Passado
um ano da chamada “crise da geosmina”, substância orgânica produzida por algas
que provoca mau cheiro e gosto ruim na água fornecida pela Companhia de Águas e
Esgotos do Estado do Rio de Janeiro (Cedae), a população da Região
Metropolitana continua sofrendo com a qualidade do abastecimento.
Os
relatos que voltaram a ocorrer desde janeiro renovam a preocupação com a crise
hídrica na Estação de Tratamento de Água (ETA) Guandu, comprometendo o
fornecimento para 11 milhões de habitantes. Para melhorar a qualidade da água,
não apenas em relação à geosmina, especialistas defendem a implantação de
Soluções Baseadas na Natureza (SBN), que também podem gerar economia de recursos
para os cofres públicos.
A
restauração do solo da Bacia Hidrográfica do Rio Guandu, por exemplo, faria com
que menos sedimentos fossem depositados nas águas e, consequentemente, com que
o poder público economizasse em gastos em dragagem dos reservatórios e
aquisição de produtos químicos para tratamento. A melhoria na qualidade da água
proporcionada pela infraestrutura natural pouparia aos cofres públicos R$ 156
milhões em 30 anos.
De
acordo com estudo realizado pela World Resources Institute (WRI), em parceria
com a Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza e outras organizações, em
2018, a degradação da paisagem e a derrubada da vegetação nativa na bacia do
Guandu ao longo dos anos agravaram a erosão do solo e aumentaram o carregamento
de sedimentos para os cursos d’água, o que gerou maior poluição e turbidez nas
águas.
Para
se ter ideia do que isso representa, a Cedae usa, por dia, cerca de 140
toneladas de sulfato de alumínio, 30 toneladas de cloreto férrico e 15
toneladas de cloro, entre outras substâncias, para o tratamento das águas do
Guandu.
A
ETA Guandu, considerada a maior estação de tratamento de água do mundo,
processa 92% da água consumida pelas mais de 11 milhões de pessoas que vivem
nos 22 municípios da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, com capacidade
para 3,7 bilhões de litros de água por dia.
Para atender à demanda em 2030, a bacia do Guandu deverá aumentar a oferta de água tratada para abastecimento público entre 17% e 58%, segundo o estudo. Essa variação responde essencialmente à combinação de crescimento da renda real per capita e à capacidade de diminuição das perdas do sistema. No cenário considerado factível pelo Plano Estadual de Recursos Hídricos – com índices de perdas e crescimento econômicos intermediários entre extremos otimistas e tendenciais –, o Guandu deverá ampliar sua oferta em 28% daqui dez anos.
Cidades baseadas na natureza
“É
aí que entra a infraestrutura natural. Cidades inteligentes e baseadas na
natureza usam serviços ecossistêmicos fornecidos pelo meio ambientes para
complementar ou potencializar estruturas convencionais de infraestrutura
urbana. Na gestão hídrica, uma das principais Soluções Baseadas na Natureza
usada para aperfeiçoar o sistema de abastecimento é a restauração de cobertura vegetal
em pontos estratégicos das bacias hidrográficas”, explica o gerente de Economia
da Biodiversidade da Fundação Grupo Boticário, André Ferretti.
O
estudo “Infraestrutura natural para água no Sistema Guandu, Rio de Janeiro”
estima que a restauração florestal na bacia do Guandu requer um investimento
total de R$ 103 milhões em 14 anos. O cálculo considerou gastos como a compra,
o transporte e o plantio das mudas, a preparação da área, a adubação, a mão de
obra e cercamentos. Levou ainda em consideração despesas incorrida para
identificar, sensibilizar e engajar proprietários de terras nos projetos de
restauração.
Por
meio das SBNs, é possível gerar benefícios como o controle da erosão do solo e
aumento de sua permeabilidade, filtragem de sedimentos, mitigação dos efeitos
de enchentes e estiagens, e regulação do fluxo hídrico. “São serviços que
auxiliam as estruturas convencionais de barragens, reservatórios, muros de
contenção ou estações de tratamento de água”, aponta Ferretti.
Para Cecília Herzog, paisagista urbana, especialista em Preservação Ambiental das Cidades e membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza (RECN), as SBN podem – e devem – estar distribuídas pelas áreas urbanizadas e ao longo de rodovias, de modo a contribuir com a prevenção dos contaminantes levados aos rios pelas chuvas. “Essas soluções atendem a contextos específicos, podendo receber a água em diversas tipologias, tais como biovaletas ao longo de estradas, conectando jardins de chuva, canteiros pluviais, tetos verdes e alagados construídos. A própria estação de tratamento poderia ser atualizada para uma estação de águas baseada na natureza, com jardins filtrantes nas imensas áreas que represam as águas do sistema Guandu”, avalia a especialista.
Outra solução apontada por Cecília é a construção de estações de tratamento de rede de esgoto descentralizadas e de baixo custo.
“Seria
possível aproveitar os 99% de água que o esgoto contém, devolvendo água limpa
para o sistema hídrico, aproveitando o lodo para a produção de adubo e o gás
metano para energia”, salienta. (ecodebate)
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