Campanha Mares Limpos visa
combater poluição dos oceanos causada pelo consumo e produção de plástico.
A imagem é desconcertante e dramática. Olhamos de um lado
e de outro e os oceanos têm mais plásticos do que peixes. O ano é 2050. Cena de
filme de ficção? Longe disso. Este é um prognóstico mais próximo do real
descrito em estudo da fundação da navegadora Ellen MacArthur e da consultoria
McKinsey, se o modelo de desenvolvimento e comportamento das sociedades no
planeta permanecer do jeito que está. O anúncio foi feito no Fórum Econômico
Mundial de Davos, em 2016, e é reforçado por pesquisadores em um dos alertas
principais da Campanha “Mares Limpos” da ONU Meio
Ambiente, que começou em 2017 e deverá vigorar por cinco anos. Como suportar 8
milhões de toneladas de plásticos despejadas anualmente?
De acordo com estudo realizado
por cientistas das Universidades da Geórgia, da Califórnia e da organização
oceanográfica Sea Education Association publicado na Science Advances,
desde 1950 a 2015, a humanidade já produziu de 8,3 bilhões de toneladas de plásticos,
que seguem para os mares e oceanos no mundo, além dos 2 bi de toneladas
estimados provenientes de navios, como redes de pescas, de acordo com o
Instituto Francês de Pesquisa para a Exploração do Mar. Fica difícil
dimensionar o impacto deste volume, não é? Entretanto, este quadro é derivado
de algo mais perto do nosso dia a dia, que é a nossa relação de produção,
consumo e descarte.
Argumentos não faltam, mas,
apesar disso, os processos de mudança quanto à produção sustentável e consumo
consciente são extremamente lentos. Primeiramente é necessário lembrar que a
matéria-prima da maior parte dos plásticos utilizada é o petróleo, pertence ao
grupo dos polímeros (polipropileno/polietileno) que são difíceis de se
decompor, podendo levar décadas a 200 anos para se biodegradar. Nas águas
oceânicas e nos estômagos dos animais são encontrados de tudo: sacolas,
embalagens, tampas, canudos plásticos (sétimo item mais coletado nos oceanos),
segundo a ONG Ocean Conservancy), …
Segundo a ONU Meio Ambiente, em
um período de 150 anos, mais de 40% dos plásticos produzidos foram usados uma
única vez, e somente 9% são reciclados. No Brasil são produzidos anualmente
cerca de 10,5 mi toneladas de plásticos. Segundo o Sindicato Nacional de
Empresas de Limpeza Urbana (Selurb), se tudo fosse reciclado, poderia haver um
retorno de R$ 5,7 bi com relação ao comprometimento de gastos no ciclo.
Efeitos a olho nu
Neste roteiro dos “oceanos de
plásticos” não é necessário esperar mais algumas décadas, já existem cenas
atuais que sinalizam a gravidade do problema. No Golfo de Omã, por exemplo, os
cientistas descobriram em 2018 uma zona morta asfixiada por todos os tipos de
poluição, incluindo o plástico. No Oceano Pacífico, entre a costa Oeste dos EUA
e o Havaí, existe uma zona conhecida como continente de plástico com mais de 80
mil toneladas de resíduos, segundo a Scientific Reports, com tamanho
proporcional a um pouco mais do estado do Amazonas. Estima-se que mais de 800
espécies oceânicas e costeiras são diretamente afetadas, segundo a ONU. O custo
estimado da poluição originada pelos detritos marinhos é de US$ 13 bilhões.
Para intensificar a gravidade, estudo coordenado pelo
médico Philipp Schwabl, da Universidade de Medicina de Viena em parceria com a
Agência Ambiental da Áustria revela que podemos estar contaminados com os
microplásticos (aqueles com menos de 5 milímetros). Este tipo está presente em
roupas sintéticas a escovas de dente. O comprometimento deste material já
pesquisado também em animais chega ao intestino como também provoca estresse
hepático. São confundidos com plânctons, que está na base alimentar nos
ecossistemas marinhos.
Por que não ouvimos os
apelos dos oceanos? Talvez porque não saibamos e reconheçamos sua importância
como fornecedor de 60% dos serviços ecossistêmicos e para o controle da pressão
cada vez maior dos Gases de Efeito Estufa (GEEs) que contribuem para o
Aquecimento Global e para o avanço das mudanças climáticas, ao absorver 93% do
calor aprisionado por estes gases. Será que vai suportar exercer este papel até
quando? De acordo com pesquisa publicada na Science, os oceanos estão cada vez
mais aquecidos. Em miúdos, uma bomba-relógio foi ligada.
Filosofia do meio copo
cheio
Depois de ler os
parágrafos anteriores, você pode pensar – “está tudo perdido”. Seguindo a
filosofia do copo cheio, há mobilizações por todo planeta para reverter esta
situação. Além da Campanha Mares Limpos, existe o movimento mundial Let´s do It
(Limpa Brasil, aqui no país) e do Ecosurf. A União Europeia
proibirá o uso de alguns tipos de plásticos, a partir de 2021; um grupo de
pesquisadores da Universidade de Portsmouth, no Reino Unido, criaram uma enzima
mutante (ainda em estudo) que tem a capacidade de “comer” o plástico de Garrafas
PET.
O jovem holandês Boyan Slat, da
The Ocean Cleanup, é idealizador do Sistema 001, chamado também de serpente
gigante. A iniciativa consiste em uma barreira com 600 metros de comprimento
destinada à limpeza de plásticos. Em setembro passado, foi utilizada na baía de
São Francisco, nos EUA.
Fazendo uma retrospectiva, no
ano de 2013, a empresa CBPAK e pesquisadores da Escola Politécnica da
Universidade de São Paulo (POLI/USP) criaram um filme plástico biodegradável de
amido de mandioca e açúcares. Em 2018, estava em execução a elaboração do Plano
Nacional de Combate ao Lixo no Mar, que agora depende da condução da atual
gestão do Ministério do Meio Ambiente (MMA).
Alguns municípios brasileiros estão proibindo a distribuição de
canudos em comércios. Entre eles, Rio de Janeiro (RJ, Cataguases (MG); em 2019,
Santos (SP). Ao mesmo tempo, novas tecnologias estão sendo criadas, como
canudos comestíveis, de material lavável e reutilizável, sacolas biodegradáveis
já há alguns anos, entre outras. Grandes comércios estão substituindo os
plásticos por caixas ou com a opção de sacolas retornáveis.
E como começar? Nada mais
eficaz do que as medidas caseiras, que qualquer um de nós pode ter, partindo da
redução de consumo de plásticos na rotina doméstica e da racionalização no
descarte preferencialmente com a separação (onde há coleta seletiva e/ou
cooperativas). E que 2050 chegue e possamos contar que há peixes e um vasto
ecossistema oceânico, não é? (ecodebate)
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