Pesquisa
é da Stand Earth e dá apoio à mobilização internacional #SupplyChange contra o
desmatamento do bioma. Modelo Amber Valletta e estilista Francisco Costa são
nomes da moda que apoiam a mobilização. No Brasil, Modefica e Clima Info dão
suporte à ação global.
Estudo
inédito conduzido pela Stand Earth relaciona mais de 150 marcas de moda com o
desmatamento da floresta Amazônica. O produto que liga essa rede: o couro. A
pecuária não só é um dos grandes responsáveis pelas emissões de gases do efeito
estufa (GEEs) no país, como é também o principal motivo de desmatamento no
bioma. Entre nomes levantados, que se associam a esses danos estão: Louis
Vuitton, Dior, Guess, H&M, Nike, Zara, Vans, Tiffany & Co e Tommy
Hilfiger.
A
partir de uma das principais fornecedoras brasileiras, a JBS, a investigação,
que ainda está em curso, resultou em mais de 400 conexões individuais da rede
de suprimento entre diversas empresas, como curtumes brasileiros, processadores
de couro em vários países, fabricantes de produtos e marcas de moda em todo o
mundo. No momento da publicação, o documento já conecta mais de 100 marcas.
Cerca de 80% do couro bovino produzido no Brasil é exportado para países como:
China e Hong Kong (41.6%), Itália (27.3%), Vietnã (9.6%), Taiwan (5.6%), índia
(3.5%), Estados Unidos (2.5%) e Tailândia (2.2%).
Especializado
em pesquisa de cadeia de custódia, identificando e rastreando matérias-primas
na medida em que se movem por redes produtivas complexas, o Stand.Earth
rastreia a destruição ambiental e as violações de direitos humanos relacionados
à produção de diversos produtos.
O
grupo analisou quase 500 mil listas de documentos alfandegários obtidos de
cruzamento de dados coletados de diversas fontes, como: dados da alfândega
brasileira, vietnamita, chinesa, indiana, paquistanesa; dados estatísticos –
como Comex Stat -; sites de processadores de couro; relatórios anuais
(principalmente em chinês); apresentações para investidores e relatórios de
ESG; postagem em mídias sociais de processadores de couro; lista de divulgação
aberta de fornecedores de marcas de moda; o banco de dados Internet Archive e
banco de dados de SRG feito sob medida entre matriz, subsidiária e marca.
A revelação dos dados acontece na mesma semana de lançamento do Índice de Transparência da Moda Brasil (ITMB). Elaborado pelo Fashion Revolution CIC e Instituto Fashion Revolution Brasil, o índice revela que 0% das marcas analisadas no país possuem compromissos públicos com o desmatamento zero.
Curtume e desmatamento
A
indústria pecuária é o maior impulsionador do desmatamento da floresta
amazônica e das florestas tropicais em todo o mundo. O desmatamento causado pela
pecuária na Amazônia é responsável por quase 2% das emissões globais de CO2
anualmente, o equivalente às emissões de todos os voos de avião em todo o
mundo. Vale lembrar que a indústria da moda emite 2,1 bilhões de toneladas de
GEEs anualmente – 4% das emissões globais que podem ser volumes maiores, tendo
em vista a dificuldade em rastrear sua rede, como vemos por aqui.
O
Brasil possui o maior rebanho bovino do mundo, com cerca de 215 milhões de
animais – o valor supera o da população em 3 milhões. A indústria do couro é
lucrativa para os frigoríficos: em 2020, o setor correspondeu a US$ 1,1 bilhão
(R$ 6,16 bilhões), ou 18% do lucro total.
O
Stand.Earth também afirma que inúmeros estudos e investigações têm demonstrado
de forma consistente que a JBS, a maior empresa de carne bovina e couro no
Brasil, é também a maior contribuinte para a destruição da floresta amazônica.
A análise dos documentos se concentrou no rastreamento do couro exportado pela
multinacional, começando com cliente da primeira linha, ou seja, processadores
de couro. A análise também mapeou exportações de couro de todos os seis maiores
exportadores (excluindo empresas de logística) para esses mesmos processadores.
A
rede produtiva da JBS foi exposta a mais de 3 milhões de hectares de desmatamento
na última década. Dados de satélite divulgados pela Anistia Internacional ligam
a empresa a 91 mil hectares de desmatamento na floresta amazônica entre março
de 2019 a março de 2021 – dos quais 81% eram possivelmente ilegais. O grupo
ainda afirma que “a quantidade total de desmatamento associado à JBS sobre esse
período de tempo é provavelmente muito maior”. A ilegalidade, aliás, tem sido
frequentemente associada à multinacional.
