Governo federal espera pela prorrogação do prazo da
lei que acaba com os lixões
Uma
montanha de 40 toneladas de lixo foi exposta pela Companhia Municipal de
Limpeza Urbana (Comlurb) na Praia de Copacabana, para mostrar à população e aos
visitantes do Rio de Janeiro todo o recolhimento de lixo no Ano Novo.
A Política Nacional de Resíduos Sólidos foi aprovada em 2010 e
determina que todos os lixões do país deveriam ter sido fechados até 2 de
agosto de 2014.
Estão
em tramitação no Congresso Nacional dois projetos que prorrogam o prazo para
que municípios passem a dar o destino adequado aos rejeitos de resíduos
sólidos, fechem seus lixões e se ajustem de vez à Política Nacional de Resíduos
Sólidos. A proposta que prevê o aumento escalonado do prazo, de acordo com o
porte da cidade, é bem recebida pelo governo federal porque coloca os
municípios na legalidade, como explica a diretora de Ambiente Urbano do
Ministério do Meio Ambiente (MMA), Zilda Veloso.
“Apesar
de não ser o ideal, se formos observar a Política de Meio Ambiente e a Lei de
Crimes Ambientais, havia uma previsão de que os quatro anos seriam suficientes
e não foram. O que a realidade nos mostra é que quem tem mais dificuldade são
os pequenos municípios. Essa proposta tem uma concordância do Executivo porque
ela cria critérios escalonados”, disse, explicando que o outro projeto que
prevê a prorrogação linear de quatro anos seria menos justo com os municípios
menores.
Para
a coordenadora de Resíduos Sólidos do Instituto Pólis, Elisabeth Grimberg, a
possibilidade de prorrogação da política é um desserviço e vai esticar seu
processo de implantação. “Não contribui para avançar na perspectiva da mudança
de padrão da gestão e destinação de resíduos. É um entrave porque quando terminar
os novos prazos, de novo os municípios vão deixando pra depois”, disse.
Os
problemas na implantação da política poderiam ser tratados de outra maneira,
segundo Grimberg, com a atuação do Ministério Público promovendo, por exemplo,
Termos de Ajustamento de Conduta junto aos municípios, estabelecendo metas e
discutindo como os gestores avançariam no gerenciamento de resíduos.
A
Política Nacional de Resíduos Sólidos foi aprovada em 2010 e determina que
todos os lixões do país deveriam ter sido fechados até 2 de agosto de 2014 e o
rejeito (aquilo que não pode ser reciclado ou reutilizado) encaminhado para
aterros sanitários adequados.
O
Projeto de Lei 2289/2015, aprovado no Senado e em tramitação na Câmara dos
Deputados, dá prazo até 31 de julho de 2018, para capitais e regiões
metropolitanas se adequarem; até 31 de julho de 2019, para municípios com
população superior a 100 mil habitantes; até 31 de julho de 2020, para
municípios com população entre 50 mil e 100 mil habitantes e até 31 de julho de
2021, para aqueles com população inferior a 50 mil habitantes.
Segundo
a diretora do MMA, os médios e pequenos municípios poderiam formar consórcios
para construção de aterros, mas acabaram esbarrando na falta de vontade
política, falta de técnicos locais para estar à frente dos projetos e de
recursos financeiros. “A política hoje é mais complexa, exige que exista um
plano de gestão, que o que vá para o aterro seja só rejeito, então tem que ter
coleta seletiva e redução da geração de resíduos. Mas solução não é muito
fácil”, explicou.
Veloso
conta que aproximadamente 41% dos municípios já elaboraram seus planos de
gestão e que apenas 58% dos resíduos sólidos gerado nas cidades estão indo para
aterros sanitários adequados. Sem a prorrogação dos prazos, os gestores municipais
que não se adequaram à política estão sujeitos a ação civil pública, por
improbidade administrativa e crime ambiental.
Técnicas
de tratamento diferenciadas
A
coordenadora do Instituto Pólis explicou que, de todo o lixo produzido no país,
60% é orgânico, 30% é reciclável e apenas 10% é rejeito, que precisa ir para
aterro. “Existem soluções práticas e tecnológicas, alternativas concretas de
tratamento. Mas tem muita desinformação dos gestores, falta terem maior contato
com experiência em andamento no Brasil e no mundo”, disse Grimberg, citando
exemplos de iniciativas de compostagem e biodigestão, sistemas de tratamento da
matéria orgânica.
Para
ela, os gestores locais têm insegurança de migrar do sistema de aterro para o
sistema de compostagem e /ou biodigestão, já que isso também requer um estudo
em termos de orçamento. “Falta compreender que tem que haver um remanejo, uma
reapropriação do recursos orçamentários para ser destinados para implantar
novas formas de coleta e tratamento, como parques de compostagem e
biodigestão”, disse Grimberg.
A
divulgação de técnicas de compostagem, inclusive, é uma prioridade para o MMA,
explicou a diretora Zilda Veloso, já que a aproximadamente 51% dos resíduos
sólidos gerados são resíduos orgânicos, que nem sempre precisam ser
considerados rejeito, algo que não tem aproveitamento técnico ou econômico.
Apesar disso, menos de 1% das cidades brasileiras fazem a compostagem, segundo
ela.
