Zerar o desmatamento na Amazônia é uma das
principais contribuições que o Brasil poderá dar à luta contra o aquecimento
global.
Especialista defende desmatamento zero na Amazônia
para combater mudanças climáticas.
Zerar
o desmatamento na Amazônia é uma das principais contribuições que o Brasil
poderá dar à luta contra o aquecimento global. A conclusão é do brasileiro e
integrante do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), Paulo
Artaxo, que apresentou em 19/10/18 no Rio de Janeiro, o novo relatório do
organismo. A pesquisa aborda as consequências de uma elevação mundial da
temperatura acima dos 1,5ºC até 2100. O teto é a aspiração mais ambiciosa do
Acordo de Paris.
Em
evento realizado no Museu do Amanhã pelo Conselho Empresarial Brasileiro para o
Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), Artaxo alertou que a alteração dos padrões
climáticos já é uma realidade em território nacional. “Várias regiões,
particularmente o Nordeste brasileiro e o norte de Minas, já sofreram
aquecimento entre 2 a 2,5ºC”, afirmou o especialista, lembrando dados do
Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) sobre o período 1981-2010.
Os
valores estão acima do aumento de 1ºC da temperatura global, verificado desde
2015 em levantamentos do serviço meteorológico do Reino Unido. A oscilação
mundial é um comparativo com médias dos níveis pré-industriais, antes do início
do século XX.
De
acordo com Artaxo, a disparidade desse índice em relação aos números do Brasil
se deve ao fato de que a média global inclui as variações térmicas nas
temperaturas dos oceanos, que se aquecem mais lentamente. Em ecossistemas
terrestres, o calor ultrapassa a estimativa geral.
A
análise do IPCC compara os impactos ambientais de um aquecimento global a 1,5ºC
e a 2ºC até o final do século. Mas segundo o integrante brasileiro do painel,
ambas as variações vão se traduzir em elevações mais altas da temperatura no
nível nacional e local, com as médias do Nordeste, por exemplo, subindo de
2,5ºC a 3ºC. Previsões do INPE indicam um aumento ainda maior, de 4 até 7ºC em
diferentes partes do Brasil, num cenário em que os atuais esforços para conter
o aquecimento global não fossem ampliados em todo o mundo.
Embora
pareça pequena, a diferença de 0,5ºC significa mudanças dramáticas para a
ocorrência de fenômenos climáticos extremos, perda de biodiversidade, elevação
do nível do mar e desenvolvimento econômico.
“Existem
regiões do Nordeste onde a precipitação já decaiu 60%. Isso é uma alteração
muito significativa para qualquer ecossistema, em particular para uma região
semiárida”, acrescentou Artaxo, que também é professor do Instituto de Física
da Universidade de São Paulo (USP).
Na
avaliação do pesquisador, as tendências de aquecimento e de diminuição das chuvas
devem piorar — e o Nordeste corre o risco de se tornar uma zona desértica. O
especialista ressalta ainda que as mudanças climáticas devem afetar outras
partes do Brasil, como os grandes centros urbanos do Sudeste. Enchentes e
estiagens, como a que atingiu São Paulo e deixou o estado em racionamento de
água, vão se tornar mais frequentes.
Em
nível global, manter a elevação da temperatura dentro do 1,5ºC permitiria, por
exemplo, salvar de 10% a 30% de todos os recifes de corais. Com o aquecimento a
2ºC, essas formações naturais devem desaparecer por completo do planeta. O
limite mais restritivo também impediria que o degelo da Antártida se tornasse
um fenômeno anual durante o verão. Com o teto menor, os mares subiriam dez
centímetros menos do que a 2ºC.
Desmatamento na Amazônia
De
acordo com o IPCC, restringir o aumento a 1,5ºC exigirá, até 2050, uma redução
a zero de todas as emissões líquidas de CO2. Atividades humanas que
continuassem dispersando gases do efeito estufa teriam de ser compensadas com medidas
para absorver gás carbônico, como o reflorestamento.
“Isso
vale tanto para não queimar combustíveis fósseis, como petróleo, carvão e gás
natural, quanto para reduzir o desmatamento, por exemplo, da região amazônica.
Esta tarefa é extremamente urgente porque não temos muito tempo para reduzir
estas emissões antes de ocorrer uma catástrofe climática global”, ressaltou
Artaxo.
O
analista vê desafios consideráveis na implementação dessa agenda de
sustentabilidade. Isso porque mesmo com a assinatura do Acordo de Paris, em
2015, as emissões de gás carbônico aumentaram 2% de 2016 para 2017, chegando a
36,8 gigatoneladas anuais. Para alcançar a meta do 1,5ºC, seria necessário
reduzir o volume de gás carbônico lançado na atmosfera em 45% até 2030 — tendo
como base os níveis de 2010.
Os
compromissos de cada país signatário do Acordo de Paris tampouco seriam
suficientes para conter o aquecimento global — estimado em 2,8ºC até 2100 com o
cumprimento das atuais promessas.
Sobre
o Brasil, Artaxo enfatizou a necessidade de “colocar o desmatamento da Amazônia
a zero”, uma das metas do país latino-americano junto ao documento
internacional.
“Temos
(também) que investir em energia eólica e energia solar particularmente no
Nordeste brasileiro. O Brasil tem o compromisso de reflorestar 12 milhões de
hectares no Acordo e Paris. Isso também é fundamental se nós quisermos garantir
um meio ambiente saudável para a população brasileira”, disse o especialista do
IPCC.
“Nós
precisamos de políticas públicas sólidas, de governos que tenham políticas de
Estado de longo prazo.”
Sustentabilidade nos negócios
Ana
Carolina Szklo, diretora de Desenvolvimento Institucional do CEBDS, vê uma
conscientização crescente do setor privado sobre a urgência das mudanças
climáticas. Segundo a gestora, empresas têm tomado a dianteira e criado
sistemas próprios de mitigação e compensação. É o caso de companhias que adotam
estratégias de precificação interna de carbono, a fim de identificar
departamentos e atividades com maior impacto ambiental.
“A
equação (dos negócios) está desequilibrada porque a gente não está ainda
internalizando algumas variáveis”, afirma a gestora. Segundo o CEBDS, 16
empresas brasileiras já trabalham com a precificação interna de carbono. Outras
27 declararam que utilizarão esse tipo de metodologia a partir de 2019.
Szklo
aponta ainda que a sustentabilidade tem um importante valor de mercado. “Gera
lucro e traz dinheiro. É bom para o meio ambiente, para as pessoas e para as
empresas”, afirmou.
Também
sobre o papel do setor privado no combate ao aquecimento global, o integrante
do IPCC, Paulo Artaxo, disse que “construir produtos que possam ter uma
durabilidade maior, que usem muito menos matéria-prima e que sejam mais
eficientes do ponto de vista do uso de energia é absolutamente estratégico para
o futuro do nosso planeta”.
“Do
lado empresarial, nós precisamos ter as empresas menos preocupadas com o lucro
no próximo balancete e muito mais preocupadas com a sustentabilidade do seu
próprio negócio a médio e longo prazo”, concluiu o pesquisador. (ecodebate)
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