Desde a década de 1970 o
mundo vive em déficit ambiental e utiliza mais recursos naturais do que a
capacidade de regeneração do meio ambiente. O mundo também já ultrapassou 4 das
9 Fronteira Planetárias. Portanto, a degradação ecológica aumenta e o modelo
atual de produção e consumo se torna a cada dia mais e mais insustentável.
Estamos num mundo
antropicamente cheio, como mostrou Herman Daly. Para atingir o Estado
Estacionário é preciso reduzir o tamanho da economia internacional. Daly mostra
que o crescimento econômico está ficando deseconômico e a natureza degradada já
não fornece tantos serviços ecossistêmicos (Alves, 03/06/2016). Resta saber
como fazer o decrescimento.
Se houver redução do PIB e
manutenção do volume da população haverá redução da renda per capita e as
pessoas, em média, ficarão mais pobres. Decrescer apenas a população exigiria
uma redução muito forte para equilibrar a Pegada Ecológica com a Biocapacidade,
que seria inviável na prática. Mas existe um caminho que o mundo pode trilhar
no sentido de promover um decrescimento demoeconômico com prosperidade
econômica e social e com sustentabilidade ambiental. Vamos dar um exemplo
simples, a partir de uma base real, mas que encontra muitas resistências entre
os ideólogos populacionistas e desenvolvimentistas.
O mesmo exercício poderia ser
feito com o decrescimento demoeconômico começando em 2030 ou 2040, etc. O
exemplo é apenas para mostrar que poderia haver crescimento da renda per capita
com redução simultânea dos fatores que causam degradação ambiental.
Mas evidentemente somente
esta queda do PIB é pequena para eliminar o déficit ambiental que é da ordem de
70% atualmente e também é necessário reduzir o déficit social e eliminar a pobreza
e a fome no mundo. Por conseguinte, além do aumento da renda per capita é
preciso reduzir a concentração de renda. Se for estabelecido um sistema
tributário progressivo que favoreça as parcelas mais pobres da população,
teríamos uma sociedade mais igualitária em termos de renda, ao mesmo tempo em
que poderíamos acabar com a fome e a pobreza.
Em relação ao meio ambiente
uma queda de 7,4% no PIB seria pequena e insuficiente para eliminar o déficit
ecológico. Assim medidas adicionais seriam necessárias, principalmente no
sentido de restaurar os ecossistemas e descarbonizar a economia, pois a emissão
de CO2 é a principal parcela da pegada ecológica. Desta forma, seria
necessário adicionar medidas tais como:
1. Fazer uma transição da matriz energética até a eliminação do
uso dos combustíveis fósseis e avançando na produção de energias renováveis e
mais limpas, com baixa emissão de carbono;
2. Fazer uma transição na indústria automobilística dos carros com
motor de combustão interna, para veículos elétricos e carros compartilhados e
transporte coletivo;
3. Transição de uma dieta cárnea para uma dieta vegetariana ou
vegana e de uma agricultura baseada em fertilizantes químicos e agrotóxicos
para uma agricultura orgânica;
4. Transição do consumismo para a simplicidade voluntária e
transição da concentração de renda para uma sociedade mais equitativa, com
redução do volume de consumo conspícuo e de bens de luxo e investimento em bens
e serviços que permitam a universalização do bem-estar, a economia solidária e
colaborativa;
5. Transição da degradação para a restauração ecológica, com
aumento das áreas verdes e ampliação do plantio de árvores como forma de
sequestrar carbono e permitir a recuperação da biodiversidade e o incremento do
bem-estar ecológico;
Reduzindo as desigualdades
sociais e a violência, o Brasil poderia investir mais na saúde, na educação e
no pleno emprego com trabalho decente. O país poderia ter mais sustentabilidade
social e ambiental, tornando a vida mais viável e mais feliz no Planeta. A Costa
Rica, por exemplo, eliminou o exército e transformou os quartéis em escolas e o
financiamento bélico em financiamento ecológico.
O mundo precisa de mais
árvores e menos gente (Alves, 02/10/2019). Estudo publicado na Revista Science
(Bastin et. al. 05/07/2019), restaurar as florestas do mundo em uma escala sem
precedentes é a melhor solução mitigar os efeitos das mudanças climáticas. Os
pesquisadores afirmam que a cobertura de 900 milhões de hectares de terra –
aproximadamente o tamanho dos EUA – com árvores, poderia armazenar até 205
bilhões de toneladas de carbono, cerca de dois terços do carbono que os seres
humanos já colocaram na atmosfera. Ou seja, uma catástrofe climática poderia
ser evitada se em vez de desmatar houvesse reflorestamento global.