Além
da utilização como adubo, a compostagem reduz a periculosidade da matéria orgânica,
que normalmente gera gás e chorume, tornando-a um material inerte. “A questão
ambiental tem que ser encarada como uma economia a médio e curto prazo que os
governos federal e locais podem fazer, porque ela está ligada à qualidade de
vida e saúde das pessoas dentro das cidades, em reduzir as contas de hospital e
de recuperação de áreas contaminadas, por exemplo. Os países ricos fazem essa
conta, de reduzir os custos da gestão”, disse Veloso.
Ela
explica que o MMA oferta, sistematicamente, cursos a distância para gestores
municipais, muito focados em pequenos municípios, que são os mais carentes de
informação. “E não oferecemos só uma tecnologia, mas colocamos várias ideias
necessárias para que se melhore minimamente a gestão de resíduos”, disse
Veloso.
Acordos
setoriais
Outro
ponto da política de resíduos sólidos em implantação são os acordos de
logística reversa. Das cinco cadeias prioritárias, três já estão com acordos
assinados: embalagem de óleos lubrificantes, lâmpadas e embalagens em geral
(plástico, metal, papelão e vidro). As cadeias de eletroeletrônicos e
medicamentos ainda discutem os termos do acordo com o MMA.
Um
dos impasses para estabelecer a logística reversa dos eletroeletrônicos,
segundo Veloso, está no Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços
(ICMS), cobrado pelos estados na entrada e saída de mercadorias. “Os estados
não estariam reduzindo tributos, mas aplicando um imposto justo na entrada da
comercialização. A não cobrança dos impostos sobre o resíduo descartado vai
implicar em um preço mais justo para propiciar a reciclagem”, disse, explicando
que a decisão depende de negociações com os estados.
Outra
questão em debate são os pontos de recolhimento de material descartável que, de
acordo com a classificação de resíduos, podem ser considerados locais de
armazenamento de resíduo perigoso, portanto, sujeito a licenciamento ambiental.
Segundo Veloso a questão ainda está em debate no Conama, mas o MMA propõe que
produtos minimamente íntegros, descartados pelo consumidor, não apresentam
perigo.
Neste
ano, o MMA deve ainda atualizar aquelas cadeias de logística reversas
estabelecidas antes da lei de resíduos sólidos.
Inclusão
de catadores
A
política de resíduos sólidos prevê também a inclusão socioeconômica dos
catadores de material reciclável, que ficariam sem fonte de renda com o
fechamento dos lixões. Segundo Zilda Veloso, apesar de não ser regra,
naturalmente os municípios deveriam ofertar para eles trabalharem na coleta
seletiva e centrais de triagem, por exemplo, assim como as empresas que fazem a
logística reversa utilizarem a mão de obra dos catadores.
“Eu
acho que para os catadores a política está sendo bem inclusiva, apesar de todas
as dificuldades desse último ano. Eles estão crescendo na cadeia”, disse a
diretora, citando os programas do governo federal Pró-catador, de inclusão
socioeconômica de catadores, e Cataforte, que repassa recursos para
cooperativas e associações desses trabalhadores.
Para
Ronei Alves, da coordenação nacional do Movimento Nacional de Catadores de
Materiais Recicláveis, os municípios não estão priorizando a política de
resíduos sólidos e nem elaboração dos planos de gestão para acessar recursos
para o gerenciamento dos resíduos. Por outro lado, ele vê com bons olhos o
acordo setorial de embalagens em geral que inclui os catadores como atores
importantes da logística reversa.
“As
cooperativas e associações podem ser ferramentas importantes no sistema de
coleta seletiva e destinação dos resíduos. Gostaríamos que os prefeitos e
governadores vissem os catadores como aliados na implantação da política”,
disse Alves, contando que existem em torno de 1,2 milhão de catadores no
Brasil, incluindo aqueles que estão trabalhando nos lixões e nas ruas.
Sistema
de informações para a população
A
diretora do MMA disse que o Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão dos
Resíduos Sólidos está sendo estruturado para integrar todos os dados produzidos
pelo governo federal e pelos estados e municípios no atendimento à política
nacional. “Vai ser um grande ganho até o final de 2016 termos implantado o
sistema. Isso vai dar visibilidade a política nacional, vai fazer com que o
cidadão consiga mais informações e fique mais engajado e os próprios órgãos de
governo terão uma ferramenta eficiente para propor novas ações, como trabalhar
a possibilidade de incluir determinado rejeito na reciclagem no futuro.”
Para
Veloso, apenas aparentemente a implantação da política está devagar e logo será
possível ver o afunilamento de todas as iniciativas no efetivo cumprimento da
política. É uma política com pontos complexos e que mexe com vários atores,
segundo a diretora, como catadores, indústria, comércio, Ministério Público e,
principalmente, o cidadão. “Porque se o cidadão não fizer a parte dele a cadeia
não anda. Se ele não separar em casa o resíduo úmido do seco, como você vai
fazer a coleta seletiva? Não faz. Se o cidadão não descartar a lâmpada, o
eletrodoméstico, a embalagem de óleo no local correto, a logística reversa não
via funcionar. E o cidadão está entendendo que ele tem uma responsabilidade
nessa cadeia, tudo é um processo educativo de crescimento”, disse. (ecodebate)
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