A penúria hídrica
nesse momento atinge várias regiões do Brasil. As piores são o São Francisco e
a população paulistana, pelo esgotamento do sistema Cantareira.
Os problemas hídricos
de hoje, se os levarmos a sério, não apenas do ponto de vista eleitoreiro, é o
começo da “vingança da natureza” contra uma civilização predadora. A situação
de São Paulo foi construída desde a década de 1950, quando se intensificou o
desmatamento em São Paulo e quando a concentração urbana tornou-se um fenômeno
alucinante.
A do São Francisco
vem desde o século XIX, quando os vapores consumiram toda a madeira que
compunha a mata ciliar do Velho Chico.
Quando construíamos o
texto base da Campanha da Fraternidade de 2004 – Fraternidade e Água – já nos
chamava a atenção que a região mais escassa de água per capta do Brasil era
exatamente a cidade de São Paulo. Naquele ano, cada paulistano dispunha de
pouco mais de 200 m3 por anuais. No Nordeste, a região mais pobre de água era o
sertão de Pernambuco, com uma disponibilidade de aproximadamente 1.200 m3 por
pessoa por ano. Claro, isso é média, não acesso real à água.
Esse cálculo é
relativamente fácil. Basta dividir a capacidade dos reservatórios pelo número
de habitantes. Óbvio, eles podem estar cheios ou não. Então, o cálculo é
dinâmico.
Acontece que, segundo
os padrões da ONU, só tem segurança hídrica aquelas populações que dispõem de,
pelo menos, 1.000 m3 por pessoa por ano. É bom ressalvar que é para todos os
usos, não somente para o consumo doméstico. O padrão é questionável, mas é o
que prevalece.
Ora, São Paulo já vem
no fio da navalha há muito tempo. Olhando o passado, a concentração
populacional de São Paulo não mediu as consequências da híper população sobre
os mananciais. Pior, com o processo de desmatamento e impermeabilização dos
solos, a água que cai escorre rapidamente para as partes baixas, causando
inundações, mas não penetrando no solo. Com isso, perdem forças os aquíferos,
que são os melhores depósitos da água de chuva para os períodos que não chove.
São eles que depois permitem a tal “vazão de base”, que vai alimentar a vazão
de superfície.
Então, aí entra a
responsabilidade dos gestores da água. A água do Cantareira é estadual,
portanto, responsabilidade direta do governo de São Paulo. Claro que o
governador atual não é o responsável pela destruição ambiental das matas e pela
impermeabilização da cidade. Mas, como gestor do estado federado, teria que ter
previsto a escassez da água, a corda bamba na qual a região conturbada se
balança há anos e ter planejado o uso racional da água na cidade. Não foi feito
e agora é uma situação caótica.
Aqui pelo Nordeste,
de forma penosa, estamos aprendendo a ter uma ética de cuidado com a água e seu
uso. Sabemos que ela é suficiente, mas é pouca. Portanto, se quisermos ter
água, precisamos cuidar dela. Por isso nos espanta a apatia do governo federal,
do governo de Minas e dos governos do Nordeste com a situação também caótica do
São Francisco.
Mas, São Paulo é um
caso emergencial. Há um plano B para São Paulo caso os volumes mortos do
Cantareira se esgotem? Os gestores teriam que fazer cenários para um futuro
breve. E teriam que considerar o pior dos cenários: se os reservatórios de São
Paulo secarem, qual será a saída para população? Existe a possibilidade de
outras fontes ou terão que evacuar 6 ou 7 milhões de pessoas?
Essa é a razão do
conflito entre governo estadual, Agência Nacional de Águas e Ministério
Público.
A eleição não está
permitindo esse debate. A população paulistana que já está sofrendo com a falta
de água, pode pagar caro por uma tragédia sócio ambiental absolutamente
previsível. Ainda é bom lembrar que só estamos no começo das tragédias sócios
ambientais que colheremos em futuro breve.
O crime ambiental do
desmatamento, a concentração populacional e a inoperância dos gestores formam
uma tempestade perfeita na cidade de São Paulo. (ecodebate)
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