Uma economia ecoeficiente, com
generalização da engenharia reversa, reciclagem, reutilização e refabricação,
permitiria reduzir tendencialmente a zero a extração de novos recursos naturais
e o descarte. Tal é o sonho do capitalismo “sustentável”, do qual a figura 1
brutalmente nos desperta.
Fonte: Daniel Hoornweg,
Perinaz Bhada-Tata, Chris Kennedy, “Environment: Waste production must peak
this century”. Nature, 30/X/2013; Joseph Stromberg, “When will we hit peak
garbage?”, Smithsonian.com 30/X/2013 http://www.smithsonianmag.com/science-nature/when-will-we-hit-peak-garbage-7074398/
O lixo urbano (RSU) cresce ao longo do
século XX e acelera-se após 2000, superando 3,5 milhões de toneladas por dia em
2010 (quase 1,3 Gigatoneladas ao ano) e 6 milhões em 2025. Mesmo no melhor dos
três cenários futuros (linha cinza), ele deve superar a marca dos 8 milhões de
toneladas de lixo por dia em 2050 (2,9 Gigatoneladas ao ano), um crescimento de
mais de 100%, quando a população deve crescer “apenas” 40% no mesmo período (de
7 bilhões em 2012 para 9,8 bilhões em 2050, segundo a última Revisão da Population
Prospects, da ONU).
Parte considerável desse lixo é
plástico. No World Economic Forum de Davos em 2016, a Ellen MacArthur
Foundation lançou, junto com a McKinsey, um estudo sobre o plástico e seu lixo,
intitulado The New Plastics Economy — Rethinking the
future of plastics. Em 1950, produziram-se 1,7 milhão de toneladas
de plástico. Em 1964, 15 milhões de toneladas e em 2014, 311 milhões de
toneladas. Em 65 anos, a produção de plástico multiplicou-se por 183 vezes,
como mostra a figura 2.
Essa produção, da qual apenas 5% é
hoje reciclada, deve dobrar nos próximos 20 anos e quadruplicar até 2050,
atingindo 1.124 milhões de toneladas. Enquanto apenas 6% do petróleo destina-se
hoje à fabricação de plástico, em 2050, essa porcentagem subirá para 20%.
Além desse documento, um artigo publicado
no The Guardian fornece novos dados sobre o problema. A
indústria mundial produz hoje quase 20 mil garrafas PET (polietileno
tereftalato) por segundo, ou um milhão delas por minuto. Em 2016, quase quinhentos
bilhões foram produzidas no mundo todo, sendo a Coca-Cola responsável por um
quinto delas. Isso significa um aumento de quase 200 bilhões de garrafas em
relação à produção de 2004. E a estimativa de um relatório sobre as tendências
das embalagens proposta pelo Euromonitor International é de que se produzam
583,3 bilhões dessas garrafas em 2021, uma evolução bem capturada pela figura
3.
Lixo
nos oceanos
Quanto
desse lixo plástico vai parar no mar? Segundo um estudo de 2015, Stemming the
Tide, há hoje mais de 150 milhões de toneladas de plástico no oceano. O estudo
da Ellen MacArthur complementa: “32% das embalagens plásticas escapam dos
sistemas de coleta” e 95% do seu valor (80 – 120 bilhões de dólares por ano) é
perdido para a economia. Não são bons números para os defensores do mito de que
o capitalismo é, malgrado tudo, ao menos um eficiente alocador de recursos…
A
mais precisa quantificação disponível sobre a quantidade de plástico lançado ao
mar a partir da terra (sem contar o lixo plástico descartado pelas embarcações)
é oferecida por um estudo publicado na Science em 2015. Seus autores calculam
que 275 milhões de toneladas de lixo plástico foram geradas em 192 países
banhados pelo mar em 2010, sendo que 4,8 milhões a 12,7 milhões de toneladas
(média de 8,75 milhões de toneladas) acabaram entrando nos oceanos, apenas
nesse ano. Isso significa jogar no oceano um caminhão de lixo por minuto. O
estudo da Science conclui: “sem aperfeiçoamentos na infraestrutura de manejo de
resíduos, prevê-se que a quantidade cumulativa de lixo plástico disponível para
entrar no mar a partir da terra deve crescer por uma ordem de grandeza
[multiplicado por 10] até 2025”.
