“Ainda crescendo em torno de 80
milhões pessoas por ano, ou mais de 200.000 por dia, a população mundial
precisa ser estabilizada e, idealmente, reduzida gradualmente”.
Alerta dos cientistas mundiais sobre a emergência
climática (05/11/2019)
Mais
de 11 mil cientistas de todo o mundo, de maneira reiterada, alertam a
humanidade sobre a ameaça de uma iminente catástrofe ambiental e declararam que
o Planeta está enfrentando uma emergência climática. O manifesto diz que os
cientistas têm uma obrigação moral de alertar claramente a humanidade sobre uma
possível ameaça catastrófica que pode provocar “sofrimento humano incalculável”.
Exatamente
40 anos antes, cientistas de 50 nações se reuniram na Primeira Conferência
Mundial do Clima (em Genebra, 1979) e mostraram que as tendências alarmantes
sobre as mudanças climáticas necessitavam de uma ação urgente. Desde então,
alarmes semelhantes foram feitos durante a Cúpula do Rio de 1992, o Protocolo
de Kyoto de 1997 e o Acordo de Paris de 2015, além de dezenas de outras
assembleias globais. No entanto, as emissões de gases de efeito estufa (GEE)
continuam aumentando rapidamente, com efeitos cada vez mais prejudiciais ao
clima da Terra.
O
alerta, publicado em 05/11/2019 na Revista BioScience (ver link abaixo),
apresenta um conjunto de sinais vitais mostrando como o aumento das emissões de
CO2, decorrentes do crescimento das atividades antrópicas, está
vinculado com o aumento da temperatura do Planeta. Um dos “sinais vitais”
apresentados é o crescimento da população (e da economia).
De
fato, os gráficos abaixo não deixam dúvida sobre a correlação existente entre o
crescimento demoeconômico global e o aumento das emissões de CO2. O
primeiro gráfico apresenta a variação da população mundial e as emissões
globais de CO2 entre 1880 e 2016. Há uma clara associação entre o
ritmo de crescimento das duas curvas, mas com as emissões avançando com maior
velocidade.
Nota-se
que a população humana, que estava em 1,15 bilhão em 1880, chegou a 2 bilhões
de habitantes por volta de 1930, atingiu 3 bilhões em 1960 e 4 bilhões em 1974.
O ritmo de crescimento demográfico reduziu um pouco nos anos seguintes, mas
manteve acréscimos de 1 bilhão de pessoas a cada 12 ou 13 anos e deve alcançar
8 bilhões de habitantes em 2023. As emissões globais de CO2 que
estavam abaixo de 1 tonelada em 1880, chegou a 2 bilhões em 1900, a 4,5 bilhões
depois da Segunda Guerra e, durante os chamados “30 anos dourados” deu um salto
para quase 20 bilhões de toneladas em 1980. Houve certa desaceleração até o ano
2000, com 24,8 bilhões de toneladas e acelerou novamente durante o superciclo
das commodities até atingir 36 bilhões de toneladas em 2016. Entre 1880 e 2016
a população mundial foi multiplicada por 6,4 vezes e as emissões 41,3 vezes.
O
gráfico abaixo mostra a correlação entre as duas variáveis. A reta de tendência
linear indica que 98,8% da variabilidade das emissões globais de CO2
está associada diretamente ao aumento do número de habitantes, ao longo dos
anos de 1880 e 2016. Durante os séculos XIX e XX as emissões de CO2
foram lideradas pelos países desenvolvidos, especialmente Estados Unidos e
Canadá, Europa, Japão e Austrália. Mas com o processo de convergência da renda
global, os países em desenvolvimento, particularmente China, Índia, os Tigres
Asiáticos e os países do Oriente Médio passaram a liderar a quantidade de
poluição atmosférica. Por exemplo, desde o início do atual século, os 5 países
do BRICS já emitem mais CO2 do que os 36 países da OCDE. Os 3 países
mais populosos (China, Índia e EUA) são também os 3 maiores poluidores (Alves,
23/10/2019).
Evidentemente,
o crescimento da população afeta as emissões de CO2 quanto maior for
o padrão de consumo das pessoas e quanto maior o crescimento da economia. Ou
seja, as emissões aumentam com o crescimento demoeconômico.
