180 grandes empresas fósseis
contribuíram para dezenas de ondas de calor globais.
Grandes petrolíferas
intensificaram 213 ondas de calor mortais neste século, revela estudo histórico.
Novo estudo publicado na
revista Nature revela que as emissões de 180 grandes empresas de combustíveis
fósseis e cimento foram responsáveis por um em cada seis dias de ondas de calor
entre 2000 e 2023, agravando o problema das mudanças climáticas e aumentando a
intensidade e probabilidade desses eventos extremos. A pesquisa, que analisou a
contribuição das cadeias de valor dessas companhias, também indicou que as 14
maiores empresas do setor são tão impactantes quanto as outras 166 combinadas,
e que este estudo pode fortalecer ações legais contra os poluidores.
Principais descobertas do
estudo:
Impacto em ondas de calor: As emissões dessas 180 empresas contribuíram significativamente para a intensidade e probabilidade de dezenas de ondas de calor globais.
Proporção do impacto: As emissões dessas empresas correspondem a cerca de 50% do aumento da intensidade das ondas de calor neste século.
14 maiores empresas: As 14 maiores empresas do setor têm um impacto equivalente ao das outras 166 somadas, com a ExxonMobil sozinha sendo responsável por ondas de calor que não ocorreriam naturalmente.
Conexão legal: A ligação direta entre as emissões dessas empresas e a intensificação de ondas de calor, evidenciada por este estudo, pode fortalecer a base científica para ações judiciais contra elas em todo o mundo.
Cadeias de valor: A análise levou em consideração as emissões de toda a cadeia de valor das companhias, incluindo o uso final dos produtos pelos clientes.
Exemplos de empresas incluídas: Saudi Aramco ; ExxonMobil ; Shell ; Chevron ; BP ; Petrobras ; Gazprom ; Pemex ; National Iranian Oil Company
Contexto: Este estudo representa um avanço importante na ciência de atribuição do clima, fornecendo uma conexão mais clara e sistemática entre as emissões de empresas específicas e a ocorrência de eventos climáticos extremos como as ondas de calor. As descobertas oferecem um argumento sólido para que as empresas de combustíveis fósseis sejam responsabilizadas pelos danos causados pelas mudanças climáticas, como destacado pelo Center for Climate Integrity.
Um estudo publicado hoje na
revista científica Nature conecta diretamente as emissões das 180 maiores
empresas de combustíveis fósseis — as chamadas carbon majors — a 213 ondas de
calor registradas entre 2000 e 2023, que se tornaram mais prováveis e mais intensas
devido às mudanças climáticas.
Entre elas está o episódio de
fevereiro de 2010, que atingiu Nova Lima (MG), Santos (SP) e Rio de Janeiro
(RJ), com temperaturas acima de 39°C e 32 mortes atribuídas ao calor extremo.
Segundo a pesquisa, sem a influência da mudança climática, o evento teria sido
“virtualmente impossível”.
Além do Brasil, o estudo
destaca casos no Canadá. A onda de calor que atingiu o Quebec, entre junho e
julho de 2018, tornou-se cinco vezes mais provável por causa das emissões
fósseis. No verão de 2021, a onda de calor na Colúmbia Britânica, com
temperaturas até 20°C acima do normal, se tornou o evento climático mais mortal
da história do país, causando 619 mortes.
No conjunto de dados, aparece
o peso de empresas brasileiras. O estudo estima que, em um cenário simulado
onde apenas a Petrobras existisse, 50 das 213 ondas de calor teriam sido
resultado de suas emissões. Para a Vale, seriam 38 episódios, incluindo o de
2010. Embora não tenham causado esses eventos sozinhas, os cenários simulados
mostram que, mesmo se apenas suas emissões existissem, as ondas de calor ainda
ocorreriam — sinal do peso significativo de suas contribuições para a crise
climática global.
