse: “Pela primeira vez percebi que a frase tão
exaustivamente repetida pelas brasileiras – ‘falta homem no mercado’ – é uma
realidade demográfica bastante cruel, sobretudo para as mulheres mais velhas”.
De
fato, o excedente feminino cresce nos grupos etários da parte superior da
pirâmide. Todavia, a atuação requerida da sociedade brasileira e
latino-americana é no sentido de reduzir a sobremortalidade masculina em idades
jovens, o que ajudaria a diminuir os desequilíbrios no “mercado matrimonial”.
Há também o questionamento da necessidade de um par conjugal, como o exigido no
modelo de família tradicional.
Mulheres
sem cônjuge no século XXI constitui um fenômeno muito diferente daquele formado
pelas chamadas “solteironas” ou “titias” do passado. Mulher morando sozinha não
é sinônimo de pessoa solitária. Domicílios unipessoais femininos não devem ser
vistos como uma anomalia social. Em qualquer situação, há sempre a
possibilidade de se fortalecer o “capital pessoal” e o “capital social”,
independentemente do grupo etário e da quantidade de pessoas existentes nas
moradias particulares. Vidas no singular podem ser vividas, para além do espaço
domiciliar, de maneira positiva e feliz. (ecodebate)
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