Estudo defende harmonia entre floresta e agricultura
sustentável no Brasil
Para reduzir emissões
de CO2 da agricultura, é preciso reorganizar 20% da área nacional de
plantio. Aumentar quantidade de raízes no solo é uma das soluções, mas custa
caro e enfrenta a resistência dos produtores.
A agricultura
brasileira cresce acima da média mundial e o país pode se tornar a principal
potência do setor até 2020. Esse aumento na produção impulsiona a mudança do
uso da terra e coloca o setor como um dos maiores responsáveis pela emissão de
gases de efeito estufa, tanto na produção agrícola – uso de fertilizantes e
manejo das áreas agricultáveis – quanto na pecuária – uso de áreas desmatadas e
emissão de metano pelo rebanho bovino.
Ao mesmo tempo, o
país quer cumprir as metas de redução nas emissões, acordadas na conferência do
clima de Copenhague, em 2009. A tarefa pode ser cumprida até no bioma Amazônia,
afirma um estudo da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e da Empresa
Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). A pesquisa aponta que é possível
equilibrar a equação, mas essa mudança requer grandes esforços.
Só da agricultura, a
ambição é eliminar de 133 milhões a 166 milhões de toneladas de carbono
equivalente até 2020. A matemática verde tem vários fatores que pedem modelos
produtivos mais sustentáveis, como a recuperação de pastagens, a Integração
Lavoura Pecuária (ILP) ou a Integração Lavoura Pecuária Floresta (ILPF), como
aponta o relatório. Esses modelos, conforme explica o Hilton Silveira Pinto,
coordenador do estudo dentro da Unicamp, exigem majoritariamente uma
reordenação do uso dos espaços agrícolas.
Áreas de pastagem, de
plantação e de cultivo de madeira precisam ser organizadas dentro da
propriedade para funcionar em sinergia. “As faixas onde se planta eucalipto,
por exemplo, podem ser usadas simultaneamente como pastagem dentro de dois ou
três anos”, exemplifica. Áreas de cultivo de milho, soja ou outros cereais
também podem ser criadas entre os campos de pasto, bloqueando o acesso dos
animais.
Solos precisam ser recuperados para reter maior
quantidade de carbono
Raízes reduzem emissões
A chave desses
sistemas está em aumentar a quantidade de raízes no solo. Elas asseguram uma
fixação maior de carbono e, como consequências reduzem o saldo das emissões.
Para testar a eficácia do modelo, a pesquisa colheu amostras nos estados do
Acre, Tocantins, Rondônia, Pará e Roraima. O Amazonas ficou de fora por não
possuir nenhum projeto conhecido de produção integrada, afirma Silveira Pinto.
No relatório, está
claro que entre as 68 amostras colhidas, todas as provenientes de sistemas
integrados apresentam uma taxa maior de carbono no solo. Esses números também
podem ser interpretados como indicativos da qualidade da terra agricultável: mais
carbono significa um solo mais rico.
Segundo a avaliação,
a solução mais simples de todas para fixar mais carbono no solo é a recuperação
de áreas de pastagem. Pastos de baixa qualidade têm, geralmente, poucas raízes
e com isso retém uma menor quantidade de carbono. O agrônomo explica que para
cada quilo de massa verde – vegetação – que se acrescenta às pastagens, meio
quilo de gás carbônico a menos é lançado na atmosfera.
O custo de ser verde
Embora a solução
esteja clara para o pesquisador, ele próprio enxerga as dificuldades para a sua
adoção. “As tecnologias não são simples e nem baratas de serem implementadas”,
afirma. Embora não tenha números – a análise financeira é o próximo passo da
pesquisa –, o cientista estima um aumento de 50% dos custos iniciais de
produção na adoção desses modelos mais equilibrados.
O maior desafio seria
atingir a dimensão necessária para que esse carbono retido torne a produção
mais verde. Pelo menos 11 milhões dos cerca de 50 milhões de hectares usados
hoje na produção agrícola teriam que adotar formas de manejo sustentável nos
próximos 20 anos. Para o pesquisador, esse não é um processo simples. Por outro
lado, a estratégia não só reduziria as emissões, mas também garantiria um
aumento da produção.
Desmatamentos
evitados
Na conta de José
Frutuoso do Vale Júnior, professor do curso de Agronomia da Universidade
Federal de Roraima, outro fator precisa ser considerado: técnicas de manejo
sustentável ajudam a evitar novos desmatamentos na Amazônia.
Ele conhece os
modelos sugeridos pelo estudo e acredita na sua eficácia. Segundo ele,
rearranjos assim poderiam recuperar muitas áreas que foram desmatadas para uso
na produção agrícola ou pecuária e que, por não apresentarem a produtividade
desejada, são abandonadas. Sem terras, os fazendeiros avançam em novas áreas da
floresta.
Dados da organização
ambiental Greenpeace apontam a pecuária como responsável por 14% do
desmatamento anual da Amazônia. A cada 18 segundos, um hectare da floresta
estaria sendo convertido em pasto.
O professor de
Roraima, que orientou um estudo de qualidade do solo similar ao da
Unicamp/Embrapa, observou a qualidade do solo em áreas onde a floresta foi
cortada para o uso em pastagem. “A conversão em pasto promove uma queda de até
50% no índice de carbono no solo”, compara. Ele explica que a terra é mais
frágil onde a cobertura vegetal é removida.
Remover a floresta reduz em até 50% os níveis de
carbono no solo
Mudanças de hábitos
Mas o agrônomo
acredita na possibilidade de recuperação desses solos empobrecidos e enxerga
isso como uma forma de proteger a floresta. Em áreas com alto grau de
comprometimento, os custos são de fato elevados. Mas soluções menos
dispendiosas para a agricultura familiar também estariam à disposição. Em sua
avaliação, o que falta é informação, já que as soluções discutidas por
universidades e nos cursos de técnicas agrícolas não chegam aos produtores.
Modelos bem
planejados de uso rotativo do solo não são alternativas caras, mas como
qualquer mudança, quando chegam a quem trabalha no campo, geram ansiedade e
acabam rejeitadas especialmente pelos produtores mais simples. “É preciso
vencer essa dificuldade de inovar. E só se chega ao resultado se cada um fizer
sua parte”, conclui Vale Junior. (ecodebate)
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