“Esta pesquisa é um passo
importante rumo à responsabilização. Ela mostra mais uma vez que mudanças
perigosas em eventos climáticos podem ser diretamente ligadas às emissões de
empresas específicas de combustíveis fósseis”, ressaltou Friederike Otto,
pesquisadora do Centre for Environmental Policy do Imperial College London. “Muitas
dessas carbon majors já sabiam, desde a década de 1970, que a queima de
combustíveis fósseis estava aquecendo o planeta. Em vez de mudar seus modelos
de negócios para energias renováveis, elas enganaram o público sobre os perigos
de seus produtos e fizeram lobby com governos para manter o mundo dependente
dos fósseis”.
Repercussão política e
jurídica
A pesquisa pode ter impacto
relevante na litigância climática. Em julho, a Corte Internacional de Justiça
reconheceu que ações de governos que agravam a crise climática violam o direito
internacional, abrindo caminho para reparações também por parte de empresas.
O Tribunal Superior de Hamm,
na Alemanha, estabeleceu que emissores corporativos de gases de efeito estufa
podem ser responsabilizados por danos climáticos. Nos EUA, estados como Nova
York e Vermont já aprovaram leis de superfund climático para cobrar custos de
adaptação de empresas fósseis, e outros dez estados discutem legislações
semelhantes.
“Agora podemos apontar para
ondas de calor específicas e dizer: ‘A Saudi Aramco fez isso. A ExxonMobil fez
isso. A Shell fez isso’. Quando as emissões dessas empresas, sozinhas, estão
provocando ondas de calor que não teriam acontecido de outra forma”, salientou
Cassidy DiPaola, porta-voz da campanha Make Polluters Pay. “Aqui está a
evidência que os tribunais estavam esperando. Agora podemos dar nome e número a
quem é responsável por esses desastres.
Como o peso das empresas foi
calculado
Os pesquisadores aplicaram,
de forma sistemática, um modelo de atribuição de eventos extremos em todos os
registros de ondas de calor no banco EM-DAT entre 2000 e 2023 – 226 no total,
dos quais 213 foram selecionados. Essa base de dados é a mais abrangente sobre
desastres, mesmo que ainda subnotifique ocorrências em alguns países, sobretudo
na América Latina, incluindo o Brasil. Isso indica que o impacto real pode ser
ainda maior do que o registrado no levantamento.
O estudo combina dados
observacionais (ERA5 e BEST) com modelos de sistemas terrestres, avaliando dois
fatores:
- Mudança na intensidade do
calor (quantos graus mais quentes ficaram os eventos devido à mudança
climática);
- Probabilidade relativa
(quantas vezes mais provável cada onda de calor se tornou em comparação ao
clima pré-industrial).
Os dados de emissões de 180
companhias de petróleo, gás, carvão e cimento foram extraídos de registros de
produção e fatores de emissão, considerando CO₂ e metano. O modelo climático
OSCAR foi usado para estimar o aquecimento global causado por cada empresa
desde 1750, comparando o clima histórico com cenários contrafactuais (sem as
emissões daquela companhia). A metodologia é alinhada às práticas do IPCC e já
foi validada em mais de 100 estudos.
Os resultados mostram que, no
agregado, as carbon majors respondem por 60% de todas as emissões cumulativas
de CO₂ da era industrial, sendo responsáveis por cerca de metade do aquecimento
global.
Entre as 180 companhias
analisadas, as 14 maiores — incluindo Saudi Aramco, ExxonMobil, Shell, Chevron,
BP — têm impacto equivalente ao de todas as outras somadas.
“Todos os gases de efeito estufa causam danos climáticos, e este estudo mostra que as emissões das empresas intensificaram individualmente centenas de ondas de calor pelo mundo”, afirma Rupert Stuart-Smith, do programa de Direito Sustentável da Universidade de Oxford. Richard Wiles, do Center for Climate Integrity, ressalta que a conexão científica entre produtores fósseis e desastres climáticos letais só se fortalece, reforçando a base para ações legais. “Este estudo sugere que a relação de causa e efeito entre as emissões de combustíveis fósseis e as ondas de calor é muito maior do que se compreendia antes”.
Plataforma em operação no Campo de Búzios.
Estudo liga emissões de
petroleiras a ondas de calor pela 1ª vez
Ao menos 213 eventos neste
século não ocorreriam sem o carbono lançado por 180 empresas, que também
respondem por metade do aumento da intensidade desses extremos. (ecodebate)
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