A continuidade do
desmatamento pode gerar sérias consequências. Dois físicos teóricos
especializados em sistemas complexos concluíram recentemente que o desmatamento
global devido às atividades humanas está a caminho de desencadear o “colapso
irreversível” da civilização humana nas próximas duas a quatro décadas
(Robitzski, 28/07/2020).
A economia mundial precisa
perder sua obsessão pelo crescimento e perceber que a humanidade já ultrapassou
os limites da resiliência do Planeta. As atividades antrópicas já ultrapassaram
4 das 9 fronteiras planetárias, sendo que duas delas, a Mudança climática e a
Integridade da biosfera, são o que os cientistas chamam de “limites
fundamentais” e tem o potencial para conduzir o Sistema Terra a um novo estado
que pode ser substancialmente e persistentemente transgredido. O agravamento
destas duas fronteiras fundamentais pode levar a civilização ao colapso e a uma
“Terra inabitável” (Alves, 2019).
Matéria de Asher Moses, em Voices of Action (05/06/2020) mostra que o “Colapso da Civilização” é um resultado cada vez mais provável. Entrevistando o professor emérito da Universidade Nacional Australiana, Will Steffen, a matéria mostra que já estamos profundamente envolvidos na trajetória rumo ao colapso da civilização, o que já pode ser inevitável, porque 9 dos 15 pontos de inflexão climática conhecidos no mundo que regulam o estado do planeta foram ativados (figura abaixo). Há uma possibilidade de termos desencadeado “efeitos cascatas” que nos levariam a um clima menos habitável da “Terra Estufa”, independentemente de reduzirmos as emissões.
Steffen diz que levaria 30 anos na melhor das hipóteses (provavelmente 40-60 anos) para fazer a transição para zero emissão líquida, mas quando se trata de pontos de inflexão, como o gelo do Ártico, já poderíamos ter ficado sem tempo. As evidências mostram que também perderemos o controle dos pontos de inflexão da floresta amazônica, da camada de gelo da Antártica Ocidental e da Groenlândia em muito menos tempo do que nos levará a obter zero emissão líquida. Dado o momento dos sistemas terrestre e humano, e a crescente diferença entre o ‘tempo de reação’ necessário para orientar a humanidade em direção a um futuro mais sustentável, e o ‘tempo de intervenção’ deixado para evitar uma série de catástrofes no clima físico sistema (por exemplo, derretimento do gelo marinho do Ártico) e da biosfera (por exemplo, perda da Grande Barreira de Corais), já estamos aprofundados na trajetória de colapso.
Assim, o decrescimento
demoeconômico tem que começar o mais rápido possível. A redução da população
mundial não é nenhuma tarefa impossível. Pelo contrário, basta que a taxa de
fecundidade total (TFT) fique meio filho (0,5) abaixo da projeção média para
que a população mundial apresente grande redução. A projeção média da ONU
estima uma população global de 10,9 bilhões de habitantes em 2100, com a TFT
caindo dos atuais 2,5 filhos por mulher para 2 filhos por mulher no final do
século. Contudo, se a taxa ficar meio filho menor nos próximos anos, a
população mundial atingiria menos de 7 bilhões de habitantes em 2100.
A crise atual poderia ter sido evitada se o mundo tivesse dado ouvido para os ensinamentos do matemático e economista romeno Nicholas Georgescu-Roegen que, em 1971, com base na segunda Lei da Termodinâmica (Lei da Entropia) mostrou que as matérias e energias entram no processo econômico em um estado de baixa entropia e saem dele em um estado de alta entropia. Por conta disto é impossível manter o crescimento continuado das atividades antrópicas na prevalência do fluxo metabólico entrópico.
Ecologia em defesa da vida.
Se os conselhos fornecidos
pela Economia Ecológica nas décadas de 1960 e 1970 tivessem sido considerados
(Alves, 2019) e se o decrescimento demoeconômico tivesse começado a ser
planejado naquela época estaríamos numa situação bem melhor hoje em dia. Mas,
mesmo com atraso, podemos ter esperança de que com menos gente, com redução do
PIB e com regeneração dos ecossistemas, o mundo ainda poderá ter condições de
evitar um colapso sistêmico global e civilizacional. (ecodebate)
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