Ao longo dos
séculos, o assoreamento levantou leito de rio chinês cerca de 10 metros acima
de sua planície de inundação.
"O que fazer se as águas do Rio Amarelo se elevarem?",
perguntou o presidente Mao à sua comitiva, de pé sobre uma colina com vista
para o grande rio, chamado de Mãe da Civilização Chinesa, em 1952, em seu
primeiro tour de inspeção do país após décadas de guerra e revolução.
Engenharia hidráulica chinesa aprendeu lições na difícil escola dos
vales do Rio Amarelo.
O Rio Amarelo é quase único, por causa da enorme carga de sedimentos
transportada dos Planaltos de Loess ao norte da China (mais de 1 bilhão de
toneladas ao ano), que aumentou com o tempo. Ao longo dos séculos, o
assoreamento levantou o leito do rio cerca de 10 metros acima de sua planície
de inundação a jusante em alguns lugares. Inundações frequentes e mudanças no
seu curso levaram à construção de diques extensos a partir do século 7 a.C.,
agora chamados de "a segunda Grande Muralha da China", que se
estendem por várias centenas de quilômetros.
Cortar florestas para limpar terrenos para culturas intensificou a erosão
e adicionou mais sedimentos aos rios. Durante séculos, canais e aterros foram
reforçados muitas vezes, acumulando mais sedimentos. Quando o rio subia após
chuvas pesadas ou os diques falhavam por falta de reparos, as águas
transbordaram o canal assoreado para inundar a paisagem do entorno, um drama
que se repetiu muitas vezes na história da China.
Em sua grande obra, Science and Civilization in China, Joseph Needham
observou que "a engenharia hidráulica chinesa aprendeu na difícil escola
dos vales do Rio Amarelo, enfrentando problemas que mesmo a tecnologia moderna
ainda não resolveu".
Desde 1949, tanta água foi desviada do Rio Amarelo por projetos
hidráulicos que o fluxo se enfraqueceu e não conseguia mais carregar sedimentos
corrente abaixo. Em anos secos, começando em 1972, o grande rio falhou em
alcançar o mar. Em 1997, foi estabelecido um novo recorde quando o canal do Rio
Amarelo permaneceu seco por 226 dias, ao longo de 700 quilômetros desde sua foz
na Baía de Bohai.
Segundo Vaclav Smil, analista da ecologia da China, "inundações e
secas destrutivas moldaram o curso da civilização chinesa tanto quanto a
irrigação extensiva e a dependência do transporte de água".
Na Bacia do Rio Yangtze, graves inundações acontecem aproximadamente a
cada década nos últimos 2 mil anos, produzindo cenas como a descrita em 1950
pelo governador da província de Anhui, em um relatório para Mao: "Milhares
de pessoas não têm como escapar. Algumas subiam nas árvores, mas depois caíam
na água e se afogavam. Outras foram mordidas por cobras venenosas, que também
buscaram segurança nas árvores. Algumas subiram em barcos que foram rapidamente
virados pela força das águas de inundação e pelas ondas enormes."
A resposta à pergunta de Mao veio rapidamente de Wang Huayun, chefe da
Comissão de Conservação do Rio Amarelo, que propôs um grande esquema alinhado
com o entusiasmo da China por grandes projetos: "Se as 30 usinas previstas
para a corrente principal forem concluídas, a capacidade total de reservatório
deve ter entre 200 bilhões e 300 bilhões de m³. Nessas condições, se pouco ou
mesmo nenhum esforço for colocado para controlar a erosão do solo e se nenhum
reservatório for construído sobre os afluentes, as grandes barragens podem
funcionar por elas mesmas por mais de 300 anos".
Barragem
As complicações embutidas na resposta à pergunta de Mao vieram com a
construção da Barragem de Sanmenxia, em um desfiladeiro que abraçava
corredeiras criadas por duas ilhas de granito logo abaixo da curva grande do
Rio Amarelo, perto de Xi’an, quando o rio começa sua descida para o mar. A
construção começou com a realocação de 870 mil pessoas em 1958, junto com o
lançamento do Grande Salto de Mao.
A sequência tipo "escada" de 29 barragens na Bacia do Rio
Amarelo, para controle de cheias, irrigação e energia elétrica, foi projetada
por engenheiros soviéticos que subestimaram o volume de sedimentos que se
acumulariam. Em 1964, quatro anos depois da conclusão da barragem e antes que a
eletricidade fosse produzida, acumulou-se uma "barriga" de 2 bilhões de
toneladas de sedimentos. O leito do rio subiu dramaticamente, ameaçando inundar
Xi'an e a planície em volta. Alarmado, Mao disse ao premiê Zhou Enlai: "Se
nada funcionar, exploda a barragem". Foram quatro décadas de reparos para
evitar a inundação de cidades vizinhas e da paisagem circundante.
O assoreamento e o sobrefluxo da Barragem de Sanmenxia foi apenas o
começo dos problemas de água de Xi’an. Alastrando-se muito além de suas antigas
muralhas, a população de Xi"an triplicou nos primeiros 25 anos após a
fundação da República Popular, em 1949, e mais que dobrou novamente desde 2000
para abraçar quase 9 milhões de pessoas.
Poluição
O Rio Wei, que passa por Xi’an antes de desaguar no Amarelo,
tradicionalmente a maior fonte de água superficial da cidade, tornou-se tão
poluído que a água de 9 das 13 estações de monitoramento foi classificada como
imprópria para qualquer uso. Por isso, a população de Xi’an tem cavado poços
tão intensivamente que as perfurações levaram a um afundamento de terra, notado
pela primeira vez na década de 1960, que tem se intensificado desde então.
Com o Amarelo e seus afluentes secos, o governo municipal perfurou
milhares de poços para extrair água subterrânea e criou túneis nas Montanhas
Qin da Província de Shaanxi para desviar as águas de outros rios. Os milhares
de poços causaram fissuras e crateras superficiais e funis e cones
subterrâneos, danificando edifícios, tubulações, instalações elétricas, pontes
e calçadas. A terra afundou mais de 2 metros em vários locais numa área de 155
km².
Enquanto a cidade crescia de forma espetacular, o problema da água
atingiu duramente a Planície Norte da China, como observa Ma Jun, autor de
China’s Water Crisis (2004): "Os projetos de desvio de água foram
construídos desenfreadamente com pouco ou nenhum respeito pelo custo, enquanto
a destruição das florestas, que ofereciam a maior proteção dos recursos
hídricos, não foi observada. A erosão do solo em Shaanxi hoje afeta quase
metade da quantidade total de terra erodida no país. Também produz 920 milhões
de toneladas de sedimentos por ano, um quinto da erosão do solo no país. A
situação foi agravada pelas secas que assolaram Shaanxi ao longo das últimas
décadas. (OESP)
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