Desde
1997, graças a Charles Moore, diretor da Fundação de Pesquisas Marinhas
Algalita, conhecemos a “Grande Mancha de Lixo do Pacífico” (The Great Pacific
Garbage Patch ou Pacific Trash Vortex), localizada entre o Havaí e a
Califórnia, composta predominantemente de plástico. Essa é a maior, mas há
outras nos cinco giros oceânicos. Segundo uma avaliação recente, o núcleo dessa
mancha estende-se por 1 milhão de km2 e sua periferia, por 3,5 milhões de km2.
Objetos e fragmentos maiores de plástico, como redes e outros objetos, têm
matado os animais que nele se enredam. Embora o plástico demore em média 450
anos para se degradar, a ação do sol, do vento e das ondas o decompõe em
partículas cada vez menores, até transformá-lo numa sopa de microplásticos
(<4 2007="" 2013="" 24="" 5="" a="" absorvem="" afirma="" alimentar="" animais="" ano="" artigo="" atualmente="" aves="" cadeia="" cem="" cerca="" colhidos="" culas="" da="" dados="" de="" decorr="" deo="" dispersos="" e="" efeitos="" em="" entre="" es="" estes="" expedi="" feros="" fim="" geographic="" h="" ingeridos="" ingest="" integralmente="" j="" letais="" m="" mam="" mant="" marinha="" marinhas="" mesmo="" micos="" mil="" mm="" morrem="" n="" national="" ncia="" nimo="" nos="" nossos="" o="" oceanos.="" oceanos="" ou="" outros="" part="" peixes="" pelos="" pl="" poluentes="" por="" pratos.="" qu="" que="" realizadas="" rios="" segundo="" span="" stico="" sua="" subletais="" surpreende="" t="" tartarugas="" terminando="" toda="" todo="" toxicidade="" trilh="" um="" v="">4>
Como
visto num artigo anterior (Jornal da Unicamp, 3/VII/2017), a sobrepesca
corporativa, a rede de arrasto e nossa voracidade carnívora provocaram desde
meados dos anos 1990 um calamitoso declínio dos cardumes, com uma estimativa de
depleção total em 2048. A indústria petroquímica, a obsolescência programada e
a civilização do descarte por ela criada estão substituindo esses ecossistemas
ainda exuberantes de vida por mortíferas e crescentes concentrações de
polímeros. Essa afirmação nada tem de uma hipérbole. O estudo da MacArthur
Foundation afirma que, “mantida a atual trajetória (business-as-usual
scenario), o oceano deverá conter em 2025 uma tonelada de plástico para cada
três toneladas de peixes e, em 2050, mais plástico que peixe (por peso)”. O
estudo admite que se trata de “uma suposição conservadora dado que os estoques
de peixe podem declinar como resultado da sobrepesca”. De seu lado, Julia
Reisser, uma pesquisadora da University of Western Australia, pôde constatar
que em certas regiões do mar: “você põe uma rede no mar por meia hora e recolhe
mais plástico que vida marinha. É difícil visualizar essa imensa quantidade,
mas seu peso é maior que a inteira biomassa dos humanos. É um problema
realmente alarmante que deve, provavelmente, piorar”. Segundo outra estimativa,
reportada pelo já citado artigo da National Geographic, “em certas partes do
oceano, há 60 vezes mais plástico que plâncton”.
Última
flor do petróleo
O
petróleo, todos sabemos, moldou as principais características de nossa
civilização termo-fóssil, aí incluídas o aumento exponencial de consumo
energético, as extinções em massa, as mudanças climáticas, a poluição da água,
dos solos e da atmosfera e a intoxicação química dos organismos. E o plástico,
na escala em que o conhecemos hoje, é sem dúvida seu mais sinistro e tardio
subproduto. As novas gerações não se dão conta de quão recente é sua
ubiquidade. William Gibson, célebre autor da trilogia Sprawl, assim relata sua
descoberta dessa onipresença. Após uma longa viagem de ônibus noite adentro até
Toronto, ele se recorda: “de manhã, quando a luz estava surgindo, eu vi sacos
plásticos verdes pela primeira vez na vida. Milhões deles, por causa de uma
greve municipal. E não conseguia entender por que razão havia tantos, e tive
que inferir suas funções. Não é estranho?”. Isso se passou em 1966 e talvez nem
a mente profética do criador do gênero cyberpunk tenha sido então capaz de
imaginar que, apenas meio século depois, uma das funções daqueles sacos verdes
seria plastificar os oceanos. (ecodebate)
Nenhum comentário:
Postar um comentário