Nova versão do projeto de lei do Código Florestal, previsto para ser votado em março/12, permite interpretação que libera desmatamento para
megaeventos.
É mais ou menos isso que diz a nova versão do projeto de lei
do Código Florestal Brasileiro, o substitutivo do Senado, com votação na Câmara
em abril/12.
Dentre outras medidas escandalosas, há um artigo que permite
o desmatamento de Áreas de Preservação Permanente (APP’s) para a Copa do Mundo
de 2014 e as Olimpíadas de 2016:
“A intervenção ou a supressão de vegetação nativa em Área de
Preservação Permanente somente ocorrerá nas hipóteses de utilidade pública, de
interesse social ou de baixo impacto ambiental previstas nesta Lei”. Por
interesse social o código define: “a implantação de infraestrutura pública
destinada a esportes, lazer e atividades educacionais e culturais ao ar livre
em áreas urbanas e rurais consolidadas”.
Para a gente entender melhor a gravidade do tema, é
importante dizer que o CONAMA define que as APP’s têm a “função ambiental de
preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a
biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o
bem estar das populações humanas”. Como exemplo estão as áreas de mananciais, as
encostas com mais de 45 graus de declividade, os manguezais e as matas
ciliares.
Estas áreas são tão importantes que a lei de crimes
ambientais (9.605/98) prevê que qualquer intervenção não autorizada em APP’s é
passível de pena de detenção de um a três anos e multa de até R$ 50.000,00 por
hectare danificado. Tudo isso vai abaixo em nome dos megaeventos se o novo
Código Florestal for aprovado como está.
Para o professor do Departamento de Ciências Florestais da
Universidade de São Paulo, Pedro Henrique Santin Brancalion, isso colocará em
risco não só o meio ambiente, mas as próprias obras. Construir em área de
declive, por exemplo, onde geralmente há trombas d’agua que se deslocam em
períodos de chuvas podem criar situações de tragédia como as que a gente vê na
região serrana do Rio.
A instabilidade do solo também gera riscos. APP’s não são os
locais mais seguros para se construir. Isso sem falar nos danos à natureza,
pensando apenas na segurança das pessoas. O professor aponta outra falha do
projeto neste sentido: “Há um artigo que permite a construção de casas
populares em manguezais. São áreas super instáveis! Pode porque é a população
de baixa renda que vai morar ali?”
No dossiê preparado por movimentos sociais e divulgado pela
Pública “Mega eventos e violações de Direitos Humanos no Brasil”, é feita uma
denúncia que mostra o quanto o projeto pode agravar a situação de populações
vulneráveis que vivem nestas áreas. Segundo o documento, além do desmatamento
já estar acontecendo, pessoas estão sendo retiradas de APP’s para que depois os
locais recebam empreendimentos de interesse do mercado através da mudança na
legislação estadual ou municipal:
“O Plano Diretor de Porto Alegre (…) já vem sendo
descaracterizado e desvirtuado por leis complementares que submetem a cidade
aos empreendimentos associados à Copa 2014, (…). Foram realizadas alterações no
zoneamento ampliando índices construtivos e reduzindo áreas de APP”. Ainda
segundo o dossiê, alterações urbanísticas sem estudos de impacto ambiental
também já estão sendo feitas no Rio de Janeiro e Salvador.
Raquel Rolnik, relatora da ONU para o direito à moradia
adequada, pronunciou-se sobre assunto no ano passado escrevendo na revista
Carta Capital que “o que acontece em Porto Alegre mostra, na verdade, que a
Copa de 2014 está sendo usada como motivo para que se altere o regime
urbanístico das cidades brasileiras sem critérios, sem estudos e sem os
processos de discussão públicos e participativos necessários.”
Pedro Henrique Santin engrossa este coro: “Todo o processo
de discussão do novo código não foi feita de forma democrática: “É preciso que
a população se mantenha atenta e cobre que o projeto de lei seja bem pensado.
Depois de aprovado não haverá muito a se fazer”. (apublica)
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