Na Escola Superior de
Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP, em Piracicaba, o reuso de águas
servidos na agricultura tem sido alvo de estudos. Esse tipo de reuso tem grande
aceitação, principalmente quando se trata de redução de impactos ao meio
ambiente. De acordo com Ana Paula Alves Barreto Damasceno, autora da tese Desinfecção de águas
servidas através de tratamento térmico utilizando coletor solar,
“essas águas apresentam como vantagem altos teores de nutrientes que podem ser
aplicados em diversas culturas por meio de diversos métodos de irrigação
devendo, em alguns casos, ser feito apenas a complementação”.
Reuso tem aceitação, principalmente quando se reduz
impactos ao meio ambiente
Porém, ela lembra que
o fator restritivo para o aproveitamento dessas águas deve-se à presença de
microrganismos nocivos à saúde e/ou presença de metais pesados que possam
causar toxidez. Isso limita sua aplicação em alguns sistemas pois é necessário
verificar em quais culturas podem ser irrigadas sem que haja danos futuros. A
eliminação ou, ao menos redução desse risco por meio de um tratamento que
preserve os nutrientes ali presentes, transformaria essa água em solução
nutritiva pronta para ser aplicada. “Meu trabalho está sendo apresentado como
uma proposta de reaproveitamento da água residuária para a irrigação, de modo a
manter as características químicas que podem reduzir o gasto com adubação”,
explica a engenheira agrônoma.
Segundo ela, no
tratamento de esgotos ocorre a separação entre o lodo (onde fica retido a maior
parte dos resíduos sólidos) e água. Esta água ainda possui uma grande
quantidade de matéria orgânica que pode ser aproveitada como nutriente para as
plantas. No entanto, é necessário que haja um tratamento que conserve a matéria
orgânica e elimine os microrganismos presentes no esgoto que são prejudiciais à
saúde humana. “Com esse pensamento, o tratamento térmico pode ser visto como
uma alternativa eficiente e sustentável”.
Etapas
A primeira etapa foi
realizada no Laboratório de Física do Solo e Qualidade da Água da Esalq, com
amostras de água coletadas do Ribeirão Piracicamirim. Utilizando-se um
regulador automático de temperatura, foram realizados testes sob temperaturas
de 45ºC, 50ºC, 55ºC e 60ºC. Para os testes de qualificação e viabilidade
dos ovos de helmintos (vermes parasitários) foi feita coleta de água residuária
proveniente da Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) Piracicamirim. Ainda com o
uso do mesmo regulador automático procederam-se testes sob as temperaturas
60ºC, 70ºC, 80ºC, 90ºC e 100ºC durante o período de uma hora de exposição.
Na segunda etapa,
realizada em campo, foram empregados três reservatórios. A água aquecida era
conduzida no terceiro reservatório onde foi instalado um mecanismo que permitiu
que o tubo conectado à caixa fosse movimentado de modo a ficar mais alto ou
mais baixo, de acordo com a temperatura desejada, uma vez que devido a
diferença de densidade forçou-se a passagem da água com temperatura mais
elevada. Na sequência, foi realizada a comparação dos resultados e observou-se
que, nas temperaturas de 55ºC e 60ºC, o tempo de uma hora foi eficiente
para eliminar tanto coliformes fecais como Escherichia coli presentes nas amostras
em comparação a amostra de caracterização da água testada.
Perante isso, foram
realizados testes reduzindo o tempo de exposição das amostras, obtendo-se como
resultado o tempo mínimo de 15 minutos à temperatura de 60ºC para que fosse
alcançado o mesmo resultado obtido com uma hora de exposição. Nas amostras que
foram submetidas ao tratamento e incubadas, apenas na mostra submetida a 60ºC
foi possível a observação de um ovo que se verificou infértil. Nas demais
amostras correspondentes aos outros tratamentos, não foi possível a recuperação
de ovos nas lâminas observadas. É possível que durante o processo de limpeza
para redução de resíduos nas provas tenha ocorrido perda de material devido a
desintegração da matéria orgânica presente. No período estudado, na maioria dos
dias, verificou-se que a temperatura alcançada pela placa superou aquela
necessária para inativação dos microrganismos estudados. Assim, é possível verificar
nos dados que houve um alto incremento da temperatura entre entrada e saída da
água na placa.
“O uso do aquecimento
solar se mostrou como uma excelente alternativa para inativação de
microrganismos que são prejudiciais à saúde humana, comparando o que foi
observado neste trabalho ao trabalho de outros autores”, garante Ana Paula.
Para finalizar, a pesquisadora sugere que para estudos futuros é necessário que
sejam realizados ensaios por períodos maiores de exposição de modo que possam
ser avaliadas também as características químicas da água.
A orientação do
trabalho de Ana Paula Alves Barreto Damasceno foi do professor Tarlei Arriel
Botrel, do Departamento de Engenharia de Biossistemas (LEB) da ESALQ, por meio
do programa de pós-graduação (PPG) em Engenharia de Sistemas Agrícolas.
(ecodebate)
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