Tecnologia já teria resolvido
problema de poluição dos carros diesel
A Câmara dos Deputados analisa um projeto de lei de lei que pode liberar a
comercialização e circulação de veículos leves a diesel no Brasil. O projeto é
polêmico. Ele já foi rejeitado duas vezes em comissões na Câmara. A sociedade civil e o próprio Ministério do
Meio Ambiente publicaram notas contrárias ao projeto, argumentando que ele pode
aumentar a poluição nas cidades brasileiras. Já os defensores dizem que o temor
de que ele polua mais é infundado. Segundo eles, o diesel é mais eficiente,
emitindo menos por quilômetro rodado, e já há tecnologia de filtros e
catalisadores para controlar a poluição.
Escapamento de carro a diesel da Volkswagen.
Época conversou com o vice-presidente de engenharia
da Bosch na América Latina, Mario Massagardi. Massagardi dirige a Aprove
Diesel, uma associação criada por empresas da indústria automobilística que
fabricam sistemas e componentes para motores a diesel. Ele diz que a poluição
do carro a diesel é um problema do passado e que, se o país quer enfrentar a
poluição do ar, deve proibir os carros antigos, independentemente do
combustível. "Hoje, um Fusca emite mais que 25 carros zero. Se a gente
quer realmente melhorar a qualidade do ar, tem de restringir a velharada",
diz.
Época - Por que o senhor defende a introdução do carro a diesel no Brasil? Isso
não pode criar mais um problema ambiental?
Massagardi - Estamos vendo muita desinformação
sobre esse tema, principalmente no lado ambiental da questão. Nós, da indústria
automobilística, não podemos concordar com a afirmação de que um combustível é
sujo ou poluente. Não é o combustível que polui, é o conjunto combustível e
carro. É a tecnologia que está lá dentro. Você pode ter um combustível com as
melhores características, mas, se é queimado em um carro que não tem
tecnologia, vai gerar uma quantidade ruim de gases tóxicos. No caso da lei que
se discute no Congresso, estamos falando de carros diesel equipados com
catalisadores e filtros. Com essa tecnologia, o carro emite 2 miligramas de
material particulado fino por quilômetro rodado. Isso é praticamente nada. Se a
gente acender um cigarro durante a viagem, vai emitir mais que isso. O bom é
que o filtro funciona sempre. É diferente do catalisador, que funciona melhor
com o motor quente. Quando a gente fala de poluição do ar por partículas, do
ponto de vista tecnológico, estamos falando de um problema já resolvido. Para
os carros a gasolina com injeção direta que já circulam no Brasil, essa tecnologia
ainda não existe. A quantidade de partículas finas, que são cancerígenas, são
dez a 15 vezes maior nesses carros do que no carro a diesel.
Época - Não existe a tecnologia de filtros para carros a gasolina?
Massagardi - Não é o mesmo filtro, tem de ter uma
tecnologia diferente. Para o diesel, até por necessidade, essa tecnologia foi
criada há dez anos. Para a gasolina, está começando agora, é uma coisa
incipiente. Por isso, esses carros com injeção direta poluem mais. Mas outros
carros também emitem substâncias. Por exemplo, o carro a álcool emite aldeídos,
que também tem efeito cancerígeno. A quantidade emitida por esses carros é no
mínimo equivalente ao diesel. Também criticam o diesel pela emissão de óxidos
de nitrogênio. Já há uma solução técnica adequada para isso, e os carros a
gasolina e flex emitem outras substâncias com o mesmo efeito. Por isso, é
preciso fazer essa ponderação. O carro a diesel emite material particulado e
óxidos de nitrogênio, mas, em contrapartida, outros carros emitem gases que têm
os mesmos efeitos.
O carro moderno, independentemente do combustível,
vai poluir de forma equivalente. O que precisa ser feito é a renovação da
frota. A lei que saiu em Paris faz isso. Os carros são classificados conforme a
categoria – e, diga-se de passagem, o diesel está na categoria Euro6, logo
abaixo do carro elétrico, como a segunda melhor categoria. A última categoria é
a de carros mais velhos que 1997. Paris proibiu esses carros de circular em
horário de pico. Se a gente fizer isso em São Paulo, o ar melhora muito. Proíbe
carros de antes de 1997 e caminhões mais antigos que 2003. São veículos sem
catalisador, sem filtro. Eles são os grandes poluidores. Hoje, um Fusca emite
mais que 25 carros zero. Se a gente quer realmente melhorar a qualidade do ar,
tem de restringir a velharada.
Época - A Europa já adotou há algum tempo o carro a diesel. Pode fazer um
balanço?
