A
redução da ambição climática do Brasil chegou aos tribunais. Numa ação sem
precedentes no país, 6 jovens impetraram em 13/4/21, na Justiça Federal de São
Paulo, um pedido para que a meta brasileira no Acordo de Paris, apresentada no
fim do ano passado, seja anulada. O documento do governo, segundo eles, viola o
tratado do clima. A ação é apoiada por oito ex-ministros do Meio Ambiente.
Os
jovens, integrantes do Engajamundo e do Fridays For Future Brasil, querem que o
ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, o ex-ministro Ernesto Araújo e a
União sejam responsabilizados pela “pedalada” climática. Trata-se do truque
contábil na NDC, a meta brasileira no Acordo de Paris, que permitirá ao Brasil
aumentar suas emissões de gases de efeito estufa em 400 milhões de toneladas em
2030 em relação ao que havia sido estimado anteriormente.
A NDC
do Brasil foi apresentada originalmente em 2015, poucos meses antes da
conferência do clima de Paris, a COP21, que adotou o acordo. Por ela, o país se
propunha a reduzir suas emissões em 37% em 2025 em relação aos níveis de 2005.
Para 2030, o Brasil propôs uma meta indicativa de 43% de redução. Segundo o
documento, esses níveis de redução eram “consistentes” com emissões líquidas de
1,3 bilhão de toneladas de gás carbônico equivalente (CO2e) em 2025
e 1,2 bilhão de toneladas em 2030.
Em 09/12/20 o governo brasileiro atualizou e substituiu a NDC. O novo compromisso confirma a meta indicativa para 2030. Só que apresenta um novo cálculo de emissões para o ano-base, o que eleva as emissões líquidas para 1,76 bilhão de toneladas em 2025 e 1,6 bilhão em 2030.
“O Brasil consegue, assim, a proeza de ter uma meta menos ambiciosa do que a anterior. Isso é uma flagrante violação do Acordo de Paris, que só admite aumento no nível de ambição das NDCs, nunca uma redução”, diz Txai Bandeira Suruí, do Engajamundo. Ela é uma das proponentes da ação, juntamente com Paloma Costa, Paulo Ricardo Santos e Thalita Silva e Silva, também do Engajamundo, e Marcelo Rocha e Daniel Holanda, do Fridays for Future Brasil.
A
“pedalada” fez com que a meta brasileira sofresse um inédito rebaixamento — de
“insuficiente” para “altamente insuficiente” — pelo consórcio internacional
Climate Action Tracker, e motivou uma carta igualmente inédita de uma rede
internacional de 1.300 ONGs para a Convenção do Clima da ONU, pedindo que ela
não fosse acolhida.
“Não
tem outra forma de intervir sobre essas políticas públicas que põem em risco
nosso futuro e nos deixam mais longe de cumprir as metas do Acordo de Paris,
que já são pequenas”, diz Marcelo Rocha. “A pedalada climática feita por este
governo é uma ameaça não apenas para os jovens brasileiros, mas para todo o
planeta.”
A NDC
brasileira submetida em dezembro do ano passado também abre um precedente
internacional perigoso. Se outros países seguirem o exemplo do Brasil e
passarem a fazer contabilidade criativa nas suas metas, o mundo jamais
conseguirá atingir o objetivo do Acordo de Paris de limitar o aquecimento
global a 1,5°C neste século.
Além disso, o documento compromete ainda mais a credibilidade internacional do Brasil na área ambiental, atrapalhando a ratificação do acordo comercial UE-Mercosul e travando o ingresso do país na OCDE/Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico. Por isso os jovens também entraram com um pedido de liminar para que ela tenha seus efeitos imediatamente suspensos.
O pleito dos jovens foi apoiado numa carta por 8 ex-ministros do Meio Ambiente: Carlos Minc, Edson Duarte, Gustavo Krause, Izabella Teixeira, José Carlos Carvalho, Marina Silva, Rubens Ricupero, Sarney Filho. “Contrariando o texto do Acordo de Paris, a nossa Constituição Federal e nossa legislação, o governo brasileiro, por meio de um artifício contábil, concretizou um retrocesso em sua ambição climática apresentada junto ao secretariado da Convenção do Clima. Essa colisão com as determinações do Acordo trará sérias consequências negativas para o Brasil”, afirmam os ex-ministros. “Nesse quadro, manifestamos nosso total apoio à ação popular apresentada pelos seis jovens ativistas climáticos”. (ecodebate)
Nenhum comentário:
Postar um comentário