Mudanças climáticas no Brasil devem trazer prejuízo e pobreza
Secas mais intensas,
prejuízo na agricultura, diminuição do pescado, reformulação da matriz
energética – esses são alguns dos impactos que as mudanças climáticas devem
gerar no Brasil. E os mais afetados serão os brasileiros de classes econômicas
menos favorecidas.
Esse é o cenário
descrito no sumário executivo do Grupo de Trabalho 2 (GT2) do Painel Brasileiro
de Mudanças Climáticas (PBMC), divulgado em 25/10/13 na Fundação Brasileira
para o Desenvolvimento Sustentável (FBDS), no Rio de Janeiro. O documento
aborda os impactos das mudanças climáticas nos sistemas naturais e
socioeconômicos, bem como suas consequências, além de opções de adaptação ao
novo cenário.
“Esse relatório
mostra que os impactos já estão acontecendo e é preciso tomar decisões quanto a
isso de imediato. Quanto mais se espera, maior e mais caro fica o problema”,
afirmou Suzana Kahn, pesquisadora da Universidade Federal do Rio de Janeiro
(UFRJ) e presidente do comitê científico do PBMC.
Para ela, o relatório
também fornece elementos para que os governantes brasileiros planejem suas
respostas de maneira a diminuir os impactos e os custos, bem como para melhorar
a inclusão social. “Quem sempre sofre mais e tem menos chance de se adaptar é a
população pobre”, declarou Kahn.
O primeiro sumário
executivo do Relatório de Avaliação Nacional (RAN1) do PBMC foi divulgado em
06/08/13 durante a 1ª Conferência Nacional de Mudanças Climáticas Globais
(Conclima), organizada pela FAPESP, em São Paulo.
Recursos hídricos
A água é um
elemento-chave na questão dos impactos das mudanças climáticas. Segundo o
sumário divulgado na sexta-feira, as alterações nos regimes de chuva devem
levar a secas e enchentes mais frequentes e intensas, podendo também ter
impacto sobre a recarga de águas subterrâneas.
As taxas de vazão dos
rios também sofrerão variação. No leste da Amazônia e no Nordeste, as perdas
podem chegar a 20%, sendo que na bacia do Tocantins o valor é de 30%. Já na do
Paraná-Prata, a expectativa é de aumento de 10% a 40%.
“É um problema muito
sério. Segundo a Agência Nacional de Águas, mais de 2 mil municípios terão
problema de abastecimento de água em 2015”, alertou Eduardo Assad, pesquisador
da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e coordenador do GT2.
Nas áreas costeiras,
o aumento do nível do mar deve intensificar as inundações e os processos
erosivos. Além disso, o aumento da temperatura e da acidificação dos oceanos
deverá ter impacto negativo sobre os ecossistemas marinhos e sobre a pesca.
“Podemos ter uma
perda no volume de pescado de 6%, em média. Imaginem quantas famílias de
pescadores serão atingidas”, observou Assad. O estudo prevê ainda a perda de
biodiversidade em ecossistemas aquáticos e terrestres, levando ao
desaparecimento ou à fragmentação de hábitats.
Agricultura e energia
A atividade agrícola
tende a ser afetada diretamente pelas mudanças climáticas. Com o aumento da
temperatura e a redução da quantidade de água, áreas de baixo risco para a
agricultura vão se tornar de alto risco, perdendo valor e forçando a população
rural local a migrar para os centros urbanos.
“No Ceará, por
exemplo, isso pode acarretar uma redução de até 60% no produto interno bruto
agrícola e no valor das terras”, ressaltou o coordenador do GT2.
Outro problema sério
são os efeitos sobre pragas e doenças que atacam as culturas. A alta de
temperatura e umidade serão condições ideais para a eclosão de fungos.
Já o setor energético
pode ser afetado de diversas formas pelas mudanças climáticas. Segundo Assad, é
necessário ampliar a matriz energética, pois haverá problemas na geração de
energia hidrelétrica em razão das alterações na oferta de água.
Para ele, a abertura
para alternativas energéticas mais limpas ainda é tímida, enquanto há estímulo
para fontes como gás de xisto e termelétricas a carvão. “Onde estão os
incentivos para as energias solar, eólica e de marés? Continuamos insistindo na
vanguarda do conservadorismo energético”, destacou.
Cidades e saúde
As cidades também
serão bastante afetadas, com alguns fenômenos já em andamento, como os
deslizamentos de encosta e os alagamentos causados por deficiências no sistema
de drenagem urbano.
“Não preciso lembrar
o que vai acontecer em janeiro e fevereiro no Rio de Janeiro e em Salvador.
Nenhuma atitude foi tomada nos últimos anos para resolver esse problema”,
criticou Assad.
Em termos de
transporte, o modal utilizado pelo país estaria totalmente equivocado,
principalmente o urbano, de acordo com o documento. Mudar isso, especialmente
no quesito transporte de carga, faria o Brasil dar um grande salto na emissão
de gases de efeito estufa.
Na questão de saúde
humana, o país estaria extremamente vulnerável por conta de ondas de calor e de
frio, que estariam relacionadas a uma maior mortalidade. Essas condições também
podem ser ideais para a proliferação de vetores de doenças tropicais, como
mosquitos, levando a uma expansão de males como a dengue.
Para o coordenador do
GT2, reduzir os problemas relacionados à água, bem como à subsistência e à
pobreza são igualmente críticos. “Essas são ações prioritárias que o Brasil tem
que atacar. Para isso, governo, indústria, comércio e sociedade precisam estar
envolvidos em uma resposta nacional adequada”, concluiu Assad. (EcoDebate)
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