Exemplos
de áreas protegidas invadidas pelo gado ilegal fornecido à JBS incluem: a
reservas extrativistas do Rio Ouro Preto e Rio Jaci-Paraná e o território
indígena Uru-Eu-Wau-Wau, todas localidades no estado de Rondônia. A reserva do
Rio Jaci-Paraná, aliás, passou por grande perda recentemente: junto com o
Parque Estadual Guajará-Mirim, a área perdeu cerca de 90% de sua proteção,
totalizando menos 219 mil hectares de proteção ambiental. Esse valor equivale
às cidades de São Paulo e Salvador juntas.
A
Lei Complementar nº 1.089/2021 foi financiada pela atividade pecuária: segundo
apuração da Repórter Brasil, 11 dos 25 deputados estaduais que aprovaram o
projeto são pecuaristas ou foram financiados por criadores de gado. A redução
da área beneficia a atividade, tendo em vista que existem aproximadamente 120
mil cabeças de gado na reserva Jaci-Paraná. A reportagem ainda apurou que seis
deputados estaduais receberam doações de pecuaristas na sua última campanha
eleitoral, sendo eles: Alex Redano (DEM), Cássia das Muletas (Podemos), Geraldo
da Rondônia (PSC), Johny da Paixão (PRB), Lebrão (MDB) e Luizinho da Fetagro
(PT). Luizinho da Fetagro também está no grupo de pecuaristas políticos, junto
de: Adelino Follador (DEM), Edson Martins (MDB), Ezequiel Neiva (PTB), Luizinho
Goebbel (PV) e Laerte Gomes (PSDB).
O
Stand.Earth conclui que todas as empresas que compram diretamente ou
indiretamente da JBS por meio de processadores de couro estão sob risco muito
alto de estarem associadas ao desmatamento na floresta amazônica e, logo, ao
seu colapso. Além disso, o estudo aponta que, embora a JBS seja a maior
exportadora de couro no Brasil e objeto da pesquisa, o problema é endêmico para
toda a indústria do couro brasileira. Isso inclui outras empresas de curtumes,
como Minerva e Fuga Couros.
Em entrevista ao The Guardian sobre o relatório, a liderança Sônia Guajajara fala sobre a importância das marcas zerarem o desmatamento em suas redes produtivas. As marcas têm “a responsabilidade moral, a influência e os recursos econômicos” necessários.
Nomes aos bois
As
186 marcas são divididas em “conexão única” e “conexões múltiplas”, sendo as da
segunda lista com maior risco de estarem associadas ao desmatamento na
Amazônia. Dentre todas, apenas 20 marcas (10.7%) possuem alguma política sobre
obter couro proveniente do desmatamento, e apenas 15 (5%) proíbem
explicitamente a compra de couro provindo da Amazônia. As empresas que possuem
ambas políticas são maioria no grupo de conexões múltiplas, como Adidas,
H&M e VF Corp – cuja marca Vans tem suas operações brasileiras controladas
pela Arezzo.
A
ligação da Vans com o desmatamento acontece, inclusive, no meio da nova
campanha de sustentabilidade da marca. Anunciada diretamente da Califórnia, a
incorporação de uma “abordagem mais sustentável” dos clássicos da marca veio
por meio da implementação da borracha natural e tinta à base de água nos
calçados da linha.
No
grupo de marcas com conexão única estão 53 nomes, como: Alexander Wang, Giorgio
Armani, Decathlon, Cartier Target e Walmart. Já no grupo com conexões
múltiplas, estão 133 marcas, como: Adidas, Reebok, Michael Kors, Jimmy Choo,
Versace, Guess, H&M, Zara, Louis Vuitton, Fendi, Dior, Givenchy, Tiffany
& Co, Lacoste, Prada, Miu Miu, Nike, Puma, Calvin Klein, Tommy Hilfiger,
The Gap, Banana Republic, The North Face, Supreme, Timberland, Kipling.
A partir do relatório, organização europeia The Slow Factory está articulando uma mobilização internacional para pressionar marcas e lideranças políticas a trabalharem pelo fim do desmatamento da Amazônia. No Brasil, Modefica e Clima Info dão suporte à ação global.
Vigente de 2020 a 2023, o Plano Nacional para Controle do Desmatamento Ilegal e Recuperação da Vegetação Nativa prevê a redução contínua do desmatamento e a recuperação da vegetação nativa na região da Amazônia Legal. (ecodebate)
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