Massagardi - A lei europeia sempre foi bastante
restritiva. Quando um carro a diesel passa naquelas leis, é considerado
equivalente a um carro a gasolina. A estratégia europeia para adotar um carro a
diesel não foi por causa da poluição. Foi para controlar a emissão de gases de
efeito estufa. Há uns 15 anos, o carro a diesel ficou muito econômico, com um
consumo inferior e mais eficiência. Por isso, emite menos CO2. Outro
motivo é o econômico. O diesel na Europa é um pouco mais barato que a gasolina
e consome 30% menos.
Isso puxou o mercado. Hoje, metade dos carros é a
diesel.
Essa diferença econômica é muito significativa aqui
para o Brasil. Tanto que quem apresentou o projeto no Congresso foi o partido
Solidariedade, mais especificamente o pessoal ligado aos metalúrgicos do
sindicato de São Paulo. Eles têm interesse na criação de empregos qualificados
na indústria. Como esse carro tem tecnologia mais pesada, tem conteúdo agregado
de componentes maiores que poderiam ser nacionalizados, isso pode gerar
investimentos. Talvez duas, três montadoras nacionalizassem a fabricação dos
motores, o que geraria empregos. Outro setor que apoia fortemente é o dos
taxistas, que se beneficiariam com um carro mais eficiente. Os carros aqui no
Brasil têm uma eficiência questionável. São carros que fazem 7 quilômetros por
litro, 10 quilômetros por litro. Na Europa, alguns carros a diesel podem chegar
a 30 quilômetros por litro. Nós estamos jogando combustível fora.
Época - O diesel para carros leves foi proibido no Brasil por uma questão econômica. Não tinha o suficiente para atender ao mercado. Se liberarmos o carro a diesel, teremos de importar?
Época - O diesel para carros leves foi proibido no Brasil por uma questão econômica. Não tinha o suficiente para atender ao mercado. Se liberarmos o carro a diesel, teremos de importar?
Massagardi - O Brasil consome uma quantidade muito
grande de diesel. Em torno de 60 bilhões de litros por ano. Desses, mais ou
menos 10% são importados. Varia conforme a política energética, quando o
governo precisa acionar termelétricas, o consumo aumenta muito. Os 90%
restantes são refinados no Brasil e é o principal produto da Petrobras. Havia
no Brasil quatro projetos de novas refinarias: a Abreu e Lima, Comperj, e duas
que ficavam no Nordeste. O plano brasileiro era ser exportador de diesel
refinado. Só que a gente vê o nome dessas refinarias por outros motivos nos
jornais. Por conta do ambiente político e da crise econômica, os dois projetos
foram cancelados. Abreu e Lima entrou em operação e a Comperj deve entrar. Fora
isso, tem o biodiesel, que hoje fabrica 2 bilhões de litros, com capacidade
para dobrar a produção. A condição da gasolina é mais complicada. A Petrobras
tem capacidade para produzir 30 bilhões de litros, e essa capacidade está
estável há anos. O mercado de etanol se retraiu. Por isso, a gente vê a introdução
do carro a diesel como benéfica.
Época - Um relatório da Agência Internacional de Energia comparou a
regulamentação das emissões nos países. No Brasil, a maior parte das regras é
equivalente ao padrão da Europa, o Euro5. Só que, no caso do diesel, nossa
regulação é muito mais baixa, equivalente ao padrão Euro3, para permitir mais
enxofre na composição. A gente não corre o risco de trazer uma tecnologia nova,
e não a regulação mais severa, e, com isso, permitir mais poluição?
Massagardi - Aqui, no Brasil, temos dois tipos de
diesel, o S10 [com 10 ppm de enxofre na composição] e o S500 [com 500 ppm]. O
tipo de veículos que estamos falando só pode rodar com S10. Se rodar com coisa
pior, terá problemas sérios com o motor por contaminação por enxofre. São
coisas que, no carro moderno, são controladas por sensores que vão alertar o
motorista de que ele está correndo risco. Essa estrutura já existe em
caminhões, em carros a gasolina, flex e a diesel, e, cada vez que a legislação
evolui, ela fica mais exigente. Como hoje o S10 é um combustível que está
disponível no país inteiro, é uma coisa que a gente não vê com preocupação.
Todo posto tem de ter. A picape precisa. Se você usar o S500, danifica o motor.
Época - Se o S10 já existe em todo o país, por que ainda comercializamos o S500?
Massagardi - Os motores modernos, com
catalisadores, exigem o S10. Os mais antigos, que não tinham dispositivo, podem
usar com S500. É um combustível que existe para a frota mais antiga. Para
caminhão a partir de 2012, é obrigatório o uso do S10. Hoje, o mercado de
picapes já está acostumado a usar o S10. O carro, mesma coisa. Os dois
combustíveis existem porque a Petrobras tem capacidade limitada para produzir
um ou outro. Até que não se adapte, a gente terá de viver com essa realidade.
Mas, para esse nível de tecnologia que estamos falando de carro, tem de ser S10.
(biodieselbr)
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