Dia da Desertificação e Seca é a chance de olhar para o Cerrado com a
atenção que merece, reconhecendo as ações que são feitas para conservá-lo.
Criado para lembrar que, infelizmente, algumas regiões do planeta estão
se tornando desertos e para destacar que é possível reverter a degradação da
terra, o Dia da Desertificação e Seca de 2021 acontece em 17 de junho.
Este ano, a ONU decidiu por mais luzes ainda nas soluções para que a
humanidade não perca áreas valiosas para a produção de alimentos e a
conservação da biodiversidade, destacando a restauração, ou seja, as práticas
que transformam terras degradadas em terras saudáveis.
Embora a Caatinga seja mais suscetível à desertificação, esse processo
já afeta áreas do Cerrado, como no Piauí, por exemplo. Nesse caso, a desertificação tem relação com
ações indiscriminadas, geralmente, o manejo da terra sem planejamento e sem
respeitar os ciclos da natureza.
O corte das árvores nativas e o uso descontrolado do fogo, muitas
vezes, para dar lugar à pastagem, por exemplo, favorecem processos erosivos que
resultam em áreas degradadas e subutilizadas tanto para a produção
agropecuária, como para a conservação da biodiversidade.
“Reverter esse processo depende de um novo olhar para o Cerrado, que
reconheça suas riquezas naturais, como: o baru, o pequi, o buriti, o rico mel
das nossas abelhas e tantos outros produtos que podem ajudar a melhorar a vida
das pessoas ao mesmo tempo em que conservam a paisagem”, explica.
Isabel Figueiredo, coordenadora do Programa Cerrado e Caatinga do
Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN) – uma das parceiras do projeto CERES, que
também tem o apoio da União Europeia.
“Proteger o Cerrado é garantir a conservação do berço das águas
brasileiras, das quais dependem tanto o grande como o pequeno produtor, como
também o abastecimento de energia e água de milhares de cidades em todo
Brasil”, completa ela.
Além de ser o berço das águas brasileiras, o Cerrado é um grande
depósito de carbono que, se liberado, agrava a crise climática que já prejudica
a população desse bioma. O projeto também contribuirá com a reabilitação de
pastagens degradadas e com a restauração de vegetação nativa para promoção de
serviços ecossistêmicos. “A reabilitação
de pastagens degradadas aumenta a produtividade dessas áreas e pode gerar
crescimento econômico. Além disso, a restauração de vegetação nativa é por si
só uma cadeia produtiva da sociobiodiversidade que cria empregos e gera renda
no campo, além de ser fundamental para a proteção dos nossos mananciais”,
destaca Ana Carolina Crisostomo, analista de conservação do WWF-Brasil e
facilitadora regional do Projeto Ceres.
“Uma terra que volta a ser produtiva faz com que o produtor não precise abrir novas áreas para sua produção, diminuindo a pressão por mais desmatamento. A recuperação também pode ajudar no cumprimento do Código Florestal com a recomposição de áreas de proteção permanente e de reserva legal”, acrescenta.
A seca no dia a dia
Ginercina de Oliveira Silva, 50 anos, é pedagoga por formação, mas
agricultora familiar por vocação e amor à terra. Casada e mãe de dois filhos,
ela vive há 30 anos no assentamento mais antigo do município de Santa Rita do
Novo Destino, em Goiás. Herdou as terras da mãe e, além de agricultora, atua
ainda como agente comunitária de saúde (ACS).
Próximo do seu assentamento há cinco outros. E todos têm sofrido os
efeitos de secas intensas. “Tivemos uns dois anos de seca muito forte e há uns
três anos temos visto a paisagem mudar muito, assim como as condições da
terra.”
Não foram poucos os pequenos agricultores que tiveram que furar poços
artesianos em busca de água. “O sol está muito mais forte e afeta as
plantações. Os brejos e pequenos rios estão secando e está ficando cada vez
mais difícil o pequeno produtor sobreviver da terra”, desabafa. Ela cita que
até mesmo as árvores do Cerrado estão morrendo ao redor do assentamento e a
erosão só se intensifica. “Há algum tempo, perdemos praticamente toda uma
plantação de gergelim”.
As mulheres da Associação de Mulheres Empreendedoras Rurais e Artesanais (Amera), dos municípios de Barro Alto e Santa Rita do Novo Destino, da qual ela faz parte, se ocupam das pequenas culturas de mandioca, frutas e verduras, além da coleta de baru no Cerrado. A produção, mesmo com a pandemia, é vendida em cestas, por meio de whatsapp.
A maior preocupação das mulheres do assentamento é conservar o meio ambiente, evitando que as famílias abram o Cerrado para plantio de novas culturas e pasto perto de nascentes e riachos. Elas seguem plantando árvores no sistema agroflorestal e ampliando quintais produtivos para tentar impedir que os efeitos das mudanças do clima se intensifiquem cada vez mais.
“A questão ambiental é muito séria e as pessoas precisam saber disso. O Cerrado é o berço das águas e a cada ano aumenta a nossa cota de sacrifício para permanecer aqui. Percebemos que, por causa do clima, vai ficando tudo mais difícil. Não dá para viver sem nossas árvores, mas só quem vive nessa região sabe o valor de preservar tudo isso”, desabafa.
Seca e desertificação no mundo
Segundo a ONU, quase três quartos das terras sem gelo da Terra foram
alteradas pela ação humana para atender a uma demanda cada vez maior por
alimentos, matérias-primas, estradas e casas. Nesse processo, algumas áreas
foram muito danificadas e investir na sua recuperação reforça as defesas da
natureza contra desastres e eventos climáticos extremos, como incêndios
florestais, secas, inundações e tempestades de areia e poeira.
Mais recentemente, a Plataforma Intergovernamental de Políticas
Científicas sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos estimou que a
degradação do solo reduziu a produtividade de 23% da superfície global da
terra, grande parte disso em ecossistemas de pastagens. Da mesma forma, o
Global Land Outlook da UNCCD estimou que 1,3 bilhão de pessoas vivem em terras
agrícolas degradadas.
Restaurar paisagens naturais também reduz o contato próximo entre a
vida selvagem e os assentamentos humanos, criando uma proteção natural contra
doenças zoonóticas, como a Covid-19. “Se
os países conseguirem restaurar os quase 800 milhões de hectares de terras
degradadas que se comprometeram a restaurar até 2030, podemos proteger a
humanidade e nosso planeta do perigo que se aproxima”, declarou Ibrahim Thiaw,
Secretário Executivo da Convenção da ONU para o Combate à Desertificação.
Queimadas e desmatamento no Cerrado brasileiro
● Houve um aumento de 87% no número de focos de incêndios entre 1 e 31
de maio deste ano em relação ao ano passado (2.649 focos de queimadas contra
1.481).
● Quando falamos de desmatamento, a aceleração foi ainda maior: entre 1
e 27 de maio, foram desmatados 870 km2, um aumento de 142% em
comparação aos 360 km2 registrados no mesmo período em 2020.
● Entre 1 de janeiro e 27 de maio foram destruídos 2.065 km2
de Cerrado contra 1.685 km2 no mesmo período do ano passado – um
aumento de 22%.
● No acumulado de agosto do ano passado até o fim de maio, o Cerrado perdeu 3.868 km2 de áreas naturais, um aumento de 30% em comparação ao mesmo período em 2020, quando foram desmatados 2.981km2.
Cerrado tem alta de 20% no desmatamento e maior área derrubada de uma única vez no país. (ecodebate)
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