O
gráfico abaixo mostra que o aumento das emissões acompanha o crescimento da
produção de bens e serviços. O Produto Interno Bruto (PIB) global era, em 1880,
de cerca de 2 trilhões de dólares em poder de paridade de compra (ppp), segundo
os dados do Projeto Maddison, e passou para pouco mais de US$ 8 trilhões, em
1945, um crescimento médio anual de pouco mais de 2% ao ano. Mas entre 1945 e
1980 o PIB mundial passou para US$ 36 trilhões, com um crescimento médio anual
acima de 4%. Este foi o período de maior emissão de CO2. Entre 1980
e 2016, o PIB global desacelerou um pouco (assim como a população), mas
ultrapassou a casa de 100 trilhões de dólares (em ppp) em 2016, com um
crescimento médio em torno de 3% ao ano.
A
correlação entre o crescimento da economia e a emissão de carbono é também
altamente significativa. O gráfico abaixo mostra que a reta de tendência linear
entre as duas variáveis, indica que significativos 96,3% da variabilidade da
emissão global de CO2 está associada diretamente ao crescimento da
economia mundial ao longo dos anos de 1880 e 2016. Também se pode observar que
as emissões, em relação ao PIB, eram maiores na época do petróleo barato e que,
nas últimas décadas, as emissões reduziram o ritmo em relação ao crescimento do
PIB.
Entre
1880 e 2016, a população mundial cresceu 6,4 vezes, as emissões de CO2
cresceram 41,3 vezes e o PIB cresceu 55 vezes. As emissões cresceram mais
rápido do que a população, mas em ritmo menor do que a economia. Mas a
associação entre o crescimento demoeconômico e a liberação de gases de efeito
estufa é irrefutável.
Desta
forma, não dá para ignorar que o crescimento da população – especialmente
daquelas parcelas e países que mais avançam da ampliação e na diversificação do
consumo – tem um impacto muito grande na emissão de carbono e,
consequentemente, no agravamento da crise climática e ambiental. Portanto, é
necessário um imenso para mitigar o aquecimento global e para evitar
sofrimentos incalculáveis para a vida na Terra devido à crise climática.
Somente os “céticos da demografia” podem afirmar que o volume da população não
agrava os problemas do meio ambiente.
Porém,
ao contrário, há muitos demógrafos que se preocupam com o crescimento
populacional. Segundo a demógrafa Hania Zlotnik (2009), a redução do ritmo de
crescimento da população mundial pode contribuir para mitigar a crise
ambiental. Ela diz: “Existe ampla experiência para mostrar que, com o
comprometimento do governo, estratégias e ferramentas para garantir que as
pessoas possam exercitar seus direitos reprodutivos efetivamente pode produzir
as tendências populacionais que, no médio e longo prazo, contribuem para
garantir a sustentabilidade da vida no planeta. Dados os enormes desafios que a
conquista da sustentabilidade impõe, não há tempo a perder”.
Assim,
o documento “World Scientists’ Warning of a Climate Emergency” (BioScience,
05/11/2019) afirma que: “O crescimento econômico e populacional está entre os
mais importantes fatores do aumento das emissões de CO2 em
decorrência da combustão de combustíveis fósseis”. Em consequência, diz o
seguinte sobre a questão demográfica: “Ainda crescendo em torno de 80 milhões
pessoas por ano, ou mais de 200.000 por dia, a população mundial precisa ser
estabilizada – e, idealmente, reduzida gradualmente – dentro de uma estrutura
que garante a integridade social” (Bongaarts e O’Neill 2018)”.
Em
síntese, a humanidade está provocando grandes danos aos ecossistemas e ao clima
e está caminhando rumo a um abismo. Como diria Cartola: “abismo que cavaste com
teus pés”. Os cientistas alertam que é preciso reverter os rumos da civilização
com urgência. São muitas as tarefas a serem implementadas para evitar uma
catástrofe. Mudar o padrão de produção e consumo é a tarefa principal. Mas não
dá para ignorar que reduzir e depois reverter o crescimento populacional faz
parte das medidas para mitigar o aquecimento global e a perda de
biodiversidade, evitando um holocausto biológico.
Abaixo
segue (em tradução livre) as recomendações apresentadas no Alerta dos
cientistas mundiais sobre a emergência climática:
“Para garantir um futuro sustentável, precisamos mudar a maneira
como vivemos, de maneira a melhorar os sinais vitais resumidos em nossos
gráficos. O crescimento econômico e populacional estão entre os fatores mais
importantes para o aumento das emissões de CO2 provenientes da
combustão de combustíveis fósseis; portanto, precisamos de transformações
ousadas e drásticas em relação às políticas econômicas e populacionais.
Sugerimos seis etapas críticas e inter-relacionadas (em nenhuma ordem
específica) que governos, empresas e o resto da humanidade podem tomar para
diminuir os piores efeitos das mudanças climáticas. Essas são etapas
importantes, mas não são as únicas ações necessárias ou possíveis:
Energia
O
mundo deve implementar rapidamente práticas maciças de eficiência e conservação
de energia e deve substituir os combustíveis fósseis por fontes renováveis de
baixo carbono e outras fontes de energia mais limpas e seguras para as pessoas
e o meio ambiente. Devemos deixar os estoques remanescentes de combustíveis
fósseis no solo e devemos buscar, progressivamente, as emissões negativas
usando tecnologias efetivas para sequestro de carbono e, principalmente,
aprimorando os sistemas de captura naturais. Os países mais ricos precisam
apoiar os países mais pobres na transição para o abandono dos combustíveis
fósseis. Devemos eliminar rapidamente os subsídios aos combustíveis fósseis e
usar políticas eficazes e justas para aumentar constantemente os preços do
carbono para restringir seu uso.
Poluentes de vida curta
Precisamos
reduzir rapidamente as emissões de poluentes climáticos de curta duração,
incluindo metano, carbono preto (fuligem) e hidrofluorcarbonetos (HFCs). Isso
pode retardar os ciclos de feedback climático e potencialmente reduzir a
tendência de aquecimento de curto prazo em mais de 50% nas próximas décadas,
salvando milhões de vidas e aumentando o rendimento das culturas devido à
redução da poluição do ar.
Natureza
Devemos
proteger e restaurar os ecossistemas da Terra, tais como fitoplânctons, recifes
de coral, florestas, savanas, pradarias, pântanos, turfeiras, solos, manguezais
e gramíneas marinhas que contribuem muito para o sequestro de CO2
atmosférico. Plantas marinhas e terrestres, animais e micro-organismos desempenham
papéis significativos no ciclo e armazenamento de carbono e nutrientes.
Precisamos reduzir rapidamente a perda de habitat e biodiversidade, protegendo
as florestas primárias, especialmente aquelas com reservas de alto carbono e
outras florestas com capacidade de sequestrar rapidamente o carbono, ao mesmo
tempo em que aumentamos o reflorestamento e a arborização em grande escala.
Embora a terra disponível possa ser limitadora em alguns lugares, até um terço
das reduções de emissões necessárias até 2030 para o acordo de Paris poderiam
ser obtidas com essas soluções climáticas naturais.
Alimento
Comer
principalmente alimentos à base de plantas e reduzir o consumo global de
produtos de origem animal, especialmente gado ruminante, pode melhorar a saúde
humana e reduzir significativamente as emissões de GEE. Além disso, isso
liberará áreas de cultivo para o cultivo de plantas humanas tão necessárias em
vez de alimentos para animais, ao mesmo tempo em que libera algumas pastagens
para apoiar soluções climáticas naturais. Práticas de cultivo como lavoura
mínima que aumentam o carbono do solo são de vital importância. Precisamos
reduzir drasticamente a enorme quantidade de desperdício de alimentos em todo o
mundo.
Economia
A
extração excessiva de materiais e a super-exploração de ecossistemas,
impulsionadas pelo crescimento econômico, devem ser rapidamente reduzidas para
manter a sustentabilidade em longo prazo da biosfera. Precisamos de uma
economia livre de carbono que aborde explicitamente a dependência humana da
biosfera e políticas que orientem as decisões econômicas de acordo. Nossas
metas precisam mudar do crescimento do PIB e da busca de riqueza em direção a
sustentar ecossistemas e melhorar o bem-estar humano, priorizando as
necessidades básicas e reduzindo as desigualdades.
População
Ainda
crescendo em torno de 80 milhões pessoas por ano, ou mais de 200.000 por dia, a
população mundial precisa ser estabilizada – e, idealmente, reduzida
gradualmente – dentro de uma estrutura que garante a integridade social.
Existem políticas comprovadas e eficazes que fortalecem os direitos humanos
enquanto diminui as taxas de fecundidade e diminui os impactos do crescimento
populacional sobre as emissões de gases de efeito estufa (GEE) e sobre a perda
de biodiversidade. Estas políticas devem tornar os serviços de planejamento
familiar disponíveis para todas as pessoas, removendo barreiras ao seu acesso e
buscando alcançar equidade total de gênero, inclusive estabelecendo o ensino
primário e secundário como uma norma para todas as pessoas, especialmente
meninas e mulheres jovens”. (ecodebate)
Nenhum comentário:
Postar um comentário